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Processo nº 499/09
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é
recorrente A., SA e recorrida B., SA, foi interposto o presente recurso, ao
abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei da Organização, Funcionamento e
Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho do Supremo Tribunal de
Justiça de 20 de Fevereiro de 2009 e do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 9 de Outubro de 2008.
2. Em 1 de Julho de 2009 foi proferida decisão sumária, ao abrigo do disposto no
nº 1 do artigo 78º-A da LTC, pela qual se entendeu não tomar conhecimento do
objecto do recurso, com os seguintes fundamentos:
«De acordo com a alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC ? ao abrigo da qual foi
interposto o presente recurso ? cabe recurso para o Tribunal Constitucional das
decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido
suscitada durante o processo.
Nos presentes autos, foi interposto recurso do despacho do Supremo Tribunal de
Justiça de 20 de Fevereiro de 2009 e do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa
de 9 de Outubro de 2008 para apreciação do artigo 11º, nº 1, do Código das
Custas Judiciais, quando interpretado e aplicado com a dimensão e sentido
normativo que lhe foi atribuído nas decisões recorridas, considerando-se não ser
desproporcional e exagerado um montante de custas correspondente a 1/5 do valor
da indemnização judicialmente reconhecido, tendo em conta as características do
concreto serviço público prestado e atendendo ao custo de vida em Portugal; e do
artigo 41º, nº 2, do Código das Custas Judiciais, quando interpretado e aplicado
com a dimensão e sentido normativo que lhe foi atribuído nas decisões recorridas,
considerando-se não ser desproporcional e exagerada a atribuição de uma quantia
a título de procuradoria no valor de ? 11.853,92.
1. Um dos requisitos do recurso interposto é a aplicação pelo tribunal recorrido,
como ratio decidendi, da norma cuja apreciação é requerida (artigo 70º, nº 1,
alínea b), da LTC).
Face ao teor do despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Fevereiro de
2009 ? trata-se de despacho que não admite recurso para o Tribunal
Constitucional, não tendo havido condenação em custas (cf. ponto 4. do Relatório)
?, é manifesto que este não aplicou, como razão de decidir, qualquer norma
extraída dos preceitos legais identificados pela recorrente. Circunstância que
obsta ao não conhecimento do objecto do recurso, justificando a prolação da
presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da LTC).
2. Um dos requisitos do recurso interposto é a suscitação prévia e de forma
adequada, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, da questão de
inconstitucionalidade normativa posta ao Tribunal Constitucional (artigos 70º,
nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC).
Sucede, porém, que a recorrente não cumpriu este ónus perante o Tribunal da
Relação de Lisboa ? instância que proferiu o acórdão de 9 de Outubro de 2008 ?,
designadamente nas passagens das peças processuais indicadas no requerimento de
interposição de recurso. Sendo certo que são irrelevantes as passagens
integradas nas alegações apresentadas em 18 de Novembro de 2008, face àquele
requisito.
Nos textos nºs 5 e 6 e na conclusão 3ª das alegações apresentadas em 10 de
Dezembro de 2007, a recorrente sustenta que o montante de custas viola o
princípio constitucional da proibição do excesso e o direito de acesso aos
tribunais; que a conta de custas viola claramente o princípio constitucional da
proibição do excesso e o direito de acesso aos tribunais; e que o despacho
recorrido viola os artigos 13º, 18º e 20º, nº 1, da Constituição da República
Portuguesa, para além de outras disposições de direito ordinário, nomeadamente o
artigo 11º do Código das Custas Judiciais.
Nos textos nºs 7 e 8 e na conclusão 5ª das alegações apresentadas em 25 de
Janeiro de 2008, a recorrente sustenta que o montante da procuradoria fixado
viola o princípio constitucional da proibição do excesso e o direito de acesso
aos tribunais; e que o despacho recorrido viola os artigos 1º, 13º, 18º e 20º,
nº 1, da Constituição da República Portuguesa, para além de outras disposições
de direito ordinário, nomeadamente o artigo 41º do Código das Custas Judiciais.
É certo que, quanto ao nº 2 deste artigo do Código das Custas Judiciais, a
recorrente sustenta que, ?quando interpretado e aplicado com a dimensão e
sentido normativos que lhe foram atribuídos no douto despacho recorrido, integra
uma norma claramente inconstitucional?. Porém, não identifica a dimensão e
sentido normativos em causa, limitando-se a remeter para o despacho recorrido.
Não cumpre o ónus da suscitação adequada da questão de inconstitucionalidade
normativa.
Como não se pode dar como verificado o requisito da suscitação prévia e de forma
adequada das questões de constitucionalidade postas (artigos 70º, nº 1, alínea b)
e 72º, nº 2, da LTC), não pode tomar-se conhecimento do objecto do recurso
interposto do acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 9 de Outubro de 2008.
Justifica-se, por isso, a prolação da presente decisão (artigo 78º-A, nº 1, da
LTC)».
3. Notificada desta decisão, a recorrente vem agora reclamar para a conferência,
ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 3, da LTC, com os seguintes
fundamentos:
«2. Conforme resulta do art. 70º/2, 4 e 6 da LTC, no caso de recurso ?destinado
a uniformização de jurisprudência? (v. art. 70°/2 da LTC), que ?não possam ter
seguimento por razões da ordem processual? (v. art. 70°/4 da LTC), o recurso
para este Venerando Tribunal Constitucional não tem que ser interposto de
decisão que aplicou ou recusou a aplicação de norma reputada de inconstitucional,
mas sim da ?ulterior decisão que confirme a primeira? (v. art. 70°/6 da LTC), ou
seja, do despacho do Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 2009.01.26, que,
por razões processuais, rejeitou o recurso interposto por oposição de acórdão.
Nesta linha e considerando precisamente a aplicação das normas transcritas e em
situação absolutamente paralela, no douto Ac. TC n.° 411/00, de 2000.10.03,
proferido no processo n.° 501/2000, decidiu-se o seguinte:
(?)
Como resulta claramente da douta decisão transcrita, o recurso a interpor para
este Venerando Tribunal Constitucional poderá ter como objecto a decisão
desfavorável do Supremo Tribunal de Justiça, independentemente de esta
constituir ?decisão de mérito? ? aplicando ou recusando a aplicação de qualquer
norma inconstitucional ? ou simples decisão que ponha termo ao recurso por
oposição de julgados, não decidindo de mérito, nem conhecendo do recurso, em
conformidade com o disposto no art. 70º/6 da LTC, como se verificou no caso sub
judice.
Além disso, registe-se que a ora reclamante recorreu não só do douto do
Venerando Supremo Tribunal de Justiça, de 2009.01.26, como do douto Acórdão do
Tribunal da Relação de Lisboa, de 2008.10.09.
3. Em abono deste entendimento, sublinhe-se ainda que nos termos dos artigos
70°/l/b) e 72°/2 da LTC, são pressupostos objectivos do recurso interposto para
este Venerando Tribunal Constitucional:
a) Aplicação efectiva de uma norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade
tenha sido suscitada adequadamente no decurso de um processo;
b) Necessidade de a decisão recorrida fazer caso julgado no processo principal;
c) Menção na petição de recurso dos elementos exigidos no art. 75°-A/1 e 2 da
LTC (v. Blanco de Morais, Justiça Constitucional, 2005, II/700; cfr. Ac TC 1/05,
de 5 de Janeiro, Proc. 909/04, Cons. Maria João Antunes, 364/96, de 6 de Março,
Proc. 27/92, Cons. Tavares da Costa, ambos in www.tribunalconstitucional; Ac. RL
de 1998.01.13, Proc. 0006285, www.dgsi.pt).
Ora, é manifesto que a ora reclamante suscitou no decurso do processo a ?questão
de constitucionalidade normativa?, como resulta claro do seguinte:
a) Nas alegações para o Tribunal da Relação de Lisboa, de 2007.12.10, a ora
reclamante invocou expressamente ?o montante de custas devido pela ora
recorrente ? correspondente a 1/5 do valor da indemnização que lhe foi
reconhecida - sempre seria manifestamente desproporcional e exagerado, face às
características do concreto serviço público prestado e atendendo ao custo de
vida em Portugal, violando assim o princípio constitucional da proibição do
excesso e o direito de acesso aos tribunais, pois o referido montante resultou
apenas do elevado valor da acção, não existindo qualquer correspondência entre
os custos dos meios do Estado envolvidos e o valor das taxas cobradas (v. arts.
13°, 18° e 20º/1 da CRP)? (v. conclusão 3ª; cfr. texto n°s. 5 e 6);
b) Nas alegações para o Tribunal da Relação de Lisboa, de 2008.01.28, a ora
reclamante invocou expressamente que ?o montante de procuradoria fixado no douto
despacho recorrido sempre seria manifestamente desproporcional e exagerado,
violando o princípio constitucional da proibição do excesso e o direito de
acesso aos tribunais? (v. arts. 13°, 18° e 20°/1 da CRP; cfr. conclusão 5ªª cfr.
texto nos. 7 e 8);
c) Nas alegações para o Supremo Tribunal de Justiça, de 2008.11.18, a ora
reclamante invocou expressamente as referidas questões de constitucionalidade e
que ?os arts. 11º, 13°, 18° e 41°/2 do CCJ, na interpretação e com o sentido
normativo que lhes foi atribuído pelo acórdão recorrido, violam o princípio
constitucional da proibição do excesso e o direito de acesso aos tribunais (v.
arts. 1°, 13°, 18° e 20°/1 da CRP), pelo que é manifesta a sua
inconstitucionalidade e inaplicabilidade in casu (v. art. 204° da CRP)? (v.
conclusões 5ª, 8ª e 9ª; cfr. texto n°s. 10 a 19);
(?)
4.1. Por um lado, o STJ podia e devia conhecer da questão de constitucionalidade,
já que a mesma foi expressamente suscitada ao longo do presente processo,
conforme se demonstrou, inscrevendo-se assim na sua esfera de ?competência
vinculada? (v. Ac. TC 162/92, de 6 de Maio, Proc. 241/91, Cons. Messias Bento,
www.tribunalconstitucional.pt).
4.2. Por outro lado, o douto despacho do STJ, de 2009.01.26, pronunciou-se
expressamente sobre a questão do montante das custas e procuradoria, mantendo a
aplicação de normas reputadas de inconstitucionais, na sequência do entendimento
do Tribunal da Relação de Lisboa e das Varas Cíveis de Lisboa.
Nesta linha, decidiu o douto acórdão deste Venerando Tribunal Constitucional, de
1996.05.07, o seguinte:
(?)
5. É pois manifesto que, contrariamente ao decidido na douta decisão sumária
reclamada, nunca se poderia entender que as decisões recorridas ?não aplic(aram),
como razão de decidir, qualquer norma extraída dos preceitos legais
identificados pela recorrente? e que a ora reclamante não cumpre o ónus de ?suscitação
prévia e de forma adequada (...) da questão de inconstitucionalidade normativa
posta ao Tribunal Constitucional (?)»
Notificada da reclamação, a recorrida não respondeu.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da
LTC, não tomar conhecimento do objecto do recurso com fundamento, por um lado,
na não aplicação, por uma das decisões recorridas ? o despacho do Supremo
Tribunal de Justiça de 20 de Fevereiro de 2009 ?, de qualquer norma extraída dos
preceitos legais identificados pela recorrente no requerimento de interposição
de recurso; por outro lado, com fundamento na falta de suscitação prévia e de
forma adequada das questões de constitucionalidade, durante o processo, perante
o tribunal que proferiu a outra decisão recorrida ? o acórdão do Tribunal da
Relação de Lisboa de 9 de Outubro de 2008.
1. A argumentação da reclamante para contrariar o primeiro fundamento assenta na
afirmação de que foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional do
despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro de 2009.
Sucede, porém, que o recurso para o Tribunal Constitucional não foi interposto
do despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 26 de Janeiro de 2009, mas sim do
despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Fevereiro de 2009. É o que
resulta do teor do requerimento de interposição de recurso (fl. 125 e s. dos
autos), peça processual que define o respectivo objecto, e do Relatório da
decisão reclamada, onde tal despacho é tido como uma das duas decisões
recorridas. Em conformidade, entendeu-se, na respectiva Fundamentação, que ?face
ao teor do despacho do Supremo Tribunal de Justiça de 20 de Fevereiro de 2009 ?
trata-se de despacho que não admite recurso para o Tribunal Constitucional, não
tendo havido condenação em custas (cf. ponto 4. do Relatório) ?, é manifesto que
este não aplicou, como razão de decidir, qualquer norma extraída dos preceitos
legais identificados pela recorrente? (itálico aditado).
2. Relativamente à falta de suscitação prévia e de forma adequada das questões
de constitucionalidade perante o Tribunal da Relação de Lisboa ? o tribunal que
proferiu o acórdão de 9 de Outubro de 2008 ?, a reclamante volta a transcrever
parte do teor das alegações para a Relação e para o Supremo Tribunal de Justiça.
Quanto a estas, resta reafirmar que estas não foram produzidas perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida. Quanto às primeiras, já
exaustivamente analisadas na decisão reclamada, também se reafirma, tendo em
consideração as passagens agora transcritas pela reclamante, que não foi
suscitada em tais peças processuais qualquer questão de inconstitucionalidade
normativa.
Não se suscita a inconstitucionalidade de uma qualquer norma quando se afirma
que ?o montante de custas devido pela ora recorrente ? correspondente a 1/5 do
valor da indemnização que lhe foi reconhecida - sempre seria manifestamente
desproporcional e exagerado, face às características do concreto serviço público
prestado e atendendo ao custo de vida em Portugal, violando assim o princípio
constitucional da proibição do excesso e o direito de acesso aos tribunais, pois
o referido montante resultou apenas do elevado valor da acção, não existindo
qualquer correspondência entre os custos dos meios do Estado envolvidos e o
valor das taxas cobradas; nem tão-pouco, quando se afirma que ?o montante de
procuradoria fixado no douto despacho recorrido sempre seria manifestamente
desproporcional e exagerado, violando o princípio constitucional da proibição do
excesso e o direito de acesso aos tribunais?.
Resta, pois, confirmar a decisão sumária.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 30 de Setembro de 2009
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão