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Processo nº 772/08
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que é
reclamante o Sindicato Nacional dos Quadros e Técnicos Bancários e reclamado A.,
vem o primeiro reclamar, ao abrigo do nº 4 do artigo 76º da Lei da Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 19 de
Agosto de 2008.
2. O reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da
alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, do acórdão do Tribunal da Relação de
Lisboa de 2 de Abril de 2008, cujo pedido de aclaração foi indeferido por
decisão de 11 de Junho do mesmo ano. No requerimento de interposição de recurso
pode ler-se, entre o mais, o seguinte:
«(…)
Por fim, quer a sentença quer o Acórdão, ora em crise, são materialmente
inconstitucional, porquanto a Constituição da República Portuguesa
(Constituição) consagra, no artigo 46.°, o direito geral de associação, enquanto
direito, liberdade e garantia pessoal (Capítulo 1, do Título II, da Parte 1),
garantindo em particular a liberdade sindical (ad. 55.°) e alguns direitos
sindicais em especial (ad. 56.°).
(…)
Nestes termos, quer a sentença quer o Acórdão são materialmente
inconstitucionais por violarem o direito geral de associação (art. 46°), a
liberdade sindical (art.55) e alguns direitos sindicais em especial (art. 56),
previstos na CRP e, por fim, o art. 9°, n° 1 j) dos Estatutos do SNQTB e art.
480º do CT (…)».
3. Foi então proferido o seguinte despacho:
«O Sindicato Nacional dos Quadros Técnicos Bancários vem interpor recurso para o
Tribunal Constitucional, ao abrigo do artº 70º, nº 1, al. b) da Lei nº 28/82, de
15/11, mas não indicou a norma aplicada pela sentença de 1ª instância e pelo
acórdão desta Relação cuja inconstitucionalidade tenha suscitado no decurso do
processo.
Assim, ao abrigo do artº 75º-A, nº 5 do citado diploma, convida-se o recorrente
a prestar essa indicação, no prazo de 10 dias».
4. O recorrente não respondeu ao convite formulado, face ao que foi proferido o
despacho agora reclamado, com o seguinte teor:
«Uma vez que o recorrente não deu cumprimento ao disposto no artº 75º-A, nº 2,
do D.L. 28/82, de 15/11, mesmo após o convite que lhe foi feito pelo despacho de
fls. 537, nos termos do nº 5 de tal artigo, indefere-se, ao abrigo dos nºs 1 e 2
do artº 76º do mesmo diploma, o requerimento de interposição de recurso para o
Tribunal Constitucional, de fls. 520 (…)»
5. O recorrente vem agora reclamar deste despacho, nos seguintes termos:
«(…) Foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional na sequência do
Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa a 1[1]/06/2008.
O Tribunal da Relação de Lisboa, com data de 17/7/2008, notifica o Recorrente
para lhe dar conta que, tendo interposto recurso ao abrigo da alínea b) do n.° 1
do art. 70.° da Lei n.° 28/82 de 15/11, “não indicou a norma aplicada pela
sentença de 1ª instância e pelo acórdão desta Relação cuja inconstitucionalidade
tenha suscitado no decurso do processo.”
Ora, o Recorrente, salvo melhor opinião, considera que as normas já se
encontravam devidamente expressas no requerimento de interposição de recurso,
senão vejamos:
“vem interpor recurso para o Tribunal Constitucional nos termos do art. 70°, 1,
b) da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional,”
(in requerimento de interposição de recurso, fls. ...) (negrito nosso)
“Nestes termos, quer a sentença quer o Acórdão são materialmente
inconstitucionais por violarem o direito geral de associação (art. 46°), a
liberdade sindical (art.55) e alguns direitos sindicais em especial (art. 56),
previstos na CRP e, por fim, o art. 9°, n° 1 j) dos Estatutos do SNQTB e art.
480° do CT.” (in requerimento de interposição de recurso, fls. ...) (negrito
nosso)
“A questão da inconstitucionalidade da sentença proferida pela 1ª Instância foi
levantada nas alegações de recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa.” (in
requerimento de interposição de recurso, fls. ...) (negrito nosso)
Ora,
Dispõe o art. 75-A n.° 2 do Tribunal Constitucional que:
“ Sendo o recurso interposto ao abrigo das alíneas b) e f) do n.° 1 do artigo
70º, do requerimento deve ainda constar a indicação da norma ou princípio
constitucional ou legal que se considera violado, bem como da peça processual em
que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou ilegalidade.”
(sublinhado e negrito nossos) (negrito e sublinhado nossos)
Foi exactamente a aplicação do art. 75-A n.° 2 da supra identificada Lei, que
refere expressamente que o Recorrente tem apenas que indicar qual a peça
processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade ou
ilegalidade, no caso sub judice, a sentença da 1ª instância e o acórdão da 2ª
instância, que determinou o silêncio do Recorrente aquando da notificação do
despacho de fls. 537.
Aliás, o Recorrente, no decurso do processo, nomeadamente, nas suas alegações do
recurso de agravo e no pedido de aclaração do Acórdão proferido pelo Tribunal da
Relação de Lisboa, suscitou as seguintes inconstitucionalidades:
(…)
Pelo exposto, os requisitos do art. 75.°-A foram satisfeitos, ab initio, não
sendo necessário o seu suprimento; a decisão admite recurso; foi interposto em
tempo; por quem tinha legitimidade e com fundamento legal, pelo que a aplicação
do n.° 2 do art. 76.° da Lei n.° 28/82 de 15/11 não tem, salvo melhor opinião,
aplicação no processo em crise (…)».
5. Neste Tribunal, os autos foram com vista ao Ministério Público, que se
pronunciou pela forma seguinte:
«A presente reclamação carece manifestamente de fundamento.
Na verdade, não é legítimo ao recorrente ignorar a prolação de um convite ao
aperfeiçoamento de – aliás, no caso, notórias – deficiências do requerimento de
interposição do recurso para este Tribunal Constitucional, com o pretexto de que
considera – na situação dos autos, sem o mínimo fundamento – inexistirem tais
vícios formais – conduzindo, naturalmente, o injustificado incumprimento de tal
ónus a liminar rejeição do recurso».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
1. Pelo despacho agora reclamado o recurso de constitucionalidade interposto foi
indeferido, ao abrigo dos nºs 1 e 2 do artigo 76º da LTC, uma vez que o
recorrente “não deu cumprimento ao disposto no artigo 75º-A, nº 2,” da LTC. O
recorrente tinha sido convidado, previamente, nos termos do nº 5 do artigo 75º-A
da LTC, a indicar a norma aplicada pela sentença de 1ª instância e pelo acórdão
da Relação cuja inconstitucionalidade suscitou no decurso do processo, não tendo
apresentado qualquer resposta.
O reclamante vem agora sustentar que “as normas já se encontravam devidamente
expressas no requerimento de interposição de recurso” e que o artigo 75º-A, nº
2, da LTC “refere expressamente que o Recorrente tem apenas que indicar qual a
peça processual em que o recorrente suscitou a questão da inconstitucionalidade
ou ilegalidade”.
2. Contrariando este último argumento, importa salientar, desde logo, que a
segunda parte do nº 1 do artigo 75º-A da LTC estabelece, expressamente, o
requisito da indicação da norma cuja inconstitucionalidade (ou ilegalidade) se
pretende que o Tribunal aprecie. Aliás, atento o teor do convite ao
aperfeiçoamento, terá sido, precisamente, esta falta de indicação que levou ao
indeferimento do requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade.
E não, propriamente, a falta de indicação da peça processual em que o recorrente
suscitou a questão de inconstitucionalidade, apesar de o despacho reclamado ter
invocado o nº 2 do artigo 75-Aº da LTC.
3. Por outro lado, importa saber se a circunstância de o recorrente não ter
apresentado qualquer resposta, na sequência do convite que lhe foi feito ao
abrigo do nº 5 do artigo 75º-A da LTC, arrasta sem mais o indeferimento do
requerimento de interposição de recurso e, consequentemente, o indeferimento de
reclamação ao abrigo do nº 4 do artigo 76º da LTC.
A questão põe-se por referência aos artigos 75º-A, nº 7, e 76º, nº 2, da LTC:
segundo o primeiro, se o requerente não responder ao convite efectuado pelo
relator no Tribunal Constitucional, o recurso é logo julgado deserto; de acordo
com o segundo, o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional deve ser indeferido quando não satisfaça os requisitos do artigo
75º-A, mesmo após o suprimento previsto no seu n.º 5.
Face ao teor destas disposições legais e porque a questão se põe no âmbito de
reclamação de despacho que indefira o requerimento de interposição do recurso de
constitucionalidade (artigos 76º e 77º da LTC), é de concluir que o legislador
não quis prever como consequência paralela à deserção do recurso o indeferimento
liminar do mesmo, quando o recorrente não responda ao convite efectuado ao
abrigo do nº 5 do artigo 75º-A da LTC.
4. Pelo exposto, importa averiguar se o recorrente satisfez os requisitos do
artigo 75º-A, nºs 1 e 2, da LTC, mas atendendo, exclusivamente, ao teor do
requerimento de interposição de recurso. Não tendo respondido ao convite
efectuado ao abrigo do nº 5 do artigo 75º-A da LTC, o recorrente deixou de poder
colmatar as deficiências de tal requerimento na presente reclamação.
Um dos requisitos do artigo 75º-A, constante da segunda parte do nº 1, é a
indicação da norma cuja inconstitucionalidade (ou ilegalidade) se pretende que o
Tribunal aprecie, sob pena de indeferimento do requerimento de interposição de
recurso (artigo 76º, nº 2, da LTC).
O requerimento de interposição de recurso (fl. 520 e ss.) é completamente omisso
quanto àquela indicação, referindo apenas a inconstitucionalidade material quer
da sentença quer do acórdão. Importa, por isso, confirmar o despacho que
indeferiu o requerimento de interposição de recurso para este Tribunal,
indeferindo-se a presente reclamação.
III. Decisão
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 12 de Novembro de 2008
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão