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Processo 357/09
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I ? RELATÓRIO
1. Nos presentes autos em que é recorrente Ministério Público e recorridos A.,
Lda. e B., S.A., foi interposto recurso, com carácter obrigatório, ao abrigo do
n.º 3 do artigo 280º, da CRP, e do artigo 70º, n.º 1, alínea a) da LTC, do
despacho proferido pelo 2º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Santarém, em 18
de Dezembro de 2008 (fls. 66 a 68), que desaplicou a norma constante do artigo 4º
do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01 de Setembro, por violação do princípio da
igualdade, consagrado no artigo 13º da CRP.
2. Notificado para tal pela Relatora, o recorrente produziu as seguintes
alegações:
«1. Apreciação da questão de constitucionalidade suscitada.
1.1. O presente recurso obrigatório vem interposto da sentença, proferida no
Tribunal Judicial de Santarém, em 18 de Dezembro de 2008, nos autos de acção
especial regulada pelo Decreto-Lei nº269/98, de 1 de Setembro, que recusou
aplicar, com fundamento em inconstitucionalidade, a norma constante do artigo 4º
daquele diploma, enquanto determina que, em tais procedimentos, não há lugar a
dilação do réu citado editalmente.
1.2. Neste Tribunal, encontra-se pendente o processo nº 129/09, da 3ª secção ?
também oriundo do Tribunal Judicial de Santarém ? em que está em causa a
inconstitucionalidade da norma que, neste processo, constitui o objecto do
recurso.
Assim sendo, limitar-nos-emos a transcrever as alegações então apresentadas.
?A norma desaplicada na decisão recorrida exclui do âmbito do ?processo especial?,
regido pelo Decreto ? Lei nº 269/98, a aplicação das normas do Código do
Processo Civil que regulam a dilação, no caso, o artigo 252º-A. Daqui decorre
que, tratando-se de citação edital, ? e considerando-se feita a citação no dia
em que se publique o último anúncio ou, não havendo anúncio, no dia em que sejam
afixados os editais (artigo 250º) ? começa a correr nesta data o prazo para o
oferecimento da defesa pelo citado, que não beneficia do prazo adicional de 30
dias, decorrente do nº 3 do citado artigo 252º-A.
Violará esta redução de prazo para o réu se defender, no âmbito deste
procedimento especial e simplificado, algum princípio constitucional?
A matéria da fixação do regime dos prazos processuais ? sendo matéria de
processo civil ? situa-se no âmbito da livre discricionariedade legislativa,
podendo, nomeadamente, o legislador optar ? em procedimentos submetidos a um
regime que se pretende simplificado e particularmente célere - pela redução dos
prazos ?comuns? do Código do Processo Civil, desde que tal não implique uma
restrição arbitrária ou desproporcionada ao exercício do direito de defesa.
Ao apreciar a relevância da redução do prazo, no âmbito de certo procedimento,
não deve o interprete limitar-se, porém, a uma estrita ponderação da duração do
prazo peremptório em causa, devendo também ter na devida conta e existência ou
inexistência de outros mecanismos jurídicos, susceptíveis de atenuar ou
compensar o efeito restritivo da norma questionada: como é evidente, a
circunstância de o réu ausente ter um prazo de apenas 15 dias para contestar a
acção (sem beneficiar de qualquer dilação) será, numa análise limiar,
susceptível de lhe causar dificuldades acrescidas no exercício tempestivo do
direito de defesa, nomeadamente quando apenas se tenha apercebido da publicação
dos anúncios ou editais em data diferente (e ulterior) à respectiva publicação.
Afigura-se, porém, que o regime geral vigente em processo civil ? é aplicável ao
procedimento especial em causa ? contém remédio adequado para solucionar esta
situação, já que o artigo 486º, nº 5, admite que seja relevante o ?motivo
ponderoso?, idóneo para impedir ou dificultar anormalmente ao réu a organização
da defesa ? podendo, neste caso, o juiz prorrogar o prazo da contestação até ao
limite máximo de 30 dias.
Ou seja: a aplicabilidade do nº 5 do artigo 486º é susceptível de ? mediante
decisão prudencial e casuística do juiz ? ?remover? o obstáculo anormal ao
tempestivo exercício do direito de defesa pelo réu que haja sido citado por
éditos e convença que apenas deles e do seu conteúdo se apercebeu ulteriormente,
sem qualquer falta ou culpa da sua parte.
E, nesta perspectiva, a não aplicabilidade ?tabelar? do regime de ?prorrogação?
do prazo peremptório, alcançável através do instituto da dilação, é contornável
pela aplicabilidade do regime de concreta e casuística prorrogação judicial, ao
abrigo da norma do artigo 486º, nº 5 ? sendo tal regime ? e a flexibilização que
lhe subjaz - susceptível de fundar a conclusão de que não ocorre restrição
desproporcionada ao princípio do processo equitativo?.
2. Conclusão
Nestes termos e pelo exposto conclui-se:
1º
Situa-se no âmbito da livre discricionariedade legislativa o estabelecimento da
duração dos prazos em procedimentos cíveis e da eventual extensão ou prorrogação
destes, em função de um juízo de conveniência e oportunidade sobre a articulação
entre os direitos das partes e a celeridade processual ? desde que naturalmente
tal não conduza ao estabelecimento de prazos inadmissivelmente e
desproporcionadamente exíguos.
2º
Estando assegurado ? nomeadamente pelo nº 5 do artigo 486º do Código de Processo
Civil ? a possibilidade de o juiz prorrogar o prazo de defesa, quando ocorram
justificadamente razões sérias e ponderosas que dificultem a sua organização no
prazo peremptório, originariamente fixado, não representa o estabelecimento de
uma desproporcionada restrição ao direito de defesa do réu ausente, citado
editalmente, a não aplicação, no âmbito do procedimento especial e simplificado,
regido pelo Decreto-Lei nº 269/98, da figura da dilação, prevista no artigo 252º-A
do Código de Processo Civil, não sendo, por isso, a norma do artigo 4º do
Decreto-Lei nº 269/98, de 1 de Setembro, inconstitucional.
3º
Termos em que deverá proceder o presente recurso.» (fls. 97 a 100)
3. Devidamente notificados para o efeito, os recorridos deixaram esgotar o prazo
sem que viessem aos autos apresentar quaisquer contra-alegações.
4. O projecto de acórdão foi enviado a vistos, em 20 de Outubro de 2009. Na
medida em que o recurso foi interposto com efeito meramente devolutivo, em 02 de
Dezembro de 2009, a Relatora determinou que fosse oficiada a Secretaria do
tribunal recorrido, com vista a obter informação sobre o estado do processo
pendente perante aquele.
Por ofício recebido em 11 de Dezembro de 2009, a Secretaria do Tribunal Judicial
da Comarca de Santarém informou o Tribunal Constitucional que ?foi proferida
sentença em 1 de Junho de 2009, com condenação parcial da ré, e em 7/10/09 foi
efectuada a contagem do processo? (fls. 112).
Assim sendo, cumpre apreciar e decidir.
II ? FUNDAMENTAÇÃO
5. Independentemente do juízo que se viesse a formular sobre a norma extraída do
artigo 4º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01 de Setembro, torna-se evidente que
tal decisão sempre se revestiria de manifesta inutilidade processual, na medida
em que a decisão proferida nos autos recorridos já transitou em julgado, tendo-se
extinguido a instância.
Como tal, por força da alínea e) do artigo 287º do CPC, aplicável ?ex vi? artigo
69º da LTC, declara-se a extinção da instância, relativamente ao presente
recurso de constitucionalidade, por inutilidade superveniente da lide.
III ? DECISÃO
Pelos fundamentos expostos, decide-se declarar a extinção da instância, por
inutilidade superveniente da lide.
Sem custas, por não serem legalmente devidas.
Lisboa, 13 de Janeiro de 2010
Ana Maria Guerra Martins
Maria Lúcia Amaral
Vítor Gomes
Carlos Fernandes Cadilha
Gil Galvão