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Processo n.º 892/08
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
EM CONFERÊNCIA DA 1ª SECÇÃO ACORDAM NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. A. recorreu para o Tribunal Constitucional de acórdãos proferidos pelo
Supremo Tribunal de Justiça, nestes autos, em 18 de Junho, em 10 de Setembro e
em 22 de Outubro de 2008 pretendendo, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º
1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro (LTC), obter a fiscalização
concreta da conformidade constitucional do seguinte:
A - Relativamente ao disposto no artigo 272º, nº 1, do CPP:
15. Assim, as normas cuja desconformidade constitucional o Recorrente pretende
seja apreciada, com referência ao disposto no artigo 272º, nº 1 do CPP vigente
em 28 de Junho de 2006, constituída por previsão em que cabe a factualidade
processual acima descrita, é enunciada nos termos seguintes:
a) correndo inquérito contra pessoa determinada em relação à qual haja suspeita
fundada da prática de crime é obrigatório interrogá-la como arguido;
b) correndo acusação contra pessoa determinada deduzida ao abrigo do disposto no
artigo 287º, nº 1, alínea b), do CPP, o Assistente não tem legitimidade para
arguir nulidade por omissão do disposto no artigo 272º, nº 1, do Código de
Processo Penal, na redacção vigente em 28 de Junho de 2006;
c) requerida instrução nos termos do disposto no artigo 287º, nº 1, alínea b),
do CPP, o juiz de instrução não está obrigado a cumprir o disposto no artigo
272º, nº 1, do CPP.
B - Relativamente à norma do artigo 744º, nº 5, do CPC, aplicável ex vi artigo
4º do CPP:
20. Assim, as normas cuja desconformidade constitucional o Recorrente pretende
seja apreciada, com referência ao disposto no artigo 744º, nº 5, do CPC,
aplicável ao processo penal ex vi artigo 4º do CPP, já enunciada nos termos de
fls. 549, nº 3, são:
a) pode o Relator mandar baixar ao tribunal recorrido o processo para que este
cumpra o disposto nos artigos 379.º, nº 2, do CPP, 668º, nº 4, 716º e 752º, nº
3, do CPC, aplicáveis ao processo penal ex vi o disposto no artigo 4º do CPP:
b) pode o tribunal de recurso exercer a função jurisdicional sobre o recurso sem
que o tribunal recorrido se haja pronunciado sobre arguição de nulidades da
decisão recorrida, perante ele arguidas, em alegação /motivação de recurso
ordinário.
C - Relativamente à norma do artigo 417º, nº 2, do CPP:
21.3. Assim, as normas referidas ao artigo 417.º, nº 2, do CPP, cuja
desconformidade constitucional o Recorrente pretende seja apreciada, são:
a) em processo em que o Assistente exerce o direito conferido pelo disposto no
artigo 287º, nº 1, alínea b), do CPP, o tribunal de recurso não está obrigado a
pronunciar-se sobre a resposta do recorrente a Parecer do Ministério Público;
b) em processo em que o Assistente exerce o direito conferido pelo disposto no
artigo 287º, nº 1, alínea b), do CPP, o tribunal de recurso não está obrigado a
notificar o recorrente do Parecer do Ministério Público apresentado sobre
requerimentos de arguição de nulidade de decisões nele proferidas.
O recurso foi recebido no Tribunal recorrido mas, no Tribunal Constitucional,
foi proferida decisão sumária de não conhecimento do objecto do recurso, com o
seguinte fundamento:
«[...] Ora, salta à vista que o efeito que o recorrente pretende obter através
das imputadas inconstitucionalidades se cifra no cumprimento das determinações
normativas que o recorrente tem por incorrectamente aplicadas. Isto é; a
invocada desconformidade constitucional reside no não cumprimento das normas de
direito infraconstitucional, que o recorrente aponta como objecto do recurso. É,
no entanto, bem evidente que se as normas não foram aplicadas, não pode o
Tribunal Constitucional, fora dos casos previstos no artigo 80º n.º 3 da LTC,
eleger um determinado sentido de cada uma dessas normas e impô-lo ao Tribunal
recorrido.
Quanto à primeira das sindicadas normas, o Tribunal recorrido limitou-se a dizer
que o recorrente não detinha legitimidade para, como assistente, suscitar a
nulidade correspondente à falta de interrogatório do arguido. Sendo esta a norma
que o recorrente impugna, é manifesta a improcedência da sua pretensão, pois
nenhuma norma ou princípio constitucional impõe o contrário. As demais
proposições invocadas não foram aplicadas como ratio decidendi da decisão.
Semelhantes ponderações valem para a norma impugnada em 2º lugar. A coberto da
invocação do preceito, o recorrente pretende apenas sindicar a actividade do
Tribunal recorrido, por entender que o não cumprimento do indicado preceito
legal 'gera' a inconstitucionalidade de uma hipotética norma aqui invocada com
um conteúdo contrário. Contudo, na economia da decisão recorrida, o campo de
aplicação da norma é sujeito a pressupostos processuais cuja inverificação
impede a sua mobilização com o alcance pretendido. Não pode, portanto,
concluir-se, sequer, que o Tribunal recorrido tenha aplicado a norma com o
aludido sentido contrário à literalidade da disposição.
Também a última questão colocada não obedece aos requisitos impostos pela
disciplina do presente recurso, e pelas razões já referidas. Não é uma questão
de inconstitucionalidade normativa saber se 'o tribunal de recurso não está
obrigado a pronunciar-se sobre a resposta do recorrente a parecer do Ministério
Público'; ou se 'o tribunal de recurso não está obrigado a notificar o
recorrente do parecer do Ministério Público apresentado sobre requerimentos de
arguição de nulidade de decisões nele proferidas'. Na verdade, a resposta a tais
perguntas há-de depender da configuração concreta da lide, num preciso momento
de tramitação, configurando-se como totalmente abusiva a tentativa de, a
pretexto de desconformidade constitucional de hipotéticas normas legais
alegadamente aplicadas, pretender atribuir ao Tribunal Constitucional a tarefa
de sindicar a actividade própria dos Tribunais, executada no exercício das suas
funções jurisdicionais, aqui insindicáveis.[...]»
O recorrente reclama contra esta decisão nos seguintes termos:
[...] notificado do despacho de 14.1.2009, vem, ao abrigo do disposto nos
artigos 69º e 78º-B, nº 1, da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro (LTC), e 201º, nº
1, 666º, nº 3, e 669º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil, arguir
nulidade processual e requerer seja esclarecido o real sentido dos textos
seguintes, em ordem ao eventual exercício do direito conferido pelo disposto no
artigo 78º-A, nº 3, da LTC:
1. O recurso interposto respeita a normas aplicadas em decisões proferidas em
processo penal, relativas a actos nele praticados pelo Ministério Público. A
intervenção deste nos autos de recurso para o Tribunal Constitucional é imposta
por lei, como é sabido. E as respostas ou promoções do Ministério Público em
processo penal, têm de ser notificadas aos outros sujeitos processuais inclusive
em sede de recurso de constitucionalidade. O recorrente não foi notificado de
nenhum acto do representante do Ministério Público nesse Alto Tribunal, sendo
que o despacho ora sindicado não refere sequer que o Ministério tenha tido vista
dos autos. Assim, verifica-se omissão de acto imposto por lei nos termos do
disposto no artigo 201º, nº 1, do CPC, com a cominação do disposto no seu nº 2.
Pelo que, o recorrente requer o suprimento de tal vício processual.
2. Diz o sindicado despacho, a fls. 2: “o Tribunal recorrido limitou-se a dizer
que o recorrente não detinha legitimidade para, como assistente, suscitar a
nulidade correspondente à falta de interrogatório do arguido. Sendo esta a norma
que o recorrente impugna”... Assim,
• A declaração de que “sendo esta a norma que o recorrente impugna” refere-se à
norma que o Tribunal recorrido aplicou ao dizer que o recorrente não detinha
legitimidade para, como assistente, suscitar a nulidade correspondente à falta
de interrogatório do arguido, ou à que se encontrava em vigor em 28 de Junho de
2006?
3. Diz o sindicado despacho, a fls. 2: “é manifesta a improcedência da sua
pretensão”; mas, a final, foi decidido “não conhecer do objecto recurso”. Assim,
• A declaração de improcedência da sua pretensão quanto à norma do artigo 272º,
nº 1, do CPP, arguida de inconstitucionalidade, significa julgamento de
improcedência ou de não conhecimento do objecto do recurso?
4. Diz o sindicado despacho, a fls. 2/3: “na economia da decisão recorrida, o
campo de aplicação da norma é sujeito a pressupostos processuais cuja
inverificação impede a sua mobilização com o alcance pretendido”. Salvo melhor
opinião tal declaração padece de obscuridade:
• quais são os pressupostos processuais que não se verificaram e impedem a
mobilização dos mesmos com o alcance pretendido pelo recorrente?
5. Diz o sindicado despacho, a fls. 3: “Também a última questão colocada não
obedece aos requisitos impostos pela disciplina do presente recurso”... Salvo
melhor opinião, tal declaração padece de obscuridade/ambiguidade:
• A referência a “última questão colocada” remete para os dois sentidos
normativos do artigo 4170, nº 2, do CPP, ou para o sentido normativo impugnado
na alínea b) reproduzida a fls. 2 – última “questão” posta na resposta de
12.1.2009?
2. Não houve resposta, cumprindo conhecer.
O recorrente pretende impugnar a decisão sumária em análise, mediante a
invocação de vícios e erros que, na perspectiva do reclamante, determinariam a
sua insubsistência. A pretensão deve, portanto, ser interpretada e analisada nos
termos previstos no n.º 3 do artigo 78-A da LTC.
Invoca: 'O recorrente não foi notificado de nenhum acto do representante do
Ministério Público nesse Alto Tribunal, sendo que o despacho ora sindicado não
refere sequer que tenha tido vista dos autos. Assim, verifica-se omissão de acto
imposto por lei nos termos do disposto no artigo 201º, nº 1, do CPC, com a
cominação do disposto no seu nº 2. Pelo que, o recorrente requer o suprimento de
tal vício processual.'
Porém, para que lhe deva ser notificado qualquer acto, necessário é
que a lei determine essa diligência; tal não sucede, no caso, motivo pelo qual o
pedido do reclamante se mostra despido de razão.
Formula, depois, as seguintes perguntas:
• A declaração de que “sendo esta a norma que o recorrente impugna” refere-se à
norma que o Tribunal recorrido aplicou ao dizer que o recorrente não detinha
legitimidade para, como assistente, suscitar a nulidade correspondente à falta
de interrogatório do arguido, ou à que se encontrava em vigor em 28 de Junho de
2006?
• A declaração de improcedência da sua pretensão quanto à norma do artigo 272º,
nº 1, do CPP, arguida de inconstitucionalidade, significa julgamento de
improcedência ou de não conhecimento do objecto do recurso?
• quais são os pressupostos processuais que não se verificaram e impedem a
mobilização dos mesmos com o alcance pretendido pelo recorrente?
• A referência a “última questão colocada” remete para os dois sentidos
normativos do artigo 417º, nº 2, do CPP, ou para o sentido normativo impugnado
na alínea b) reproduzida a fls. 2 — última “questão” posta na resposta de
12.1.2009?
É manifesto que, através de tais perguntas, o recorrente visa invocar pretensos
erros de julgamento de que enfermaria a decisão reclamada, uma vez que os
trechos dela retirados não apresentam – lidos no contexto em que figuram –
qualquer obscuridade ou ambiguidade que afecte a decisão ou os seus fundamentos.
Assim entendida a reclamação, é de fazer notar que não cabe ao Tribunal
Constitucional apurar se a norma que o Tribunal recorrido aplicou era, ou não, a
que estava 'em vigor'. Ao Tribunal Constitucional incumbe, na fase de
verificação dos requisitos do recurso, averiguar se a norma impugnada
corresponde àquela que foi aplicada na decisão recorrida; apurando-se que o
Tribunal recorrido se limitara a dizer que 'o recorrente não detinha
legitimidade para, como assistente, suscitar a nulidade correspondente à falta
de interrogatório do arguido', fica bem patente que com ela não coincide a
formulação polimórfica da norma enunciada pelo recorrente, segundo a qual,
'correndo inquérito contra pessoa determinada em relação à qual haja suspeita
fundada da prática de crime é obrigatório interrogá-la como arguido; correndo
acusação contra pessoa determinada deduzida ao abrigo do disposto no artigo
287º, nº 1, alínea b), do CPP, o assistente não tem legitimidade para arguir
nulidade por omissão do disposto no artigo 272º, nº 1, do Código de Processo
Penal, na redacção vigente em 28 de Junho de 2006; requerida instrução nos
termos do disposto no artigo 287º, nº 1, alínea b), do CPP, o juiz de instrução
não está obrigado a cumprir o disposto no artigo 272º, nº 1, do CPP', sendo, por
isso, inevitável concluir que o recorrente impugnara uma norma diversa daquela
que fora aplicada ou, dito de outro modo, que o recorrente pretenderia impugnar
uma norma que não fora aplicada na decisão recorrida. Tal circunstância impede o
Tribunal de conhecer do objecto do recurso.
As demais perguntas são manifestamente impertinentes, nada havendo, quanto a
elas, que decidir.
3. Nestes termos, o Tribunal julga a reclamação improcedente, indeferindo-a,
assim mantendo a decisão que recusou sumariamente tomar conhecimento do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 10 de Março de 2009
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos