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Processo n.º 677/08
3ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, a Relatora proferiu a seguinte Decisão Sumária:
«I – RELATÓRIO
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorridos o Ministério
Público, B. e C., foi interposto recurso de acórdão proferido, em conferência,
pela 5ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, em 25 de Junho de 2008 (fls. 4906
a 4912), para que fosse apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do:
i) n.º 9 do artigo 113º do CPP, “na interpretação que
lhes foi dada no douto Acórdão do S.T.J., segundo a qual: (…) a necessidade de
notificação pessoal do arguido da decisão condenatória não se aplica aos
tribunais superiores e que a menção de sentença surge no artigo apenas para
referir a primeira instância e, por isso, conforme o Acórdão de que agora se
recorre, pág. 5: «É nas fases preliminares e na de julgamento em primeira
instância que se tem que acautelar, da maneira mais exigente, a possibilidade de
a defesa se organizar o mais eficazmente possível, e que portanto se tem que
evitar, tudo quanto possa constituir surpresa para o arguido” (fls. 4937 e
4938);
ii) e do n.º 6 do artigo 425º do CPP, “na interpretação
que lhes foi dada no douto Acórdão do S.T.J., segundo a qual: (…) embora o
artigo expresse claramente a necessidade de notificação dos acórdãos aos
arguidos, também aqui não devem os mesmos ser pessoalmente notificados aos
arguidos” (fls. 4938).
Cumpre, então, apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
2 Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo” (cfr.
fls. 4940), com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não
vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito
legal, pelo que se deve começar por apreciar se estão preenchidos todos os
pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, nº
2, da LTC.
3. Desde logo, verifica-se que qualquer que fosse a decisão a tomar por este
Tribunal sobre o objecto do recurso interposto, aquele sempre se revelaria
processualmente inútil. Senão, veja-se.
Independentemente da interpretação normativa acolhida, quer pelos despachos do
Relator junto do Supremo Tribunal de Justiça, quer pela decisão recorrida,
constata-se, após análise dos autos, que o acórdão condenatório, proferido em 24
de Abril de 2008 (fls. 4789 a 4837) foi efectivamente notificado ao
arguido/recorrente e ao respectivo defensor constituído. Assim sucede porque,
mediante despacho proferido, em 08 de Maio de 2008 (fls. 4842 e 4842-verso), que
decidiu a arguição de irregularidade deduzida pelo arguido/recorrente, em 05 de
Maio de 2008 (fls. 4841), o Relator junto do Supremo Tribunal de Justiça, apesar
de propugnar o entendimento de que “o recorrente não tem que ser notificado
pessoalmente do acórdão deste S.T.J.”, ordenou, simultaneamente, a notificação
do mesmo, para conhecimento, ao arguido/recorrente:
“Notifique-se este despacho juntando cópia do mesmo bem como do acórdão
condenatório.” (fls. 4842-verso)
Na sequência deste despacho, o arguido/recorrente foi pessoalmente
notificado do acórdão condenatório, bem como o seu mandatário constituído nos
presentes autos, mediante cartas registadas e expedidas em 08 de Maio de 2008
(fls. 4847 e 4848). Daqui decorre que, independentemente, do entendimento
adoptado pela decisão recorrida relativamente às normas extraídas do n.º 9 do
artigo 113º e do n.º 6 do artigo 425º, ambos do CPP, seguro é que o arguido não
ficou impedido de exercer qualquer direito processual pelo facto de a decisão
recorrida nos presentes autos ter decidido naquele sentido.
Aliás, verifica-se que, notificado do acórdão condenatório,
proferido em 24 de Abril de 2008, o ora recorrente veio aos autos recorridos,
solicitando a aclaração do mesmo (fls. 4861 a 4880), o que conduziu à prolação
do acórdão de conferência de 10 de Julho de 2008 (fls. 4923 a 4928). É assim por
demais evidente que nenhuma das garantias de defesa do arguido foi colocada em
risco, na medida em que aquele pôde exercer os direitos processuais que lhe
cabiam face ao acórdão condenatório, tendo o tribunal recorrido proferido
acórdão sobre um pedido de aclaração do mesmo.
De toda a tramitação processual vertida nos autos resulta que, ainda
que o Tribunal Constitucional viesse a proferir uma decisão que julgasse
inconstitucional a interpretação normativa acolhida pela decisão recorrida,
aquela sempre se revelaria processualmente inútil. A única consequência
processual de tal hipotética decisão favorável ao recorrente redundaria na
repetição da notificação do acórdão condenatório proferido em 24 de Abril de
2008, que – conforme já se demonstrou – já ocorreu por carta registada e
expedida em 08 de Maio de 2008, por força do despacho do Relator junto do
Supremo Tribunal de Justiça, proferido a fls. 4842-verso.
Assim, por se revelar processualmente inútil, entende este Tribunal
não ser de conhecer do objecto do presente recurso.
III – DECISÃO
Nestes termos, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82,
de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de
Fevereiro, decide-se não conhecer do objecto do recurso interposto.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos
termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
2. Inconformado, vem o recorrente reclamar da mesma para a conferência, nos
seguintes termos:
« A., id. nos autos em referência, notificado da decisão sumária vem apresentar
RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA
nos termos do artigo 78-A, n° 3, da Lei do Tribunal Constitucional, com os
seguintes fundamentos:
1 - Em 6 de Maio de 2008, o arguido interpôs requerimento alegando
irregularidade pela falta de notificação pessoal do acórdão condenatório,
invocando para tal os artigos 113, nº 9, 425, n°6 e, 123, todos do Código de
Processo Penal.
2 — Tal pedido foi indeferido, em 8 de Maio de 2008, com notificação da decisão
ao arguido e ao seu mandatário, decisão essa que ordenava o envio de cópia do
mencionado acórdão.
3- Entendeu-se, e salvo melhor opinião, bem, que o Supremo Tribunal de Justiça
não considerava tal envio de cópia como uma notificação pessoal ao arguido do
referido acórdão.
4- Em 12 de Maio de 2008, o mandatário do arguido interpôs requerimento a
irregularidade de falta de notificação do acórdão condenatório ao arguido,
circunstância de que só tomou conhecimento através da notificação de 8 de Maio
e, invocou a inconstitucionalidade, solicitando que se realizasse a pedida
notificação.
5- Tal solicitação foi indeferida, por decisão de 13 de Maio na qual, novamente,
se decide que, “….não há mais nenhuma notificação a fazer da aludida decisão. “—
págs. 4858, linhas 9 e 10.
6- Entendeu o S.T.J. que tendo o mandatário do arguido sido notificado do
acórdão e, tendo o próprio arguido recebido cópia do mesmo, não haveria que ser
pessoalmente notificado.
7- Ou seja, entendeu o S.T.J., em todas estas decisões proferidas que, não
haveria que fazer-se a notificação pessoal ao arguido e que o envio de cópia do
acórdão também não significava notificação pessoal do mesmo.
8- E de outra forma não se pode interpretar o sentido da totalidade do que vem
escrito em toda a página 4858 da decisão do S.T.J. de 13 de Maio de 2008 bem
como os dois últimos parágrafos da decisão de 8 de Maio de 2008, a págs. 4843,
verso.
9- Ora, a Exma. Conselheira Relatora do processo, na sua decisão sumária,
entende de forma radicalmente diferente, considerando que o arguido foi,
efectivamente, pessoalmente notificado do mencionado acórdão.
10- Verifica-se, assim, salvo melhor opinião, que existe uma irregularidade na
decisão do S.T.J., nos termos do artigo 123, do C.P.P. uma vez que, entende-se
que o acórdão deveria ter sido pessoalmente notificado ao arguido, nos termos
dos artigos 113, nº 9 e, 425, nº6, do C.P.P.
11°- Com efeito, o arguido, qualquer arguido, tem o direito de ver cumpridas
todas as normas de direito processual, mormente aquelas que contendem com
quaisquer prazos, entendendo-se, assim, que a notificação pessoal ao arguido,
neste caso, nunca ocorreu, por não ser necessária, segundo o entendimento do
S.T.J.,
12°- não sendo, assim, correcto, salvo melhor opinião, dizer-se que uma decisão
favorável ao arguido redundaria numa repetição. Nada se iria repetir porque nada
foi feito.
13°- A interpretação de tais normativos no sentido de que a notificação de uma
decisão condenatória relevante, que não seja de 1ª Instância, dever ser feita
exclusivamente ao defensor, não sendo necessária a notificação, também, do
arguido, é inconstitucional, o que novamente se invoca, por violação do artigo
32, nº 1, da Constituição da República Portuguesa.
14°- Embora sendo certo de que o Tribunal Constitucional não está vinculado
pelas decisões de outros tribunais, não deixa de ser verdade que esta decisão
sumária é contrária à interpretação efectuada por àquelas outras tomadas pelo
S.T.J., mormente a interpretação conferida pela última tomada por um colectivo
em conferência pelo que,
13°- pretende o arguido dela reclamar para a conferência do Tribunal
Constitucional.
Termos em que, com o douto suprimento que se invoca, deve merecer provimento a
presente reclamação, admitindo-se o recurso e vindo a final a ser proferida
decisão que conheça da alegada irregularidade, mormente por
inconstitucionalidade dos normativos do C.P.P. com a interpretação que lhes foi
dada e, em consequência deve ser revogada a decisão, ordenando-se a devolução
dos autos ao S.T.J. para notificação pessoal do arguido do acórdão condenatório,
assim se fazendo
JUSTIÇA»
3. O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado da
reclamação deduzida no processo em epígrafe, respondeu-lhe nos termos seguintes:
«1°
A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2°
Na verdade, a argumentação expendida pelo reclamante não tem na devida conta a
natureza instrumental dos recursos de fiscalização concreta, ficando
naturalmente precludido o conhecimento do mérito nos casos em que tal se revela
inútil, face à tramitação da causa no Tribunal recorrido.
4. B. e outros, assistentes nos presentes, notificados da reclamação para a
conferência, vieram dizer o seguinte:
«O teor do alegado pelo arguido não infirma a argumentação da decisão sumária.
Como deste se infere, a pretensão do arguido é meramente académica!
Melhor ainda: dilatória!
Pela simples razão de que “mal ou bem” à luz das normas por ele invocadas, o
mesmo foi, efectivamente, notificado, pessoalmente, do douto acórdão do STJ.
Assim, nenhum interesse existe para a decisão da causa determinar-se se deveria
ou não ter sido notificado pessoalmente.
Termos em que deve ser indeferida a reclamação do arguido.»
Cumpre pois apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
5. A presente reclamação é manifestamente improcedente, em nada abalando a
bondade da fundamentação da decisão sumária proferida.
Aliás, a argumentação do reclamante, tal como bem nota o Representante do
Ministério Público junto deste Tribunal, não tem na devida conta a natureza
instrumental dos recursos de fiscalização de constitucionalidade, a qual implica
que não se conheça do objecto do recurso quando uma decisão deste Tribunal se
revele inútil.
Tal como já se demonstrou na fundamentação da Decisão Sumária, para a qual se
remete, uma hipotética decisão favorável ao arguido seria processualmente
inútil, pois redundaria na repetição da notificação do acórdão condenatório.
Deste modo, não existem fundamentos para alteração da decisão reclamada.
III – DECISÃO
Nestes termos, indefere-se a presente reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC’s, nos
termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de Outubro.
Lisboa, 17 de Novembro de 2008
Ana Maria Guerra Martins
Vítor Gomes
Gil Galvão