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Processo n.º 797/08
Plenário
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam no Plenário do Tribunal Constitucional:
A - Relatório
1 – O Presidente da Assembleia Municipal de Viana do Castelo
submeteu ao Tribunal Constitucional, para efeitos da fiscalização preventiva da
constitucionalidade e da legalidade, nos termos do art.º 25.º da Lei Orgânica
n.º 4/2000, de 24 de Agosto, que aprova o regime jurídico do referendo local
(LORL – à qual pertencerão os preceitos doravante citados sem indicação de outra
referência), a deliberação de realização de um referendo local, tomada na
segunda reunião da sessão ordinária dessa assembleia municipal, ocorrida em 6 de
Outubro de 2008, e iniciada em 26 de Setembro de 2008.
2 – O requerimento, que foi apresentado no Tribunal Constitucional,
no dia 15 de Outubro de 2008, vem instruído com cópias da acta da reunião da
Câmara Municipal de Viana do Castelo, em que foi deliberada a apresentação, à
assembleia municipal, de uma proposta de deliberação de realização do referendo;
da acta da reunião da assembleia municipal em que a proposta de deliberação de
realização do referendo foi aprovada; do edital de convocação da segunda reunião
da sessão ordinária da Assembleia Municipal e de declarações de voto, feitas nas
referidas sessões da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal.
3 – O Presidente do Tribunal Constitucional admitiu liminarmente,
por despacho, o pedido e ordenou a distribuição dos autos.
4 – Em cumprimento de despacho do relator, o presidente da
Assembleia Municipal de Viana do Castelo prestou informação sobre a data da
recepção, nesse órgão, da proposta de referendo.
5 – Elaborado o memorando a que alude o artigo 58.º, n.º 2, da Lei
n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC), e fixada a orientação do Tribunal, importa
decidir conforme dispõe o artigo 59.º da mesma Lei.
B - Fundamentação
6 – Dos documentos juntos aos autos tem-se como assente o seguinte:
a) – Na reunião da Câmara Municipal de Viana do Castelo, de 12 de
Setembro de 2008, foi apresentada pelo Presidente da Câmara Municipal de Viana
do Castelo a seguinte proposta de realização de um referendo local: -“PROPOSTA
DE REALIZAÇÃO DE UM REFERENDO LOCAL SOBRE A ADESÃO DO MUNICÍPIO DE VIANA DO
CASTELO À COMUNIDADE INTERMUNICIPAL DA NUT III MINHO-LIMA: - Em 28 de Abril de
2008 a Câmara Municipal e a Assembleia Municipal de Viana do Castelo, rejeitaram
a integração do Município na Comunidade Intermunicipal da NUT III Minho-Lima,
por discordarem do articulado da Proposta de Lei, então em discussão na Comissão
do Poder Local da Assembleia da República. Entretanto, na reunião de Câmara de
13 de Junho de 2008, os Vereadores do PSD propuseram a realização de um
Referendo sobre a adesão do Município de Viana do Castelo à referida Comunidade
Intermunicipal, proposta que foi aprovada por unanimidade do Executivo
Camarário, para concretização logo que fosse publicada a referida Lei. Em 11 de
Julho de 2008, a Assembleia da República aprovou a legislação que “Estabelece o
Regime Jurídico do Associativismo Municipal”, sem introduzir qualquer alteração
ao articulado da proposta de lei, que merecera a discordância da maioria da
vereação e dos deputados municipais de Viana do Castelo. Em 27 de Agosto de
2008, foi publicado no Diário da República, 1 Série nº 165, a Lei nº 45/2008,
que mantém inalterados os artigos da Proposta de Lei, alvo da discordância dos
órgãos autárquicos vianenses. Dando sequência à decisão unânime do Executivo
Municipal de 13 de Junho de 2008, a Câmara Municipal submete à aprovação da
Assembleia Municipal a realização de um “Referendo local sobre a integração do
Município de Viana do Castelo na Comunidade Intermunicipal da NUT III
Minho-Lima, nos termos estabelecidos na referida Lei nº 45/2008, de 27 de Agosto
de 2008”.
Propõe-se, igualmente, a aprovação pela Assembleia Municipal da seguinte
proposta de pergunta a submeter aos vianenses:
CONCORDA COM A INTEGRAÇÃO DO MUNICÍPIO DE VIANA DO CASTELO NA COMUNIDADE
INTERMUNICIPAL DA NUT III MINHO-LIMA, NOS TERMOS DA LEI N° 45/2008?
SIM ( ) NÃO ( )”;
b) – Na mesma reunião da Câmara Municipal, foi, pelos vereadores
eleitos pelo PSD, apresentada, em alternativa à anterior, proposta do seguinte
teor:
“PROPOSTA PARA REALIZAÇÃO DO REFERENDO LOCAL DE ADESÃO DO MUNICÍPIO
DE VIANA DO CASTELO À COMUNIDADE INTERMUNICIPAL DO MINHO-LIMA – Considerando a
deliberação tomada por unanimidade, pela Câmara Municipal de Viana do Castelo,
na sua reunião do dia 13 de Junho de 2008, de aprovação, nos termos do n.º 1 do
artigo 10.º da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto, da Proposta apresentada
pelos vereadores eleitos pelo PSD, de realização de um referendo local, de
âmbito municipal, para decidir da integração ou não do município na futura
comunidade intermunicipal Minho-Lima, cujos fundamentos se dão por integralmente
reproduzidos, anexando-se, para o efeito, a respectiva acta que faz parte
integrante da presente proposta. Considerando que já foi publicada, em Diário da
República, a Lei n.º 45/2008, de 27 de Agosto de 2008, que estabelece o Regime
Jurídico do Associativismo Municipal (revogando a Lei 10/2003), que entrou em
vigor no mês de Setembro. Considerando que o referendo é um dos instrumentos de
democracia directa, pelo qual os cidadãos eleitores são chamados a
pronunciar-se, por sufrágio directo e secreto, sobre questões que órgãos do
poder político pretendam resolver mediante acto normativo, sobre questões
concretas da competência de órgãos das autarquias locais ou da competência das
respectivas assembleias legislativas regionais ou do governo regional.
Considerando que a matéria pretendida que seja objecto de referendo é da
competência da Assembleia Municipal nos termos da alínea g) do art. 53.º.° da
Lei n.º 169/99, de 18 de Setembro, na redacção decorrente da Lei n.º 5-A/2002,
de 11 de Janeiro. Considerando que a aprovação da realização de referendos
locais é da competência da Assembleia Municipal nos termos da alínea g) do art.
53.º.° da Lei acima referida conjugada com o art.º 23.º da Lei Orgânica n.º
4/2000, de 24 de Agosto. Considerando o disposto no n.º 1 do art. 24.º.° da Lei
Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto.
Temos a honra de propor que a Câmara delibere:
Nos termos do disposto na alínea d) no n.º 6 do artigo 64. ° da Lei n.º 169/99,
de 18 de Setembro, na redacção decorrente da Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro,
propor à Assembleia Municipal de Viana do Castelo que delibere – no uso da
competência prevista na alínea g) do art. 53.º.° da Lei referida, conjugada com
o art. 23.º.° da Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de Agosto -, nos termos e para
os efeitos do artigo 240. °, n.º 1 da Constituição e da Lei Orgânica 4/2000, de
24 de Agosto, apresentar ao Tribunal Constitucional e ao Senhor Presidente da
Câmara de Viana do Castelo a proposta de realização de um referendo local em que
os cidadãos eleitores recenseados no concelho de Viana do Castelo sejam chamados
a pronunciar-se sobre a pergunta seguinte:
Concorda que o Município de Viana do Castelo integre a Comunidade Intermunicipal
Minho Lima a constituir pelos municípios da respectiva NUT III, – Arcos de
Valdevez, Caminha, Melgaço, Monção, Paredes de Coura, Ponte da Barca, Ponte de
Lima, Valença, Viana do Castelo e Vila Nova de Cerveira, no quadro da Lei nº
45/2008?
SIM ( )
NÃO ( )”;
c) – Depois da apresentação da proposta efectuada pelo PSD, o
Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo declarou, na mesma reunião,
que “na sua proposta, pretende ser apenas mais sintético e objectivo, mas não se
opõe à inclusão de todos os municípios e, por isso, vota favoravelmente a
proposta dos vereadores do PSD e não submete a sua a votação”;
d) – A Câmara Municipal de Viana do Castelo deliberou, por
unanimidade, aprovar a proposta de referendo a que alude a alínea b), supra;
e) – Esta deliberação foi objecto de uma declaração de voto do
Presidente da Câmara Municipal do seguinte teor:
“Viana do Castelo foi, em 1994, o primeiro município a defender a
associação dos dez municípios do distrito, o que não se concretizou por se ter,
surpreendentemente, constituído a Associação do Vale do Minho, excluindo os
quatro concelhos do Vale do Lima. Agora estaríamos perante uma oportunidade
daquele objectivo se concretizar, se a Lei n.º 45/2008 não prejudicasse tão
gravemente os interesses do município de Viana do Castelo na associação
distrital. De facto, tendo o concelho de Viana do Castelo 34% dos eleitores do
distrito, é inaceitável que esta lei lhe atribua apenas 10% dos votos no
Conselho Executivo da Comunidade Intermunicipal e 15% dos votos na Assembleia
Intermunicipal, permitindo a constituição de sectárias maiorias artificiais para
tomar todas as decisões sobre os destinos da associação dos dez concelhos. Mais
grave ainda, o articulado da Lei n.º 45/2008 dispõe que, quando se trata de
pagar as despesas com pessoal e as dívidas da Comunidade Intermunicipal, os
encargos são assumidos na proporção dos habitantes de cada município, cabendo
consequentemente ao município de Viana do Castelo a maior fatia! Foi por se
discordar da falta de legitimidade destas maiorias artificiais, para defender
com isenção os interesses de Viana do Castelo, que se recusou a integração do
Município na Comunidade Intermunicipal Minho Lima. E por que esta é a atitude
que melhor defende os interesses de Viana do Castelo, estou absolutamente
convencido que é subscrita e apoiada por todos os vianenses, verdadeiramente
identificados com a autonomia e com o desenvolvimento do concelho. Por isso, não
temos medo de submeter esta posição ao Referendo proposto pelos que não se
conformam com as decisões maioritárias da Câmara e da Assembleia Municipal. Os
vianenses sabem muito bem quem tem defendido os interesses de Viana do Castelo
nos últimos 15 anos, com o sucesso que todos os residentes e visitantes podem
observar nas quarenta freguesias do município!”;
f) – Na segunda reunião da sessão ordinária da Assembleia Municipal
de Viana do Castelo, iniciada em 26 de Setembro de 2008, que se realizou em 6 de
Outubro de 2008, foi a proposta da Câmara Municipal a que aludem as alíneas b) e
d), supra, submetida à apreciação daquela assembleia municipal e aprovada por
maioria com 67 votos a favor, 0 votos contra e 1 abstenção;
g) – No momento em que foi declarada aberta a reunião da sessão a
que alude a alínea anterior verificou-se a presença de 70 deputados e a falta de
11 deputados municipais;
h) – Na fase de discussão da proposta da Câmara Municipal a que
aludem as alíneas b) e d), supra, registaram-se, na assembleia municipal,
intervenções do Presidente da Câmara Municipal de Viana do Castelo e de seis
deputados municipais, com o sentido constante dos documentos n.ºs 4 a 10, juntos
a fls. 8 a 35 dos autos, e foram proferidas declarações de voto, por cinco
deputados municipais, nos termos constantes dos documentos n.ºs 11 a 15, juntos
a fls. 36 a 49 dos autos.
i) – No dia 12 de Setembro de 2008, a comissão permanente da
Assembleia Municipal de Viana do Castelo reuniu e decidiu marcar a sessão da
Assembleia Municipal para o dia 26 de Setembro de 2008, para apreciação de ordem
de trabalhos, entre os quais figurava a proposta a que aludem as alíneas b) e
d), supra, e, porque não ficou esgotada essa ordem de trabalhos, a sessão
terminou, apenas, no referido dia 6 de Outubro de 2008.
7 – Resulta do exposto que o requerente pretende a verificação da
constitucionalidade e da legalidade do referendo em que são chamados a
pronunciar-se os cidadãos eleitores, recenseados na área territorial
correspondente à do Município de Viana do Castelo, sobre a seguinte pergunta:
“Concorda que o Município de Viana do Castelo integre a Comunidade
Intermunicipal Minho Lima a constituir pelos municípios da respectiva NUT III, –
Arcos de Valdevez, Caminha, Melgaço, Monção, Paredes de Coura, Ponte da Barca,
Ponte de Lima, Valença, Viana do Castelo e Vila Nova de Cerveira, no quadro da
Lei nº 45/2008?
SIM ( )
NÃO ( )”.
8 – Compete ao Tribunal Constitucional, em fiscalização preventiva
obrigatória, verificar a constitucionalidade e a legalidade do referendo,
incluindo a apreciação dos requisitos relativos ao universo eleitoral, de acordo
com o disposto nas disposições combinadas dos artigos 223.º, n.º 2, alínea f),
da Constituição, 11.º e 105.º da LTC e artigos 25.º e seguintes da LORL.
O requerente tem legitimidade para o pedido de fiscalização
preventiva do concreto referendo local, na qualidade de presidente do órgão da
autarquia que deliberou a sua realização, no exercício de competência legalmente
prevista – a Assembleia Municipal de Viana do Castelo –, em face do disposto nos
artigos 23.º, 25.º e 28.º, n.º 1, da LORL e 53.º, n.º 1, alínea g) da Lei n.º
169/99, de 18 de Setembro, na redacção da Lei n.º 5-A/2002, de 11 de Janeiro.
Como se colhe do relatado, o requerimento, consubstanciante do
pedido de verificação da constitucionalidade e da legalidade, deu entrada no
Tribunal Constitucional, no nono dia posterior ao da deliberação de realização
do referendo. Mostra-se, assim, ultrapassado o prazo estipulado no artigo 25.º
da LORL, “de oito dias a contar da deliberação de realização do referendo”.
Todavia, tal circunstância, como se diz no Acórdão n.º 359/2006,
disponível em www.tribunalconstitucional.pt, “não suscita qualquer questão
processualmente relevante, uma vez que o n.º 6 do artigo 28.º, da mesma Lei,
expressamente dispõe que o incumprimento desse prazo não prejudica a
admissibilidade do requerimento”.
9 – O referendo local pode advir de iniciativa representativa, ou
seja, “dos deputados às assembleias municipais ou assembleias de freguesia, à
câmara municipal e à junta de freguesia, consoante se trate de referendo
municipal ou de freguesia” (artigo 10.º, n.º 1, da LORL) ou de iniciativa
popular, ou seja, de “grupos de cidadãos recenseados na respectiva área” (artigo
10.º, n.º 2 da LORL).
No caso em apreço, a iniciativa do referendo local tem origem
representativa, por haver sido exercida pela Câmara Municipal de Viana do
Castelo, mediante proposta de deliberação apresentada à Assembleia Municipal de
Viana do Castelo, ao abrigo da alínea d) do n.º 6.º do artigo 64.º da Lei n.º
169/99, de 11 de Janeiro, na redacção dada pela Lei n.º 5-A/2002, de 11 de
Janeiro e do artigo 10.º, n.º 1, da LORL.
De acordo com o disposto no artigo 24.º, n.º 1, da LORL, “a
deliberação [mencionada no artigo anterior, da assembleia municipal ou da
assembleia de freguesia] é obrigatoriamente tomada, em sessão ordinária ou
extraordinária, no prazo de 15 dias após a recepção da iniciativa referendária,
caso esta tenha origem representativa”.
Ora, na situação dos autos, verifica-se o incumprimento deste prazo.
Na verdade, a proposta de deliberação de realização do referendo,
efectuada pela Câmara Municipal de Viana do Castelo, foi recebida pela comissão
permanente da Assembleia Municipal, em 12 de Setembro de 2008, e a deliberação
da assembleia, apenas, ocorreu em 6 de Outubro de 2008.
Mas, conquanto não se mostre cumprida a exigência prescrita neste
preceito, nem por isso se pode concluir, sem mais, que o desrespeito de tal
prazo determine a caducidade da proposta.
Como se diz no Acórdão n.º 30/99, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, “a consagração de um prazo entre a recepção da
proposta e a deliberação representará, antes, uma medida favorável ao seguimento
da proposta visando obstar a que o órgão competente protele a sua votação. Nessa
medida, tomada efectivamente a deliberação com a aprovação da proposta,
degrada-se em não essencial a formalidade, irrelevando o apontado
incumprimento”.
É certo que este entendimento foi firmado relativamente ao disposto
no artigo 6.º, n.º 2, da Lei n.º 49/90, de 24 de Agosto, que então regia as
“consultas directas aos cidadãos eleitores a nível local”.
Todavia, importa notar que o actual preceito tem um conteúdo
dispositivo idêntico ao da lei anterior.
A deliberação sobre a realização do referendo foi tomada pela
pluralidade de votos dos membros presentes na Assembleia Municipal de Viana do
Castelo, em virtude de a terem votado, favoravelmente, 67 dos 70 deputados com
cuja presença foi declarada aberta a sessão, pelo que se mostra cumprida a
exigência prescrita no n.º 5 do referido artigo 24.º da LORL.
Porque a adesão às comunidades intermunicipais, que correspondam a
uma unidade territorial, definida com base nas Nomenclaturas das Unidades
Territoriais Estatísticas de nível III (NUTS III), é da competência das
assembleias municipais, de acordo com o disposto no artigo 4.º, n.º 1, da Lei
n.º 45/2008, de 27 de Agosto, não se coloca, sequer, o problema da necessidade
da existência de parecer de outro órgão autárquico sobre a questão submetida a
referendo, a que alude os n.ºs 2 a 4 do referido artigo 24.º da LORL.
Não se vislumbram, assim, em face do que vem sendo dito, quaisquer
irregularidades formais ou de procedimento de que o Tribunal deva conhecer.
10 – Antes de entrar no exame dos aspectos relacionados com a
constitucionalidade e legalidade do referendo, afigura-se conveniente, tendo em
vista essa apreciação, principalmente no que contende com a determinação do
sentido da pergunta efectuada, fazer uma brevíssima análise do regime jurídico
vigente, relativo à constituição das comunidades intermunicipais, constante da
Lei n.º 45/2008, de 27 de Agosto.
Assim, importa notar que este diploma alterou profundamente o regime
do associativismo municipal referente às comunidades intermunicipais, que
constava até então da Lei n.º 11/2003, de 13 de Maio, que revogou, mantendo, no
entanto, a distinção entre “associações de municípios de fins múltiplos”,
denominadas de “comunidades intermunicipais (CIM)” e “associações de municípios
de fins específicos”.
Ao contrário do que sucedia anteriormente, o estatuto de pessoas
colectivas de direito público, apenas, foi atribuído às CIM, passando as
associações de municípios de fins específicos a serem pessoas colectivas de
direito privado (artigo 2.º da Lei n.º 45/2008).
Por outro lado, enquanto que antes os municípios eram livres de se
associarem para constituírem uma comunidade intermunicipal, desde que estivessem
ligados entre si por um nexo territorial, actualmente eles só podem integrar-se
em CIM com base nas NUTS III, sendo estas instituídas, em concreto, com a
aprovação dos estatutos pelas assembleias municipais da maioria absoluta dos
municípios que as integrem, podendo, no entanto, a adesão dos municípios
verificar-se em momento posterior à sua criação e sem dependência do
consentimento dos restantes municípios (artigo 4.º da Lei n.º 45/2008).
Os órgãos das CIM são a assembleia intermunicipal e o conselho
executivo, podendo, por decisão deste, funcionar um órgão consultivo integrado
por representantes dos serviços públicos regionais do Estado e dos interesses
económicos, sociais e culturais da sua área de intervenção (artigo 7.º da Lei
n.º 45/2008).
A assembleia intermunicipal mantém a natureza de órgão deliberativo,
tendo uma competência semelhante, mas mais alargada do que a atribuída pela Lei
n.º 11/2003, às comunidades intermunicipais de fins gerais, sendo constituída
por membros de cada assembleia municipal, eleitos de forma proporcional, nos
termos seguintes: i) três nos municípios até 10 000 eleitores; ii) cinco nos
municípios entre 10 001 e 50 000 eleitores; iii) sete nos municípios entre 50
001 e 100 000 eleitores; iiii) nove nos municípios com mais de 100 000 eleitores
(artigo 11.º da Lei n.º 45/2008).
Por sua vez, o conselho executivo continua a ser o órgão de direcção
da CIM, sendo constituído pelos presidentes das câmaras municipais de cada um
dos municípios integrantes que elegem, de entre si, um presidente e dois
vice-presidentes (artigo 15.º da Lei n.º 45/2008).
A imputação das despesas com os encargos de pessoal são feitas nos
mesmos termos que estavam previstos na Lei revogada (artigo 22.º, n.º 2, da Lei
n.º 45/2008).
11 – As NUTS III, a que a Lei n.º 45/2008 se refere, são unidades
territoriais estabelecidas pelo Decreto-Lei n.º 68/2008, de 14 de Abril, “para
efeitos de organização territorial das associações de municípios e das áreas
metropolitanas e para a participação em estruturas administrativas do Estado e
nas estruturas de governação do Quadro de Referência Estratégico Nacional
2007-2013 (QREN)”, sendo definidas com base nas nomenclaturas das unidades
territoriais estatísticas de nível 3, com as alterações previstas no mesmo
diploma.
As NUTS foram um conceito criado, no âmbito da União Europeia, entre
o Office Statistique, os serviços da Comissão e os Estados-membros,
consubstanciando uma norma comum de Nomenclatura das Unidades Territoriais para
Fins Estatísticos, obrigando à adopção necessária de regras e procedimentos
estatísticos comuns, funcionalizadas para a produção de estatísticas regionais
de natureza económica e para a repartição de fundos a esse nível, na União
Europeia. O conceito trouxe “uma classificação única para as várias tipologias
regionais existentes nos Estados-membros, visando a harmonização de critérios
para efeitos informativos e estatísticos comuns a todos os países da União
Europeia”.
O território nacional estava subdividido em 3 NUTS I (Portugal
Continental, Região Autónoma dos Açores, Região Autónoma da Madeira); 7
subregiões NUTS II (Norte, Centro, Lisboa, Alentejo, Algarve, Região Autónoma
dos Açores, Região Autónoma da Madeira) e 28 NUTS III, entre as quais se conta a
Minho-Lima.
Todavia, só em 2003, é que foi aprovado o Regulamento (CE) n.º
1059/2003, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de Maio de 2003, referente
às NUTS, sendo os respectivos anexos que lhes diziam respeito substituídos,
recentemente, pelo anexo constante do Regulamento (CE) n.º 105/2007, da
Comissão, de 1 de Fevereiro de 2007.
No plano nacional, as NUTS foram adoptadas, desde 1986, com a
Resolução do Conselho de Ministros n.º 34/86, de 5 de Maio, como instrumento de
produção, obtenção, tratamento e análise de informação regional de natureza
económica, que constituísse suporte adequado para a preparação das decisões
políticas relativas ao planeamento do desenvolvimento regional (cf., também, os
Decretos-Lei n.º 46/89, de 15 de Fevereiro e n.º 244/2002, de 5 de Novembro de
2002).
Pela mão do Decreto-Lei n.º 68/2008, o legislador erigiu o conceito
de NUTS III, também, a critério normativo, entre o mais, de definição das
unidades territoriais para efeitos de organização territorial das associações de
municípios, pelo que o mesmo adquiriu, a nível interno, uma nova funcionalidade
operativa.
O Município de Viana do Castelo integra (como sempre integrou para o
efeito funcional anterior das NUTS III) a unidade territorial do Minho-Lima,
conjuntamente, com os municípios de Arcos de Valdevez, Caminha, Melgaço, Monção,
Paredes de Coura, Ponte da Barca, Ponte de Lima, Valença e Vila Nova de
Cerveira.
12 – A possibilidade de referendos locais está prevista no artigo
240.º, n.º 1, da Constituição que prescreve que “as autarquias locais podem
submeter a referendo dos respectivos cidadãos eleitores matérias incluídas nas
competências dos seus órgãos, nos casos, nos termos e com a eficácia que a lei
estabelecer”.
Densificando este preceito constitucional, dispõe, por seu turno, o
artigo 3.º da LORL que “o referendo local só pode ter por objecto questões de
relevante interesse local que devam ser decididas pelos órgãos autárquicos ou de
freguesia e que se integrem nas suas competências, quer exclusivas quer
partilhadas com o Estado e com as Regiões Autónomas”, devendo “a determinação
das matérias a submeter a referendo local obedece[r] aos princípios da unidade e
subsidiariedade do Estado, da descentralização, da autonomia local e da
solidariedade interlocal”.
Mesmo segundo um critério de simples evidência, pode considerar-se
que a matéria do referendo tem relevante interesse municipal.
Na verdade, o desempenho das atribuições que o artigo 5.º da Lei n.º
45/2008 confere às CIM é adequadamente susceptível de se repercutir na promoção
do planeamento e da gestão da estratégia de desenvolvimento económico, social e
ambiental do território do Município de Viana do Castelo, possibilita a
articulação dos investimentos municipais de interesse intermunicipal, a
participação na gestão de programas de apoio ao desenvolvimento regional,
designadamente no âmbito do Quadro Estratégico Nacional (QREN), o planeamento
das actuações de entidades públicas, de carácter intermunicipal e a articulação
entre os municípios que integram a CIM e os serviços da administração central em
diversas áreas, como o abastecimento público, redes de equipamentos de saúde,
ordenamento do território, segurança e protecção civil, mobilidade e
transportes, etc.
Constata-se, também, que o objecto do referendo diz respeito a
matéria que não é abrangida pelo âmbito de exclusão do referendo definido no
art.º 4.º da LORL.
Não se vislumbra, por outro lado, que as projectadas respostas, de
sim ou de não, determinem a prática de actos ou a adopção de normas legais que
sejam desconformes com a Constituição (No sentido de a apreciação da
constitucionalidade material da questão posta se inscrever no âmbito do controlo
de constitucionalidade, pronunciou-se o Acórdão n.º 288/98, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt).
13 – A deliberação de realização do referendo municipal comporta,
apenas, uma pergunta e não é precedida de quaisquer considerandos, preâmbulos ou
notas explicativas, pelo que se mostram respeitadas as exigências formuladas nos
n.ºs 1 e 3 do artigo 7.º da LORL.
Verifica-se, também, que a pergunta está formulada em termos de
poder obter, apenas, respostas de sim ou não, respeitando, assim, o princípio
dilemático ou da bipolaridade do referendo, consagrado no n.º 2 do artigo 7.º da
LORL (cf. Acórdão n.º 360/91, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional,
19º volume, página 701).
Importa, agora, apurar se ela se encontra formulada com
objectividade, clareza e precisão e sem sugerir directa ou indirectamente o
sentido das respostas, ou seja, se cumpre os demais requisitos estabelecidos no
artigo 7.º, n.º 2, da LORL.
14 – Como se sublinhou no Acórdão n.º 288/98 (Diário da República, I
série A, de 18 de Abril de 1998), 'a clareza da pergunta há-de conjugar-se com a
sua objectividade e precisão, o que implica uma maior complexidade e a
utilização de terminologia rigorosa, para se evitar, posteriormente, a
existência de equívocos quanto às soluções propugnadas, por a pergunta abranger
situações não pretendidas ou consentir leituras ambíguas”, sendo que os
requisitos da objectividade, clareza e precisão são verdadeiramente cruciais
para permitir aos eleitores a leitura e compreensão acessíveis e sem
ambiguidades da pergunta, evitando “que a vontade expressa dos eleitores seja
falsificada pela errónea representação das questões” (J. J. Gomes
Canotilho/Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa anotada, 3.ª ed.,
Coimbra, 1993, anot. X ao art. 118.º), requerendo-se “a minoração, na medida do
possível, do risco de leituras e entendimentos da questão pelos seus
destinatários que possam – directa ou implicitamente, por interrogações ou
ambiguidades que suscitem no eleitor – apontar para uma das respostas
alternativas”.
Por outro lado, o adequado cumprimento destes requisitos não poderá
deixar de ser equacionado, a partir do ponto de vista da globalidade dos
eleitores, porquanto, “fazendo apelo a um paralelismo com a teoria da impressão
do destinatário, o horizonte para aferir a compreensão das perguntas há-de ser o
cidadão eleitor normal, sem conhecimentos especializados nas matérias sobre que
é inquirido” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 531/98, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt).
Ora, afigura-se que a pergunta, em análise, não cumpre esses
requisitos fundamentais, na medida em que a sua formulação comporta um sentido
impreciso e ambíguo quanto às circunstâncias com que define a hipótese fáctica
submetida a referendo, sendo susceptível, como tal, de comprometer a exacta
representação da questão colocada e o carácter unívoco e inequívoco da solução
propugnada.
Tal como a questão se encontra colocada, não fica claro se a adesão
do Município se encontra, ou não, condicionada à adesão de todos os demais,
sendo certo que, ao contrário do que a pergunta deixa transparecer e como se
dispõe no artigo 4.º, n.º 1, da Lei n.º 45/2008, de 27 de Agosto, a instituição
em concreto da comunidade intermunicipal se basta “com a aprovação dos estatutos
pelas assembleias municipais da maioria absoluta dos municípios que as
integrem”.
Na verdade, a expressão verbal “a constituir pelos municípios da respectiva NUT
III (...) no quadro da Lei n.º 45/2008” poderá ser percepcionada – e a tanto
corresponder a vontade popular manifestada – como pretendendo, apenas,
precipitar o sentido legal, segundo o qual a comunidade intermunicipal
Minho-Lima só pode ser constituída pelos municípios que integram a respectiva
NUTS, ficando logo instituída com a aprovação dos estatutos pelas assembleias
municipais da maioria absoluta dos seus municípios.
Mas pode, também, ser lida com o sentido de a comunidade municipal
Minho-Lima só poder ser constituída mediante a adesão de todos os municípios que
integram a NUTS III, explicitados na pergunta, incluindo aquele em relação ao
qual são inquiridos os destinatários da pergunta, mau grado tal sentido estar
afastado por lei, como já se disse.
Pode, ainda – até pelo antecedente do combate político local
desenvolvido no seio da Câmara Municipal e da Assembleia Municipal de Viana do
Castelo contra, entre o mais, os critérios legais de composição das assembleias
intermunicipais – ser vista como questionando, implicitamente, o mérito da
solução que ficou a constar de tal diploma quanto à composição da comunidade
intermunicipal e dos seus respectivos órgãos, não se excluindo a hipótese de a
expressão poder ser compreendida (e o sentido da resposta referendária
transportar essa vontade) como admitindo uma possibilidade dilemática da
existência da comunidade intermunicipal, com base noutro quadro normativo, que
não o da Lei n.º 45/2008, quando é seguro que a comunidade intermunicipal,
apenas, pode existir no respeito pelo disposto nesse diploma e no Decreto-Lei
n.º 68/98, mesmo que criadas, anteriormente, nos termos da Lei n.º 11/2003
(artigo 38.º da Lei n.º 45/2008).
E continuando a assumir-se que o adequado cumprimento dos requisitos
da clareza e da precisão da pergunta há-de ser equacionado a partir do ponto de
vista dos seus destinatários e que nesse juízo há que “considerar-se […] a maior
ou menor frequência do uso de certas expressões na linguagem acessível aos
destinatários da questão, bem como a existência de expressões ou formulações
alternativas, muito próximas ou praticamente equivalentes, mas,
significativamente, mais claras e objectivas”, pode, também, concluir-se que
perturba a clareza da questão a mobilização da abreviatura “NUT III”, dado que
não se crê que o seu significado funcional – formal e material –seja acessível
ou inteligível pela globalidade dos eleitores, em causa.
No caso o recurso ao termo ou abreviatura “NUT III” é desnecessário,
em nada melhorando a precisão ou objectividade da pergunta referendária.
Com efeito, a denominação de cada CIM contém, obrigatoriamente
(artigo 6º, nº 2, da Lei nº 45/2008, de 27 de Agosto), a referência à unidade
territorial definida com base nas NUTS que integra.
Deste modo, nos termos em que a pergunta se encontra formulada, a
menção da comunidade intermunicipal a instituir, a referência a NUTS III, a
enunciação dos municípios que integram a comunidade intermunicipal e o
aditamento verbal “no quadro da Lei n.º 45/2008” induzem a sua falta de clareza,
objectividade e precisão e, consequentemente, a sua ilegalidade, por violação do
n.º 2 do artigo 7.º da LORL.
Nesta medida, impõe-se que a Assembleia Municipal de Viana do
Castelo proceda, querendo, à sua reformulação, nos termos previstos no artigo
27.º da LORL.
C – Decisão
15 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional
decide pronunciar-se pela ilegalidade do referendo local que, na sua sessão
ordinária de 6 de Outubro de 2008, a Assembleia Municipal de Viana do Castelo
deliberou realizar e ordenar a notificação do seu presidente para que, no prazo
de oito dias, aquele órgão delibere, querendo, no sentido da sua reformulação,
expurgando-a da ilegalidade.
Lisboa, 29 de Outubro de 2008
Benjamim Rodrigues
Carlos Fernandes Cadilha
Maria Lúcia Amaral
Maria João Antunes
Gil Galvão
João Cura Mariano
Vítor Gomes
José Borges Soeiro
Ana Maria Guerra Martins
Joaquim de Sousa Ribeiro (votei o acórdão,
muito embora considere que a enunciação dos municípios que integram a comunidade
intermunicipal não constitui um factor de obscurecimento do alcance da pergunta,
mas antes um esclarecimento como um contributo positivo para a precisão, na
medida em que nos dá a composição da unidade territorial em causa)
Carlos Pamplona de Oliveira – com
declaração que junto.
Mário José de Araújo Torres (Vencido, nos
termos da declaração de voto junta)
Rui Manuel Moura Ramos
DECLARAÇÃO DE VOTO
Vencido, por não acompanhar o julgamento contido nos pontos 14. e 15. do
acórdão.
Com efeito, sem deixar de reconhecer a dificuldade de aferir, 'a partir do ponto
de vista da globalidade dos eleitores' – como se diz no acórdão –, a
objectividade, a precisão e a clareza da pergunta que, em termos dilemáticos, o
referendo visa colocar, divirjo da solução adoptada.
Tenho por seguro, em primeiro lugar, que a tarefa do Tribunal há-de decorrer de
um critério de apreciação negativa que vise afastar obstáculos à compreensão da
pergunta, impedindo interrogações capciosas, equívocas, obscuras ou
dissimuladas; assim, em vez de analisar a proposição gramatical no intuito de
saber se ela atinge um patamar de absoluta objectividade, precisão e clareza –
tarefa que, para além de impossível, vai arrastar o Tribunal a determinar, ele
próprio, a morfologia da pergunta –, afigura-se-me que o Tribunal se deve
limitar a verificar se a interrogação comporta elementos que a tornam confusa ou
equívoca.
Assim analisada a questão, concluo que a pergunta não se apresenta desconforme
com as imposições legais.
Com efeito, a referência à «NUTS III» é inócua, visto que é a própria lei que
estabeleceu a designação; se o sentido não é claro, o vício decorre da
denominação legal e não da pergunta. A invocação do diploma legal não obscurece
o sentido da pergunta, antes torna preciso quadro normativo em que a questão se
coloca. Finalmente, a enumeração dos municípios que integram o departamento em
causa constitui um dado de facto, verdadeiro, a que não é possível negar
interesse para o convencimento do cidadão chamado a responder ao referendo.
Acrescento, apenas, que não é possível garantir, em todo o caso, que assim
formulada, a pergunta não possa ser eventualmente interpretada com um sentido
diverso daquele que é pretendido ou, até, de um modo que não abranja o seu
completo significado. Mas o certo é que, despida a interrogação de elementos que
objectivamente perturbam o sentido que o senso comum dela extrai, tal resultado,
apesar de claramente patológico, também se filia na álea que a consulta
referendária fatalmente comporta.
Carlos Pamplona de Oliveira
DECLARAÇÃO DE VOTO
Votei vencido por considerar que a pergunta aprovada
pela deliberação sujeita à apreciação deste Tribunal não padece dos vícios que o
precedente Acórdão lhe aponta e que determinariam a sua falta de clareza,
precisão e objectividade.
Como resulta do contexto em que se insere a presente
iniciativa referendária, o que se pretende é consultar os cidadãos eleitores
recenseados no concelho de Viana do Castelo sobre a adesão desse município, não
a uma “Comunidade Intermunicipal Minho‑Lima” qualquer, sujeita a um
indeterminado quadro jurídico, mas à específica Comunidade prevista com essa
designação e sujeita às regras de composição, organização e funcionamento
definidas na Lei n.º 45/2008, de 27 de Agosto, e no Decreto‑Lei n.º 68/2008, de
14 de Abril.
Sendo esse o objectivo – perfeitamente legítimo – da
consulta popular projectada, as menções constantes da pergunta sujeita a
apreciação do Tribunal Constitucional surgem, a meu ver, necessárias e
adequadas à satisfação dos requisitos de objectividade, clareza e precisão, sem
prejuízo de eventualmente se considerar preferível a substituição da expressão
“Comunidade … a constituir pelos municípios …” pela expressão “Comunidade … a
que poderão aderir os municípios …”.
Mas, mesmo com a redacção proposta, não me parece,
contrariamente ao afirmado no precedente Acórdão, que o uso da expressão “a
constituir” deixe transparecer o entendimento de que a instituição em concreto
da Comunidade dependerá da adesão de todos os municípios enumerados, sendo, pelo
contrário, óbvio, com a referência a “no quadro da Lei n.º 45/2008”, que não se
pretende – o que não teria qualquer cabimento – fazer sufragar um regime
contrário ao previsto nessa Lei.
Por outro lado, se a seca referência à “Comunidade
Intermunicipal da NUT III Minho‑Lima”, proposta inicialmente, surgia, de facto,
como pouco clara, dado o natural desconhecimento do significado dessa sigla por
parte da generalidade dos eleitores, já a enunciação dos municípios
susceptíveis de integrar essa Comunidade, que passou a constar do texto final da
pergunta, contribuiu decisivamente para a sua clarificação. Neste contexto, a
manutenção da referência a “NUTS III” (que se terá entendido ser imposta pelo
n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 45/2008), imediatamente “descifrada” com a
enumeração dos municípios susceptíveis de serem envolvidos, não se afigura como
determinando irremediavelmente a obscuridade da pergunta.
Finalmente, a referência ao quadro legal – cujas
implicações serão naturalmente objecto de esclarecimento na campanha
referendária – surge como absolutamente essencial ao fidedigno apuramento da
vontade popular. Repete‑se: o que se pretende é apurar se os munícipes de Viana
do Castelo concordam, ou não, com a integração em Comunidade Intermunicipal que
ficará sujeita ao regime de composição, organização e funcionamento definido na
Lei n.º 45/2008. A eliminação, na pergunta, das referências que foram
consideradas desrespeitadoras dos requisitos da objectividade, clareza e
precisão é que – em minha opinião – conduzirá à formulação de uma pergunta
intoleravelmente imprecisa.
Votei, por isso, no sentido de que o Tribunal
Constitucional se devia pronunciar pela constitucionalidade e legalidade da
deliberação referendária em causa.
Mário José de Araújo Torres