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Processo n.º 825/08
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos
do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério
Público, o relator proferiu decisão sumária de não conhecimento do objecto do
recurso com fundamento no seguinte:
«[…] 4. Ressalta com evidência do teor da decisão recorrida, na parte
transcrita, que a interpretação aí adoptada da norma do artigo 400.º, n.º 1,
alínea c), do Código de Processo Penal, não coincide com a interpretação do
mesmo preceito que o arguido reputa inconstitucional.
O recorrente pretende ver apreciada a inconstitucionalidade daquela norma quanto
interpretada «no sentido da não admissão de recurso de acórdão do Tribunal da
Relação que conhece, prima facie, da extemporaneidade de apresentação de
recurso, por violação das garantias processuais asseguradas pelo art. 32.º, n.º
1, da CRP».
Por seu turno, a decisão recorrida é peremptória na afirmação de que a decisão
do Tribunal da Relação − quanto à questão do justo impedimento na contagem do
prazo de recurso − foi proferida em segunda instância, confirmando o que já
havia sido decidido pelo despacho do Tribunal Judicial de Matosinhos, do qual,
entre outros, vinha interposto o recurso do recorrente.
Por isso, conclui o Supremo Tribunal de Justiça que “esta interpretação não
viola o art. 32.º da CRP uma vez que as garantias de defesa do arguido em
processo penal não incluem o terceiro grau de jurisdição, por a Constituição se
bastar com um segundo grau, já concretizado no caso dos autos, aquando do
julgamento pela Relação.”
É quanto basta para concluir que a decisão recorrida não adoptou a interpretação
do artigo 400.º, n.º 1, aliena c), do CPP, que o recorrente reputa
inconstitucional, o que, só por si, obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
[…]»
2. Notificado da decisão, o recorrente veio reclamar para a conferência, ao
abrigo do artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC, nos seguintes termos:
«1. Por uma questão de economia processual, considera-se integralmente
reproduzido o recurso que despoletou a presente decisão objecto de reclamação;
2. A presente decisão enferma de vício originário, porquanto a mesma aceitou de
forma acrítica o teor da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça;
3. A fundamentação do Supremo Tribunal de Justiça que serviu os propósitos da
presente decisão, enfermava já em si de um erro de análise, pois considerava a
decisão de do Tribunal da Relação do Porto uma decisão confirmatória da 1.ª
Instância, no que ao justo impedimento dizia respeito, quando tal é falso;
4. Pressuposto para o Tribunal da Relação sequer observar do justo impedimento é
exactamente a admissão pelo Tribunal da 1.ª Instância do interposto;
5. Assim sendo, não se vislumbra como é possível que o Tribunal da Relação
confirme uma decisão da 1.ª Instância de inadmissibilidade por extemporâneo, não
se reconhecendo o justo impedimento,
6. Quando o simples facto de o recurso lhe ser entregue é exactamente a
admissibilidade do mesmo, in casu, reconhecendo o justo impedimento;
7. O objecto do recurso não era o justo impedimento, pelo que tal acórdão não
veio conhecer pela segunda vez de tal facto, mas a pronunciar-se prima facie de
tal, como já havia sido afirmado no recurso interposto para o Tribunal
Constitucional;
8. Por tal facto, e assevera-se que não por pretender gozar de um terceiro grau
de jurisdição, a presente decisão, deverá ser sujeita a nova apreciação;
NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO REQUER A V.EX.ª DIGNE ADMITIR O PRESENTE
RECURSO, E CONSEQUENTEMENTE SE CONHEÇA DO OBJECTO DO MESMO.»
3. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional
pronunciou-se no sentido da manifesta improcedência da reclamação, considerando
ser evidente a inverificação dos pressupostos do recurso.
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
4. Na decisão sumária reclamada decidiu-se não conhecer no objecto do recurso,
com o fundamento de que a decisão recorrida não adoptou a interpretação do
artigo 400.º, n.º 1, alínea c), do CPP, cuja inconstitucionalidade o recorrente
pretende ver apreciada.
A presente reclamação em nada abala esta conclusão.
Alega o reclamante que a decisão reclamada enferma do “vício originário” de ter
aceite “de forma acrítica o teor da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de
Justiça”.
Ora, no recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade, não cabe ao
Tribunal Constitucional ajuizar da correcção, em face dos cânones hermenêuticos
aplicáveis, da interpretação do direito ordinário efectuada na decisão
recorrida. Apenas lhe compete aferir da compatibilidade, com a Constituição,
dessa interpretação normativa, quando efectivamente aplicada pela decisão
recorrida, como sua ratio decidendi.
No caso vertente, pelas razões que já constam da decisão reclamada, conclui-se
que o tribunal a quo não adoptou a interpretação do artigo 400.º, n.º 1, alínea
c), do CPP, que o reclamante reputa inconstitucional.
Termos em que se conclui pela manifesta improcedência da reclamação.
III. Decisão
Pelo exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 10 de Dezembro de 2008
Joaquim de Sousa Ribeiro
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos