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Processo n.º 669/08
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. A., juiz de direito, interpôs recurso contencioso de deliberação do Conselho
Superior da Magistratura (Plenário) que lhe aplicou a pena disciplinar de
aposentação compulsiva. Por acórdão de 6 de Maio de 2008, o Supremo Tribunal de
Justiça negou provimento ao recurso.
O impugnante interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional, ao
abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro
(LTC). Convidado, ao abrigo do n.º 6 do artigo 75.º-A da LTC, a indicar, com
clareza e precisão, o objecto do recurso, o recorrente respondeu do seguinte
modo:
?(1) Os artigos 122º e 123º EMJ foram interpretados e aplicados, contra o
disposto nos artigos 267º/5 e 269º/3 CRP, no sentido de excluírem a audição do
arguido em processo de responsabilidade disciplinar judicial acerca da proposta
de resolução final do inquiridor [disse-se no requerimento de interposição de
recurso terem sido aplicados no sentida de vedar a co-decisão do recorrente no
que diz respeito à deliberação do CSM impugnada].
(2) O artigo 134º EMJ foi interpretado e aplicado em contrário do artigo 268º/3
CRP, quando o acórdão recorrido decidiu que à deliberação do CSM de acolhimento
da proposta do inquiridor, no sentido de o caso não evoluir para processo de
avaliação do mérito profissional bastante do juiz para o exercício do cargo,
podia ser dado um entendimento diferente e, pelo contrário, permissivo da pena
expulsiva [disse-se no requerimento de interposição de recurso admitir ? a
interpretação levada a cabo pelo acórdão recorrido ? que a motivação dos actos
administrativos não vincula na exactidão comunicativa do texto próprio e
incindível do acto considerado).
(3) O artigo 151.º EMJ foi interpretado e aplicado contra o disposto no artigo
269º/3 CRP, quando o acórdão recorrido aceitou que o Plenário do CSM pudesse
avocar um processo disciplinar que corria perante o Conselho Restrito,
eliminando um grau de apreciação recursiva e diminuindo, por consequência, a
extensão do sistema de impugnação do acto punitivo do juiz [disse-se no
requerimento de interposição de recurso, tão-somente, ter sido aplicada no
sentido de reduzir as possibilidades de impugnação do acto, eliminando o duplo
grau de apreciação).
(4) Por fim, no requerimento de interposição do recurso ainda se arguiu a
inconstitucionalidade do entendimento dado pelo STJ ao sistema normativo dos
artigos 168.º - 178.º EMJ, ao reduzi-lo a um estrito modelo de controlo formal
administrativo, contra o princípio da justiça - artigos 1º e 20º CRP ? e as
garantias da independência dos tribunais, que não se compadecem senão om uma
vigência hegemónica de uma supervisão material do oficio de juiz.?
2. Notificado para alegar, o recorrente concluiu as suas alegações nos seguintes
termos:
?A. O Acórdão do STJ recorrido aplicou ao caso A. vs CSM os artigos 122.º e 123.º
EMJ, no sentido de excluírem a audição do arguido em processo de
responsabilidade disciplinar judicial acerca da proposta de resolução final do
caso apresentada pelo inquiridor.
B. Aqueles artigos do EMJ, na leitura que assim lhes foi dada, contrariam os
artigos 267.º/5, ultima parte, e 269º/3 CRP, preceitos que autonomizam, por um
lado, a Audiência dos visados e, por outro, o direito de defesa, enquanto impõem
uma fase pré-decisória ao Estado-Aparelho no despacho da disciplina da
magistratura judicial.
C. O Acórdão do STJ recorrido aplicou ao caso sub judice o artigo 134.º EMJ com
leitura inconstitucional, quando decidiu ser licita a deliberação do CSM em
contrário de outra anterior que tinha incorporado a proposta do inquiridor no
sentido de encerramento, favorável ao arguido, da questão da estimativa do
mérito profissional para o exercício da judicatura.
D. Com efeito, o artigo 268.º/3 CRP define também como âmbito e alcance das
decisões do Estado-Aparelho os motivos decisórios, o que melhor se compreende no
caso de fazerem suas as propostas de linha: aceite uma, não pode a deliberação
CSM seguinte negá-la, sob pena de elisão do princípio nec bis in idem e da
justiça: artigos 1.º e 20.º CRP.
E. O Acórdão do STJ recorrido aplicou no caso sub judice o artigo 151.º EMJ em
contradição com o artigo 269.º/3 CRP, quando aceitou que o plenário do CSM
pudesse ter avocado um processo disciplinar que corria perante o Conselho
Permanente, eliminando deste modo um grau de reclamação, diminuindo, por
consequência, a extensão do sistema adversarial do acto punitivo do juiz.
F. O Acórdão do STJ tirado no caso sub judice, fez aplicação inconstitucional do
sistema normativo dos artigos 168.º/178.º EMJ, ao reduzi-la a um estrito modelo
de controlo formal administrativo, contra o principio da justiça, consagrado nos
artigos 1.º e 20.º CRP.
G. Principio constitucional da justiça este que joga, nos casos disciplinares da
magistratura judicial, com a especificidade da independência dos tribunais de
que é funcional a independência dos seus titulares.
H. Com efeito, este estatuto de dupla independência concêntrica, próprio de uma
Constituição e, por isso mesmo, particular à CRP, não pode compadecer-se com
sequências normativas de discricionariedade, só articuláveis nos poderes
dependentes e hierárquicos.
No sentido destas conclusões, V. Exas., julgaram contrárias à Constituição as
normas dos citados artigos 122.º, 123.º, 134.º, 151.º e 168/178.º EMJ, no
entendimento em que foram tomadas e aplicadas no Acórdão do STJ sob Recurso.
O Conselho Superior da Magistratura contra-alegou no sentido de que, ao julgar
improcedente a impugnação da deliberação punitiva, o Supremo Tribunal de Justiça
não fez interpretação contrária à Constituição das normas estatutárias invocadas
pelo recorrente.
3. Ouvido, por despacho motivado do relator, sobre a eventualidade de não
conhecimento de parte do recurso (fls. 1004), o recorrente respondeu nos
seguintes termos:
?1. Segundo o entendimento proposto, conjugado o princípio do pedido com a
competência do Tribunal, é colocada a probabilidade de ser liminarmente
rejeitada a apreciação do recurso no que diz respeito à solicitação de ser
declarado inconstitucional o sistema normativo que vai do art.º 168.º ao 178.º
EMJ: ao Tribunal Constitucional só seria permitido por lei conhecer da
inconstitucionalidade de cada uma e, só de cada uma, das normas propostas à
fiscalização sucessiva.
2. Concerteza que o recorrente não pode estar de acordo com esta visão do
problema: as normas do capítulo disciplinar do EMJ têm um sentido, cada uma a
cada uma, contextual e de função, ordenada por um modelo marcante: não são
dispersas, nem fragmentárias, como se tivesse havido erro logístico ou dominasse,
neste capítulo, a doutrina penal.
3. Muito pelo contrário, trata-se de um sistema coerente, interligado e
holístico que não permite a cada uma das normas poder ser entendida senão,
segundo o hábito do conjunto: estrutura legislativa do controlo jurisdicional
disciplinar dos magistrados judiciais.
4. Defendeu o recorrente, quanto a este sistema, tratar-se de um estrito modelo
de controlo formal administrativo que vai contra o princípio da justiça,
proposto nos arts.º 1.º e 20.º CRP.
5. Com efeito, as normas que regem a disciplina dos magistrados judiciais
pressupõem, ou estão a ser interpretadas como não permitindo a crítica de mérito
da decisão disciplinar das instâncias, por parte do tribunal ad quem.
6. Defendeu também o recorrente que este sistema fere as garantias de
independência dos tribunais, porque a independência dos juízes está indexada e é
funcional à independência do órgão de Estado que servem e, mal subtraídos à
garantia de uma apreciação de fundo (de mérito) disciplinar, em recurso, ficam
sob a discricionariedade de outrem: solução, por si só, hierárquica, de
desigualdade e constringente, portanto, de dependência.
7. Com efeito, nas notas de autonomia que integram a independência, está uma
supervisão e um controlo paritários; por isso mesmo, sob apreciações de mérito,
em todos os degraus do procedimento, incluindo o recurso contencioso.
8. Por conseguinte, parece indubitável a inconstitucionalidade de todas as
normas do capítulo, isto é, que vão do art.º 168.º ao art.º 178.° EMJ, porque
unificadas sob esta infracção ao princípio da independência dos tribunais,
estrutura primeva da Constituição, a qual, pede, insiste-se, um controlo de
mérito de segundo grau da decisão disciplinar que puna um juiz.
9. Depois, o art.º 79.º-C da LTC não tem, nem pode ter, o sentido restritivo
proposto pelo Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator: se o tribunal pode
fundamentar-se na violação de certas normas ou princípios constitucionais, de um
agregado, para decidir da inconstitucionalidade normativa em concreto, por
maioria de razão, pode decidir, se lhe for pedido, pela inconstitucionalidade de
um arco ou sistema normativo em concreto e identificado.
10. Esta tem sido, aliás, a posição comum e reiterada do Tribunal Constitucional.
11. Deve, por tudo isto, ser encarado este problema, com o primeiro e terceiro,
no Acórdão final.
12. Aliás, como o segundo, também.
13. É que o Excelentíssimo Senhor Conselheiro relator dá como seguro que o CSM
apenas acolheu a proposta do Exm.º Senhor Inspector Inquiridor, no sentido da
instauração de um processo disciplinar, mas não se vinculou à opção não
expulsiva do juiz, por ele referida expressamente.
14. Contudo, a penalidade benévola, indexada aos factos transcritos no Relatório,
constitui fundamento da proposta e, se o CSM não a recusou, aceitou-a, sem
dúvida.
15. Contudo, não é este o aspecto que importa: é questão a debater e não parece
ser perfunctória, mas também é certo que o recorrente não enfatizou esse preciso
aspecto da controvérsia.
16. De certo é que a decisão recorrida considerou não vincular a motivação dos
actos administrativos na exactidão comunicativa do texto próprio e incidível do
acto considerado.
17. E é exactamente por este motivo que a aplicação do art.º 134.º EMJ ao caso,
se constitui numa aplicação de norma inconstitucional, porque a leitura do
preceito desta maneira contraria o art.º 268.º/3 CRP: para quê exigir a
Constituição aos actos administrativos notificados fundamentação expressa e
acessível quando afectem direitos ou interesses legalmente protegidos, se não
pressupuser como garantia fundamental a incindibilidade fundamentação/decisão no
seu modo ontológico e comunicativo.
18. Por conseguinte, salvo o muito e devido respeito pela posição preliminar do
Excelentíssimo Senhor Conselheiro Relator, também nesta parte carecerá de
fundamento.
Em suma: deve seguir o recurso pela totalidade.?
II - Fundamentação
3. Para melhor compreensão das questões suscitadas e resolução da questão prévia
suscitada pelo despacho do relator, importa recordar os elementos essenciais do
caso, tal como o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça o relata: realizada
inspecção aos serviços prestados no TIC (3.º Juízo) e no Tribunal de Família e
Menores de Lisboa (1.º Juízo), foi atribuída ao ora recorrente a classificação
de ?Medíocre?, abrindo-se, em consequência disso, inquérito para avaliar da sua
eventual inaptidão para o exercício das respectivas funções, nos termos do
disposto no artigo 34.º, n.º 2, do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
Concluído o inquérito, foi o mesmo convertido em processo disciplinar, no termo
do qual o Conselho Permanente do CSM deliberou que os factos imputados na
acusação ao arguido violavam os deveres de administrar justiça, de zelo e de
criar no público confiança na acção da administração da Justiça, preenchendo a
infracção disciplinar prevista e punida com aposentação compulsiva pelas
disposições combinadas dos artigo 3.º, nºs. 1, 3, 4, alínea b) e 6, do Decreto-Lei
n.º 24/84, de 16 de Janeiro, e 82.º, 85.º, n.º 1, alínea f), 90.º, n.º 1, 95.º,
n.º 1, alíneas a) e c), e 106.º, todos do EMJ.
Notificado da ?requalificação? que assim se operou dos factos descritos na
acusação o arguido opôs-se-lhe, e, produzida a prova que apresentou, foi
elaborado novo relatório final, no qual se manteve o anterior.
Em 6 de Junho de 2006, o Plenário do CSM deliberou avocar esse processo e
apensar-lhe, para apreciação conjunta, outro processo disciplinar pendente
contra o mesmo magistrado e já inscrito em tabela para a sessão daquela data.
Na sequência da avocação e apensação assim determinadas, o Plenário do CSM, em
sessão de 4 de Julho de 2006, deliberou aplicar ao arguido, nos termos das
disposições conjugadas dos artigos 3.º, 32.º, 34.º, n.º 2, 82.º, 85.º, n.º 1,
alínea f), 90.º, n.º 1, 95.º, n.º 1, alíneas a) e c), 106.º e 131.º do EMJ, e 3.º,
n.ºs 3, 4, alíneas b) e g), 6 e 11 do ED, a pena disciplinar de aposentação
compulsiva por violação dos deveres profissionais de assiduidade, de zelo, de
administrar justiça e de criar no público confiança na acção da administração da
Justiça, reveladoras, quer da sua definitiva incapacidade de adaptação às
exigências da função, quer de inaptidão profissional.
4. Além do mais, o recorrente pretende que o Tribunal aprecie o que diz ser a
inconstitucionalidade do entendimento dado pelo Supremo Tribunal de Justiça 'ao
sistema normativo dos artigos 168.º ? 178.º do EMJ, ao reduzi-lo a um estrito
modelo de controlo formal administrativo, contra o princípio da justiça ?
artigos 1.º e 20.º CRP - e as garantias da independência dos tribunais, que não
se compadecem senão com uma vigência hegemónica de uma supervisão material do
ofício de juiz'.
Não é possível retirar deste enunciado ? que é retomado nas alegações com
variações de formulação que o não melhoram (vid. conclusões F. G. e H.) ? uma
questão de constitucionalidade normativa que possa constituir objecto idóneo de
recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.
Com efeito, como resulta da Constituição (artigo 280.º da CRP) e da Lei (artigo
70.º da LTC), compete ao Tribunal Constitucional apreciar a (in)constitucionalidade
das normas que os demais tribunais apliquem (ou a que recusem aplicação com
fundamento em inconstitucionalidade, ao abrigo do poder atribuído pelo artigo
204.º da Constituição) nos feitos submetidos a julgamento. O recurso de
constitucionalidade português não é um meio ordenado ao escrutínio da
constitucionalidade da decisão do tribunal a quo, mas à apreciação da
conformidade à Constituição de uma certa norma infraconstitucional que seja
relevante para a decisão do caso. E constitui ónus do recorrente definir o
objecto do recurso em consonância com essa finalidade da intervenção possível do
Tribunal, identificando, com precisão e clareza, a norma de cuja alegada
inconstitucionalidade pretende que o Tribunal se ocupe (n.º 1 do artigo 75.º-A
da LTC).
Embora a questão de constitucionalidade passível de sujeição ao Tribunal em
fiscalização concreta possa respeitar à interpretação ou sentido extraído pelo
tribunal da causa de uma dada norma ou, até, de um ?bloco legal? constituído por
vários preceitos ou normas textuais, incumbe sempre ao recorrente indicar esse
sentido normativo, enunciando o seu conteúdo e identificando os referentes
textuais de que é extraído, de tal modo que o Tribunal, se o recurso vier a ser
provido, possa enunciá?lo na sua decisão em ordem a permitir ao tribunal a quo
proceder à reforma da decisão recorrida em conformidade (exemplificativamente,
acórdão nº 178/95 Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30º vol., p.1118.). O
objecto do recurso tem de ser definido pelo recorrente com clareza e precisão. É
imposição que serve não só preocupações de racionalidade processual e do
trabalho jurisdicional, mas também preocupações com a observância dos limites
que da Constituição decorrem quanto à intervenção do Tribunal Constitucional que
correria o risco de agir ultra vires se a questão de constitucionalidade lhe
pudesse ser apresentada de modo vago. Não é um modo preciso de colocar a questão
de constitucionalidade em recurso de fiscalização concreta, maxime quando o
pretenso vício seja de inconstitucionalidade material, a indicação como
inconstitucionais de todas as normas de um diploma legal ou de um seu capítulo
relativamente extenso (cfr., por exemplo, acórdãos n.ºs 266/00 e 377/00, in www.tribunalconstitucional.pt)
Assim, entende-se não constituir modo processualmente adequado de submeter uma
questão ao Tribunal em recurso de fiscalização concreta a censura ao
entendimento dado pela decisão recorrida a todo o ?sistema normativo? de
impugnação das decisões disciplinares respeitantes aos magistrados judiciais,
composto pelos artigos 168.º a 178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais,
conjunto normativo este que abrange toda a ?Secção? que nesse Estatuto regula os
recursos das deliberações do Conselho Superior da Magistratura.
Em primeiro lugar, porque o que com isso se pretende atacar por desconforme à
Constituição é, afinal, a decisão judicial. O que, segundo a alegação do
recorrente, reduz o conteúdo normativo dos artigos 168.º a 178.º do EMJ ?a um
estrito modelo de controlo formal administrativo?, seja o que for que isso
signifique, é a prática do tribunal no exercício dos seus poderes, não a solução
legal.
Em segundo lugar, mesmo que se entenda posta em causa a opção legislativa e não
a decisão, porque a censura de constitucionalidade não vai dirigida a uma norma
precisa, mas a todo o regime de controlo jurisdicional das decisões respeitantes
ao exercício da acção disciplinar contra os magistrados judiciais, o qual
comporta várias normas e de diversa natureza. A afirmação de que o Supremo
reduziu esse sistema a ?um estrito controlo formal administrativo? não permite
identificar qual o critério normativo e a norma textual que o suporta (ou de que
esse critério foi deduzido) e que o recorrente considera contrário ao princípio
da independência dos juízes e ao (seu) direito de acesso à justiça quando são
sujeitos a decisões disciplinares do respectivo órgão de gestão e pretendem
impugná-las.
De acordo com o princípio do pedido, a actividade jurisdicional do Tribunal
incide sobre a constitucionalidade de normas perfeitamente determinadas pelo
recorrente e que a decisão recorrida, conforme os casos, tenha aplicado ou a que
haja recusado aplicação (artigo 79.º-C da LTC) e não sobre sistemas normativos
no seu conjunto (Em fiscalização concreta, ainda quando se julga procedente um
vício capaz de afectar o diploma legal no seu todo, é uma dada norma que se
julga inconstitucional). O papel do Tribunal não é o de apreciação holística dos
institutos, mas o de aferir , mediante um procedimento analítico de confronto de
normas identificadas ( dentro de um objecto hetero-definido) com concretos
parâmetros constitucionais.
Não se conhecerá pois da questão que os recorrentes referem aos artigos 168.º a
178.º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
5. Também não poderá conhecer-se da questão de inconstitucionalidade do artigo
134.º do EMJ, quando interpretado no sentido de que ?a deliberação do Conselho
Superior da Magistratura de acolhimento da proposta do inquiridor, no sentido de
o caso não evoluir para processo de avaliação do mérito profissional do juiz,
permitia, ainda assim, a aplicação de uma pena expulsiva? ou, na versão
inicialmente apresentada e que o recorrente tem por equivalente, o mesmo
preceito interpretado no sentido de que ?a motivação dos actos administrativos
não vincula na exactidão comunicativa do texto próprio e incindível do acto em
causa?, que o recorrente considera violar o n.º 3 do artigo 268.º da
Constituição.
Com efeito, o artigo 134.º do EMJ limita-se a dispor que ?terminada a instrução,
o inquiridor ou sindicante elabora relatório, propondo o arquivamento ou a
instauração de procedimento, conforme os casos?.
A interpretação que o recorrente pretende ver sindicada é manifestamente
estranha ao teor dispositivo deste preceito e à interpretação dele efectuada
pelo acórdão recorrido. A esse propósito o Supremo Tribunal de Justiça limitou?se
a considerar evidente que ?a deliberação do Conselho Permanente do CSM que, na
sequência dessa proposta [a proposta do inquiridor], mandou instaurar contra o
recorrente um processo disciplinar não implicou qualquer adesão (ou auto?vinculação)
da entidade recorrida à não aplicação duma sanção expulsiva, sugerida na
proposta do inspector. No contexto global da actuação disciplinar ? e no âmbito
do procedimento administrativo especial em que o processo disciplinar se traduz
? o único acto decisório produtor de efeitos jurídicos externos é a deliberação
recorrida (de 4.07.06); as deliberações que a antecederam, nomeadamente a que
mandou instaurar o inquérito, a que ordenou a conversão do inquérito em processo
disciplinar e a que requalificou os factos [...], não são mais do actos
meramente acessórios e instrumentais, preparatórios da decisão final, que é a
recorrida; actos, por consequência, que não integram o conceito de acto
administrativo consagrado no artigo 120.º do CPA e a que são inaplicáveis, por
isso, os artigos 140.º e 141.º do mesmo diploma legal, respeitantes à
revogabilidade dos actos administrativos válidos e inválidos'.
Portanto, contrariamente ao que o recorrente alega, o acórdão recorrido
interpretou a deliberação que, na sequência da proposta do inspector judicial no
termo do inquérito, mandou instaurar processo disciplinar contra o recorrente
como não implicando adesão às considerações do inquiridor quanto à não aplicação
de pena expulsiva. Isso é matéria de interpretação do acto administrativo, o que
escapa ao poder cognitivo deste Tribunal e só por si exclui a possibilidade de
considerar aplicado o artigo 134.º do EMJ com o sentido que o recorrente
pretende ver sindicado, que supõe que tivesse havido adesão às considerações do
inquiridor quanto à pena que poderia vir a ser aplicável no processo disciplinar
subsequente ao inquérito.
6. O recorrente arguiu a inconstitucionalidade dos artigos 122.º e 123.º do EMJ
quando interpretados no sentido de que o arguido não tem de ser ouvido acerca da
proposta de decisão constante do relatório final do instrutor do processo
disciplinar.
Recorde-se que o processo disciplinar contra magistrados judiciais se encontra
regulado nos artigos 110.º a 124.º do EMJ, sendo-lhe aplicáveis supletivamente
as normas do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração
Central Regional e Local (artigo 131.º do EMJ), estatuto este que, aliás,
tradicionalmente se considera conter o que pode considerar-se o modelo geral dos
procedimentos disciplinares e continha regime semelhante ao que aqui está em
causa (cfr. artigos 65.º e 66.º do ED aprovado pelo Decreto-Lei 24/84, de 16 de
Janeiro, que ao tempo vigorava). Dispõe o artigo 117.º do EMJ que, concluída a
instrução, o instrutor deduz acusação, articulando discriminadamente os factos
constitutivos da infracção disciplinar e os que integram circunstâncias
agravantes ou atenuantes, que repute indiciados, indicando os preceitos legais
no caso aplicáveis. O arguido é notificado da acusação, fixando-se-lhe prazo
entre 10 a 20 dias para apresentar a defesa (artigo 118.º). Durante o prazo de
apresentação de defesa o arguido, por si ou através do defensor nomeado ou do
mandatário constituído, pode examinar o processo (artigo 120.º). Com a defesa, o
arguido pode indicar testemunhas, juntar documentos ou requerer diligências (artigo
121.º).
Terminada a produção da prova, o instrutor elabora um relatório, do qual devem
constar os factos cuja existência considere provada, a sua qualificação e a pena
aplicável (artigo 122.º). O processo entra, então, na fase de decisão. O
relatório do instrutor só é comunicado ao arguido com a notificação da decisão
final (artigo 123.º).
O recorrente reconhece que o direito de defesa no processo disciplinar lhe foi
assegurado. Mas, sustenta que uma coisa é o direito de defesa em processo
disciplinar e outra é o direito de participação dos cidadãos na formação das
decisões que lhes dizem respeito, consagrado no n.º 5 do artigo 267.º da
Constituição, sendo inconstitucional uma norma ? no caso, a que se extrai da
conjugação dos artigos 122.º e 123.º do EMJ ? que exclua a notificação ao
arguido para se pronunciar sobre a proposta de decisão presente ao órgão decisor.
Dito de outro modo, o recorrente entende que o processo disciplinar deve ser
estruturado de tal modo que comporte, além da fase de defesa quanto à acusação,
uma subfase pré-decisória ou de audiência final sobre a proposta de decisão
submetida pelo instrutor ao órgão decisor, à semelhança da instituída no artigo
100.º e segs. do Código de Procedimento Administrativo, interpretado no sentido
de consagrar o modelo de elaboração obrigatória e de notificação de um ?projecto
de decisão? (cfr. PEDRO MACHETE, A Audiência dos Interessados no Procedimento
Administrativo, págs. 496-501).
Dispõe o artigo 267.º, n.º 5, da Constituição que ?O processamento da actividade
administrativa será objecto de lei especial, que assegurará a racionalização dos
meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na formação das
decisões ou deliberações que lhes disserem respeito?.
É duvidosa a natureza constitucional desta imposição de estruturação do
procedimento administrativo geral com um momento ou fase de participação dos
interessados. Enquanto uns Autores perspectivam a participação dos interessados
como direito análogo aos direitos fundamentais (cf. Sérvulo Correia, «O direito
à informação e os direitos de participação dos particulares no procedimento», in
Cadernos de Ciência de Legislação, 9/10, Janeiro-Junho de 1994, pp. 156-157;
Vasco Pereira da Silva, Em Busca do Acto Administrativo Perdido, 1996, pp. 426 e
segs.; Marcelo Rebelo de Sousa, «Regime do Acto Administrativo», in Direito e
Justiça, vol. VI, 1992, p. 45; David Duarte, Procedimentalização, Participação e
Fundamentação: Para uma Concretização do Princípio da Imparcialidade
Administrativa como Parâmetro Decisório, 1996, pp. 143 e segs.), outros autores
negam-lhe essa natureza (cf. Freitas do Amaral, «Fases do procedimento decisório
de 1.º grau, in Direito e Justiça, Vol. VI, 1992, p. 32; Pedro Machete, A
Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo, Universidade Católica
Editora, 1995, pp. 511 e segs.; José Manuel da S. Santos Botelho, Américo J.
Pires Esteves e José Cândido de Pinho, Código do Procedimento Administrativo,
Anotado, Comentado, Jurisprudência, 3.ª edição actualizada e aumentada, p. 352),
concebendo-o como uma garantia institucional na conformação do procedimento
administrativo.
Para decisão da questão colocada no presente recurso, não é decisiva a posição
quanto à natureza (direito subjectivo fundamental ou garantia institucional
objectiva) da exigência imposta ao legislador pela parte final do n.º 5 do
artigo 267.º da Constituição. Esta norma constitucional não vincula a um modo
necessário e único de organização do procedimento administrativo para assegurar
a participação dos administrados, não impondo que, em todos os tipos de
procedimento administrativo, o princípio geral da participação dos interessados
seja maximizado com a consagração de uma audiência formal, especificamente
incidente sobre a proposta final submetida ao órgão decisor ou sobre o projecto
de decisão que este se proponha adoptar, designadamente naqueles procedimentos
especiais que já comportem, por imposição constitucional, uma fase de
intervenção necessária do interessado com funções de contraditório.
Com efeito, no processo disciplinar o direito de participação assume, quanto ao
arguido, a modalidade qualificada de direito de audiência e defesa, consagrado
no n.º 3 do artigo 269.º da Constituição, que dispõe que ?em processo
disciplinar são garantidas ao arguido a sua audiência e defesa?. Esta garantia,
referida no texto constitucional a propósito do ?processo disciplinar? público,
replicando o que, de modo mais geral já consta do n.º 10 do artigo 32.º, para os
processos sancionatórios, encerra um verdadeiro direito fundamental, devendo ser
entendida como expressando um princípio geral de audiência prévia dos
interessados e de reconhecimento do seu direito de defesa relativamente a
quaisquer decisões que comportem um efeito punitivo ou equiparável. Como se
disse no acórdão n.º 1010/96, disponível em www.tribunalconstitucional.pt. ?trata-se
de princípio intimamente conexionado com a ideia de 'Estado de direito
democrático? [artigos 2.º e 9.º alínea b) da Constituição] e que não pode deixar
de ser entendido como o assegurar de possibilidades reais, face a todo e
qualquer procedimento com fim punitivo ou equiparável, de o interessado ser
ouvido de modo a poder demonstrar a própria inocência ou reduzir a
responsabilidade a termos justos, enfim, o ?right to be heard? caracterizador do
?due process?(cfr. Norman Vieira, Constitutional Civil Rights, St.Paul,
Minnesota 1990, pp 36 e ss.)?.
Trata-se de uma participação com fins garantísticos, que se materializa através
da técnica de atribuição de um direito fundamental (de audiência e defesa), cuja
substancialidade exige que o regime do processo disciplinar proporcione ao
arguido a possibilidade efectiva de se pronunciar sobre todos os factos, sobre
todas as provas e sobre todas as questões jurídicas a ponderar na decisão final.
O que desde logo se cumpre com a notificação da acusação, a possibilidade de
contestá-la e de produzir prova. Mas que também exige que, se surgirem elementos
novos na fase de defesa do arguido ou na fase de decisão, seja dada ao arguido a
possibilidade de sobre eles se pronunciar, contraditando-os, infirmando-os ou
negando-lhes relevância ou atendibilidade, se necessário com oportunidade de
produção de prova complementar.
Sucede, porém, que não é uma dimensão normativa que contrarie a substancialidade
do direito de audiência e defesa assim concebido que o recorrente põe em causa.
O que sustenta é que da Constituição decorre a exigência de que o arguido seja
sempre ouvido sobre o relatório final do instrutor do processo disciplinar, como
direito de participação no procedimento de conteúdo autónomo relativamente ao
direito de defesa, independentemente de haver ou não elementos novos a ponderar.
Mas sem razão.
Em primeiro lugar, a garantia de audiência e defesa no processo disciplinar (artigo
268.º, n.º 3, da CRP) já é um modo qualificado do princípio geral de
participação (n.º 5 do artigo 267.º), não impondo este, exigências ao legislador
ordinário que daquela modalidade de participação qualificada no procedimento
sancionatório não decorressem. Em segundo lugar, porque o n.º 5 do artigo 267.º
da Constituição não impõe ao legislador ordinário, como mínimo necessário de
realização do princípio de participação, a notificação de uma pré-decisão. Para
satisfazer a exigência constitucional, mesmo na dimensão garantística da
participação que é mais exigente ? a participação dos interessados é
multifuncional, além de finalidades garantísticas (participação defesa),
assumindo fins instrutórios (participação instrutória) e de participação
democrática ou funcional na condução dos negócios públicos (v.gr. a participação
na actividade regulamentar) ?, é suficiente (embora também necessário) que o
interessado tenha sido colocado em posição de fazer valer perante o órgão
decisor a sua perspectiva sobre todos os elementos do procedimento (de direito
ou de facto) que sejam relevantes para a decisão.
Aliás, foi este mesmo entendimento que esteve presente no acórdão n.º 516/03,
publicado no Diário da República, II Série, de 11 de Fevereiro de 2004, também
em recurso de constitucionalidade trazido pelo ora recorrente. Nesse acórdão
veio a julgar-se inconstitucional, por violação do artigo 32.º da Constituição,
a norma do artigo 122.º do EMJ, na interpretação segundo a qual não impõe a
comunicação ao arguido do relatório final, mas numa dimensão particular: quando
a notificação da acusação ao arguido não tenha incluído a indicação das normas
tidas por violadas e da natureza da pena que lhe é aplicável e a decisão final
seja no mesmo sentido do relatório. Mas considerou-se que ?a imposição de uma
obrigação geral de comunicação do relatório final em todos os processos
disciplinares introduziria uma espécie de reclamação de uma decisão ainda não
formalizada (no primeiro caso), ou um direito de audição sobre o conteúdo de um
formalismo processual que umas vezes pode ser relevante, mas outras vezes é
irrelevante para a decisão final. E, em qualquer das alternativas, não lograria
realizar melhor a garantia dos direitos de audiência e defesa dos arguidos do
que a sua pronúncia sobre o conteúdo e enquadramento legal da acusação, ao menos
nos casos em que a decisão do processo não esteja vinculada ao relatório final (obviamente,
se este circunscrevesse aquela, aumentariam as garantias do arguido ? mas à
custa da limitação dos poderes decisórios e da criação de uma forma anómala de
reclamação de uma espécie de ?protodecisão?), e, evidentemente, desde que esta
acusação contenha os elementos necessários para o exercício do direito de defesa?.
E foi apenas porque a acusação, com as características mencionadas, não
proporcionava a salvaguarda dos direitos constitucionais de audiência e defesa,
que se entendeu necessária a notificação do relatório final do instrutor. Mas
como aí também se disse e agora se reafirma, 'sendo, aliás, corrente a
existência desse relatório final e a sua não notificação ao arguido, sem que,
até ao momento, tal tenha suscitado dúvidas de constitucionalidade ?, desde que
a acusação ? ou ?nota de culpa?, ou ?nota de ilicitude? ? comunicada ao arguido
contenha os factos que lhe são imputados, o seu enquadramento legal e a
indicação da sanção aplicável, de forma a permitir o exercício do contraditório
e a audiência e defesa do arguido, uma exigência geral de renovação da sua
audição após o relatório final da entidade instrutora ? que, de resto, não
vincula a entidade decisória ? não se afigura, porém, resultar da Constituição'.
Consequentemente, não se julga inconstitucional a norma extraída dos artigos 122.º
e 123.º do EMJ na interpretação, adoptada no acórdão recorrido, de que o arguido
não tem de ser notificado da proposta de resolução final do instrutor do
processo disciplinar, salvo quando neste se suscitem questões sobre as quais o
interessado não tenha tido anteriormente oportunidade de se pronunciar.
7. Resta apreciar a constitucionalidade do artigo 151.º do EMJ interpretado no
sentido de que o Plenário do Conselho Superior da Magistratura pode avocar um
processo disciplinar que corra perante o Conselho Permanente, interpretação que
o recorrente entende violar o n.º 3 do artigo 269.º da Constituição ao suprimir
um grau de impugnação administrativa.
Dispõe o n.º 1 do artigo 217.º da Constituição que a nomeação, a colocação, a
transferência e a promoção dos juízes dos tribunais judiciais e o exercício da
acção disciplinar competem ao Conselho Superior da Magistratura, nos termos da
lei.
A Constituição remete para o Estatuto dos Magistrados Judiciais, o qual dispõe
que o Conselho Superior da Magistratura funciona em Plenário ou em Conselho
Permanente (artigo 150.º). Compõe o Plenário todos os membros do Conselho (o
Conselho é presidido pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e composto
ainda pelos seguintes vogais: a) dois designados pelo Presidente da República; b)
sete eleitos pela Assembleia da República; c) sete eleitos de entre e por
magistrados judiciais). O Conselho Permanente é uma formação mais reduzida,
integrada pelo presidente e pelo vice-presidente, por um juiz da relação, dois
juízes de direito, um dos vogais designados nos termos da alínea a) do n.º 1 do
artigo 137.º, dois vogais de entre os designados pela Assembleia da República e
o vogal do CSM a quem o processo estiver distribuído como relator.
Compete ao Conselho Permanente praticar os actos da competência do CSM não
reservadas ao Plenário (n.º 1 do artigo 152.º). O exercício da acção disciplinar,
excepto quando respeite a juízes dos tribunais superiores, é uma das matérias
cuja competência se considera tacitamente delegada no Conselho Permanente (artigo
152.º).
Dos actos do Conselho Permanente cabe reclamação para o Plenário (artigo 165.º e
alínea b) do artigo 151.º), reclamação que tem o efeito de suspender a decisão e
devolver ao Plenário a competência para decidir definitivamente (artigo 167.º-A).
Está, por esta via, sempre assegurada a intervenção do órgão de gestão da
magistratura judicial com a composição que a Constituição estabelece (artigo 218.º
da Constituição).
Além das matérias que lhe legalmente são reservadas, o Conselho Permanente pode,
nos termos da alínea e) do artigo 151.º, ?apreciar e decidir os assuntos [ ...]
que sejam avocados por sua iniciativa, por proposta do conselho permanente ou a
requerimento fundamentado de qualquer dos seus membros?.
Entende o recorrente que a interpretação desta norma ? o recorrente refere o
artigo 151.º in totum, mas só esta alínea releva ? no sentido de permitir ao
Plenário avocar um processo disciplinar pendente no Conselho Permanente diminui
inconstitucionalmente as garantias de defesa do arguido, na medida em que reduz
a 'extensão do sistema adversarial do acto punitivo do juiz?.
Esta pretensão é manifestamente infundada.
É certo que a circunstância de o acto punitivo ser proferido pelo Conselho
Permanente faculta ao magistrado arguido a oportunidade de reclamação para o
Plenário e, nessa medida, permite-lhe obter a reapreciação graciosa do acto
punitivo, solicitando a sua revogação ou modificação com qualquer fundamento
perante um órgão com uma composição parcialmente diversa daquela que praticara o
acto primário. Mas isso é um efeito secundário ou colateral de uma medida legal
que é primacialmente destinada a agilizar o funcionamento do Conselho no
exercício das suas competências correntes. Nenhuma regra ou princípio
constitucional impõe, seja em geral, seja quanto aos magistrados judiciais em
especial, que o exercício da competência disciplinar seja organizado de molde a
permitir sempre um duplo grau de decisão ou apreciação administrativa quanto aos
actos punitivos. Seguramente que não o impõe os artigos 216.º e 217.º da
Constituição, que se limitam a reservar para o Conselho Superior da Magistratura
a competência disciplinar relativa aos juízes dos tribunais judiciais, remetendo
para a lei a regulação dessa matéria. E também não se vislumbra apoio para essa
exigência no n.º 3 do artigo 269.º da Constituição. A garantia de defesa impõe,
como já se referiu, que o regime do processo disciplinar faculte ao arguido a
possibilidade de contestar a pretensão punitiva antes da adopção do acto
sancionatório, mas não que os procedimentos sejam organizados de molde a
salvaguardar sempre um meio de atacar o exercício primário da competência
disciplinar perante um órgão administrativo diverso ou diversamente constituído.
Não se julga, pois, inconstitucional a norma da alínea e) do artigo 151.º do EMJ
quando interpretada no sentido de permitir a avocação pelo Plenário de processo
disciplinar pendente perante o Conselho Permanente do Conselho Superior da
Magistratura.
8. Decisão
Por tudo o exposto, decide-se:
a) Não tomar conhecimento do objecto do recurso no que respeita às questões que
o recorrente reporta aos artigos 167.º a 178.º e ao artigo 134.º do Estatuto dos
Magistrados Judiciais;
b) Negar provimento ao recurso, na parte em que dele se conhece;
c) Condenar o recorrente nas custas com 25 (vinte e cinco) UCs de taxa de
justiça.
Lx. 30/9/2009
Vítor Gomes
Carlos Fernandes Cadilha
Ana Maria Guerra Martins
Maria Lúcia Amaral
Gil Galvão