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Processo n.º 766/08
2.ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional
Relatório
No âmbito do processo criminal n.º 11/98.4 TARDD, que corre os seus termos no
Tribunal de Instrução Criminal de Évora, foi proferida decisão pelo
Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora, em sede de incidente de
reclamação, que confirmou a decisão reclamada de retenção do recurso interposto
pelo arguido A. relativamente a decisão judicial contra si proferida em primeira
instância.
O referido arguido interpôs então recurso da decisão final do incidente de
reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do disposto no artigo
446.º do Código de Processo Penal (CPP), alegadamente por ter sido proferida
decisão contra a jurisprudência fixada no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
n.º 7/2004.
O Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora não recebeu esse recurso por
entender, à luz do previsto no próprio artigo 446.º, do CPP, que apenas o
Ministério Público tem legitimidade para interpor recurso de decisão proferida
contra a jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, e ainda por
entender, nos termos do artigo 405.º, n.º 4, do CPP, que é insusceptível de
recurso extraordinário de fixação de jurisprudência a decisão proferida pelo
presidente do tribunal superior que confirme o despacho de retenção.
Desse despacho reclamou o arguido, tendo o Senhor Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça, mediante despacho datado de 28 de Fevereiro de 2008,
proferido a seguinte decisão:
«O despacho questionado foi proferido pelo Vice-Presidente do Tribunal da
Relação de Évora em conhecimento de uma reclamação, que foi indeferida.
Tendo em conta que a decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação que
confirme o despacho de retenção do recurso proferido pelo juiz da 1.ª instância
é definitiva, nos termos do n.º 4 do art. 405.º do CPP, não é passível de
recurso fundada em oposição com jurisprudência fixada nos termos do art. 446.º
do CPP, a que aliás apenas se encontram sujeitas as decisões dos tribunais e não
as dos seus presidentes, quando se pronunciam nos termos do citado art. 405.º do
CPP.
Assim sendo, não é o recurso admissível para este Supremo Tribunal.»
Após ter requerido, sem sucesso, a reforma desta decisão, o arguido veio
interpor recurso da mesma para o Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
«(...) tendo sido notificado da Douta Decisão de V. Exa., que não admitiu ao ora
arguido o seu Recurso Extraordinário de Decisão proferida contra Jurisprudência
Fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça nos termos do disposto nos artigos 446º
e 448º do CPP vem, (com a cominação prevista no nº 5 do artigo 107º do CPP para
o que requer emissão e envio das guias) Mui Respeitosamente, nos termos do
disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82 de 15/11 e
legislação complementar interpor o competente
Recurso para o Tribunal Constitucional
1º O presente Recurso é interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do
artigo 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro, na redacção dada pela Lei nº
85/89 de 7 de Setembro, e pela Lei nº 13-A/89 de 26/02,
2º No âmbito do recurso previsto na referida alínea b), pretende-se ver
apreciada a legalidade/inconstitucionalidade resultante da interpretação das
normas conjugadas nos artigos 446º/448º e 405º nº 4 do CPP com a interpretação
com que foi aplicada na decisão recorrida…
“(…) O despacho questionado foi proferido pelo Vice-Presidente do Tribunal da
Relação de Évora em conhecimento de uma reclamação, que foi indeferida.
Tendo em conta que a decisão do Vice-Presidente do Tribunal da Relação que
confirme o despacho de retenção do recurso proferido pelo Juiz de 1ª instância é
definitiva, nos termos do nº 4 do art. 405º do CPP, não é passível de recurso
fundada em oposição com jurisprudência fixada nos termos do art. 446º do CPP, a
que aliás apenas se encontram sujeitas as decisões dos tribunais e não as dos
seus presidentes quando se pronunciam nos termos do citado art. 405º do CPP.
Assim sendo, não é o recurso admissível para este Supremo Tribunal”
Por violação dos princípios e das normas consagrados nos artigos 18º, 20º nº 1,
32º nº 1, 204º e 205º todos da CRP.
3º Desde logo a interpretação de que apenas são passíveis de recurso as decisões
dos tribunais e não as dos seus presidentes (ou vice-presidentes) quando se
pronunciam nos termos do disposto no artigo 405º do CPP. não tem suporte legal
nem consagração constitucional uma vez que, os despachos dos presidentes dos
Tribunais superiores sobre reclamações contra a não admissão ou retenção do
recurso são considerados igualmente “decisões dos tribunais” para efeitos de
recurso. (cfr. neste sentido os Acórdãos deste Digno (TC) Tribunal
Constitucional Nº 323/94 e Nº 506/94).
4º Sendo que, as Garantias de defesa do arguido previstas no nº 1 do artigo 32º
da CRP incluem e asseguram o Princípio do Direito ao Recurso por parte do
arguido, uma vez que, a plenitude do acesso a jurisdição e o Princípio da
Igualdade postulam um sistema que assegure a protecção dos interessados contra
os próprios actos jurisdicionais, (cfr. TC nº 287/90) incluindo o Direito de
Recurso.
5º Por outro lado, importa igualmente apreciar da ilegalidade e
inconstitucionalidade da interpretação resultante dos normas previstas nos
artigos 446º e 448º do CPP, conjugadas com o artigo 405º nº 4 ambos do CPP cuja
interpretação considero não admissível o Recurso Extraordinário do arguido
interposto nos termos do disposto no artigo 446º do CPP por força do disposto
no artigo 405º nº 4 daquele CPP.
6º Recorde-se que o ora arguido, esgotados que foram os meios comuns de
reclamação contra a retenção do seu recurso – interposto em sede de instrução na
1ª instância e em sede de reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação de
Évora na 2ª instância – veio a interpor, no prazo e modo próprios Recursos
Extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo Supremo
Tribunal de Justiça nos termos do disposto nos artigos 446º e 448 do CPP.
7º Porém, por despacho do Exmo. Vice-Presidente da Relação de Évora, não foi o
recurso – interposto nos termos e no âmbito do artigo 446º do CPP – recebido,
por se entender que só tem legitimidade para interpor recurso de decisão
proferida contra jurisprudência fixada pelo STJ, nos termos do artigo 446º do
CPP, o Ministério Público, e ainda por o disposto no artigo 437º do CPP não ter
aplicação atenta a natureza da decisão proferida (artigo 405º nº 4 do CPP).
8º Dessa decisão, reclamou o ora recorrente para o Digno STJ, sustentando, em
síntese, que, face à recente alteração legislativa do CPP (cfr. DR 1ª série nº
216, fls. 8336 de 9/11/07) contrariamente ao decidido pelo Exmo. Vice-Presidente
da Relação de Évora, (que certamente não actualizou aquele artigo do seu CPP)
para além do Ministério Público, também o arguido tem legitimidade e por isso
pode interpor o competente Recurso Extraordinário nos termos do disposto nos
artigos 446º nº 2 e 448º do CPP na sua redacção actual.
9º Porém, foi a presente Reclamação agora em crise julgada improcedente com o
fundamento acima exposto em 2º resultando, em consequência, na não
admissibilidade do Recurso Extraordinário do arguido nos termos do disposto no
artigo 446º do CPP por a norma do artigo 405º nº 4 daquele CPP não admitir
qualquer recurso dado o carácter definitivo da decisão aplicada ao abrigo
daquele normativo.
10º Arguida a nulidade por falta de pronúncia sobre a legitimidade (fundamento
primitivo da não admissão do recurso) do arguido para interpor Recurso
Extraordinário nos termos do artigo 446º do CPP e requerida a reforma do decisão
no Digno STJ., foi neste sede suscitada a questão da inconstitucionalidade
objecto do presente recurso para este superior Tribunal por violação dos artigos
20º e 32º nº 1 da CRP, (cfr. artigos 10º, 12º e 13º do requerimento do arguido).
11º Questão de inconstitucionalidade suscitada que não foi conhecida por aquele
Digno Supremo Tribunal de Justiça.
12º Nem igualmente conhecida foi a questão da legitimidade do arguido
(fundamento primitivo da não admissão do recurso) para interpor Recurso
Extraordinário nos termos do artigo 446º do CPP .
13º Legitimidade esta que foi assim manifestamente prejudicada por o Exmo.
Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora não ter actualizado o seu CPP e
bem assim por aquele Magistrado ter aplicado ao Recurso Extraordinário do
arguido interposto no âmbito do disposto no artigo 446º do CPP o regime previsto
no artigo 405º nº 4 do CPP e não seu regime próprio previsto naquele artigo 446º
e 448º do CPP.
14º Resultando, em consequência, na total perversão do sistema jurisdicional e
da garantia constitucionalmente consagrada do Direito ao Recurso (no caso o
Recurso Extraordinário nos termos do artigo 446º do CPP) prevista no artigo 32º
nº 1 da CRP e bem assim dos Princípios do Igualdade e da Proporcionalidade e do
Direito de Defesa previstos no artigo 20º da CRP.
15º Uma vez que, ao aplicarem ao Recurso Extraordinário do arguido interposto
nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 446º do CPP o regime geral
previsto no artigo 405º nº 4 para as reclamações se está a limitar o acesso à
Justiça e ao Direito por via da violação dos Direitos Liberdades e Garantias
constitucionalmente consagradas e por violação daqueles Princípios da Igualdade
e da Proporcionalidade e bem assim do Direito à Defesa e ao Recurso previstos
nos artigos 18º, 20º e 32º nº 1 da CRP.
16º Como bem ensinam Simas Santos e Leal Henriques in Recursos em Processo
Penal, 6ª edição, 2007, editora Rei dos Livros, a fls. 195 a 200, e bem assim
Paulo Pinto de Albuquerque no seu recente Comentário do Código de Processo
Penal, in Universidade Católica Editora, 2007, a fls. 1203 a 1207, entendeu
pacificamente o STJ que se tinham de esgotar os recursos ordinários, pois que só
se justifica o recurso extraordinário da decisão proferida contra jurisprudência
fixada pelo STJ, regulada nos artigos 446º e 448º do CPP, quando a decisão já
não é susceptível de recurso ordinário, como foi o caso nos presentes autos, não
sendo o recurso directo paro o STJ obrigatório uma vez que se assim fosse o
legislador teria o expressado como o fez para o nº 2 do artigo 432º, o que não
aconteceu com o artigo 446º, (cfr. Simas Santos e Leal Henriques in Recursos em
Processo Penal, 6ª edição, 2007. editora Rei dos Livros, a fls. 195 e 196).
17º Ora, não sendo recorrível pelos meios ordinários ou tendo-se esgotado estes
meios como o foi o caso em apreço nos autos, a decisão pode ainda ser recorrida
nas termos do artigo 446º, sendo o prazo de interposição o previsto no regime
dos Recursos Extraordinários, isto é 30 dias a contar do trânsito em julgado da
decisão recorrida (cfr. Simas Santos e Leal Henriques in Recursos em Processo
Penal, 6ª edição, 2007, editora Rei dos Livros, a fls. 198 a 200, e bem assim
Paulo Pinto de Albuquerque no seu recente Comentário do Código de Processo
Penal, in Universidade Católica Editora, 2007, a fls. 1203 a 1207).
18º Tais normas acima referidas, na interpretação que lhes foi dada, violam os
artigos 18º nº 1, 20º, 32º nº 1, 202º n.º 2, 204º e 205º da CRP., violando ainda
os Direitos Liberdades e Garantias do arguido e bem assim os Princípios da
Legalidade, da Igualdade e da Proporcionalidade constitucionalmente consagrados
naqueles normativos, tendo sido ainda violados, o Direito de Recurso e as
Garantias de Defesa do arguido, Princípios e Direitos que têm assento e Garantia
Constitucional.
19º A questão da inconstitucionalidade foi suscitada pelo ora Recorrente nos
autos a fls…. no seu próprio Recurso extraordinário interposto nos termos do
artigo 446º do CPP e no seu requerimento de Reforma da decisão junto do STJ
(cfr. artigos 10º, 12º e 13º do requerimento do arguido) e não antes por
manifesta situação imprevisível uma vez que o mesmo só se colocou naquela sede,
20º Uma vez que se encontram preenchidos os requisitos específicos da
admissibilidade do presente Recurso, deverá o mesmo ser recebido e admitido,
devendo
i) Ser apreciada e declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade da
norma extraída dos disposições conjugadas dos artigos 405º nº 4 e 446º e 448º
todas do CPP, na interpretação segundo a qual o despacho proferido com
fundamento no artigo 405º nº 4 do CPP – pelo Vice-Presidente da Relação de
Évora que não admite Recurso extraordinário interposto pelo arguido nos termos
do disposto nos artigos 446º e 448º do CPP – é definitivo, logo insusceptível de
qualquer recurso e não passível do Recurso Extraordinário fundado em oposição
com jurisprudência fixada nos termos do artigo 446º do CPP,
ii) Ser apreciada e declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade
das normas extraídas das disposições conjugadas dos artigos 405º nº 4 e 446º do
CPP, na interpretação segundo a qual apenas as decisões dos tribunais podem
justificar recurso fundado em aposição com jurisprudência fixada, nos termos do
artigo 446º do CPP - e não as dos seus presidentes - quando se pronunciem nos
termos do artigo 405º do CPP.».
Em 29 de Maio de 2008 foi proferido despacho que não admitiu este recurso, com a
seguinte fundamentação:
«O recorrente A., notificado pela secretaria para pagar a multa a que
se referem os arts. 107.º, n.º 5, do CPP e 145.º, n.º 6, do CPC, por ter
entregue o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional no 2.º dia útil após o termo do prazo sem a ter pago, veio agora
requerer, a fls. 81, que seja dada sem efeito a guia emitida ao abrigo do n.º 6
do art. 145.º do CPC para que se proceda à emissão e envio de nova guia, nos
termos do n.º 5 do referido artigo, conforme fora por ele inicialmente requerido
no cabeçalho do requerimento de interposição de recurso.
Vejamos pois.
Como se verifica do cabeçalho do requerimento de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional, o recorrente solicitou no segundo dia
útil subsequente ao termo do prazo, a emissão e envio de guias em vista ao
pagamento da multa prevista no n.º 5 do art. l45.º do CPC.
Sucede, porém, que nos casos especiais em que a lei autorize o
interessado a solicitar guias, como é o caso (cf. Salvador da Costa, Código das
Custas Judiciais, 2007, 9ª edição, p. 580), estas são imediatamente emitidas e
entregues, conforme dispõe o n.º 8 da Portaria n.º 42/2004, de 14.01; daí que
devia o recorrente ter levantado as respectivas guias para proceder ao seu
pagamento imediato; como não o fez, a secretaria emitiu guias mas então ao
abrigo do n.º 6 do art. 145.º.
Assim sendo, como o recorrente não procedeu ao pagamento da multa
liquidada pela secretaria, nos termos do citado art. 145.º, n.º 6, do CPC, pela
prática do acto de apresentação do requerimento de interposição de recurso para
o Tribunal Constitucional, no 2.º dia útil posterior ao termo do prazo, não se
admite, por intempestivo, o recurso interposto.».
O recorrente reclamou para o Tribunal Constitucional desta decisão, invocando o
seguinte:
«1.- Ora, resulta claro do texto expresso, em síntese, naquela portaria 42/2004
de 14/01 o seguinte;
CAPÍTULO II
Pagamentos por guia
6 – O pagamento de custas, preparos para despesas e multas é efectuado após a
emissão, em duplicado, de guias pelo tribunal, que contêm obrigatoriamente os
seguintes elementos:
a) Número sequencial;
b) Indicação do último dia do prazo para efectuar o pagamento;
c) Identificação do tribunal, do juízo ou da secção emitente e respectivos
códigos;
d) Natureza e número do processo;
e) Nome do obrigado ao pagamento;
f) Discriminação dos descritivos e respectivos montantes;
g) Indicação do total a pagar;
h) Data de emissão e assinatura.
7 – Logo que comece a correr o prazo para efectuar os pagamentos referidos no
número anterior, a secção emite guias em duplicado, enviando-as às partes, salvo
se existir responsabilidade solidária, caso em que serão entregues a quem
primeiro as solicitar.
8 – Nos casos especiais em que a lei autorize o interessado a solicitar guias
para qualquer pagamento, estas são imediatamente emitidas e entregues.
9 – O pagamento de guias pode ser efectuado:
a) Em qualquer balcão da Caixa Geral de Depósitos;
b) Em terminais de pagamento automático na secção central dos
tribunais emissores das guias;
c) Em caixas multibanco, desde o 1.º dia útil posterior ao da emissão
das guias e até às 24 horas do último dia do respectivo prazo.
(…)
21 – A faculdade de pagamento nos termos dos números anteriores cessa no dia
seguinte ao da disponibilização do pagamento através do sistema electrónico.
2.- Donde, com o devido respeito por diferente entendimento, em lado
algum daquela Portaria se expressa o dever da parte para esta “(...) se dirigir
ao tribunal para que as guias lhe sejam imediatamente emitidas e entregues”,
3.- Verificando-se até, ser prática comum nos diferentes Tribunais do
País, quer de primeira Instância quer nos Tribunais Superiores, a solicitação
expressa da parte, nomeadamente quando o correspondente mandatário ou defensor
se encontra em comarca diferente daquela em que corre os autos - como é o caso
em concreto - a secretaria enviar as respectivas guias via Fax.
4.- Ora, conforme se verifica expressamente naquele normativo legal, -
cfr. Artigo 6º da Portaria - existe um dever a observar pela secretaria no
sentido de que, qualquer Pagamento (de custas, preparos ou no caso de multa) é
efectuado após a emissão, em duplicado, de guias pelo tribunal.
5.- Sendo que, nos termos do artigo 7º daquela Portaria, logo que
comece a correr o prazo para efectuar os pagamentos referidos, a secção emite
guias em duplicado enviando-as às partes!
6.- E, nos termos do disposto no nº 8 daquele normativo legal, as
guias são imediatamente emitidas e entregues.
7.- Donde, resulta, em nosso modesto entendimento que, aquele diploma
legal impõe à Secretaria, antes de mais e antes de qualquer pagamento, o dever
de emitir em duplicado, as respectivas guias.
8.- Dever este que impõe igualmente à secretaria, logo que comece o
prazo para o respectivo pagamento a conduta de proceder imediatamente à sua
emissão em duplicado enviando-as às partes ou proceder à sua entrega.
9.- Donde, a parte interessada tem aqui apenas o ónus de requerer a
sua respectiva emissão e envio das guias,
10.- Não existindo, como assim o interpreta o Excelentíssimo
Conselheiro do STJ, o dever da parte de, previamente à emissão das respectivas
guias, se deslocar/dirigir ao Tribunal para que estas sejam, então emitidas, e
pessoalmente entregues, interpretação esta que, desde já se alega, nos termos
da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da LTC, como inconstitucional por violação
dos artigos 145º nº 5 do CPC, artigos 6º, 7º e 8º da Portaria nº 42/2004 de
14/01 e artigos 18º, 20º e 32º da Constituição.
11.- Na verdade, a correcta interpretação daquele diploma legal, impõe
o ónus e a necessária conduta à Secretaria de, independentemente de solicitação
da parte, logo que comece a correr o prazo de pagamento, e antes de qualquer
pagamento, emitir, em duplicado, as respectivas guias enviando-as à parte.
12- Até por que, nos termos do disposto no nº 6 daquela Portaria,
nenhum pagamento poderá ser efectuado SEM que, as correspondentes guias tenham
sido, previamente, emitidas, em duplicado, pela Secretaria.
13.- Ora, conforme consta expressamente logo no cabeçalho do recurso
interposto pelo ora recorrente a 29/04/08 (2º ao útil nos termos do artigo 145º
nº 5 do CPC ex vi 107º nº 5 do CPP) foi por este requerido, expressa e
tempestivamente, a correspondente emissão e envio das guias penais com a
cominação do disposto no nº 5 do artigo 107º do CPP.
14.- Porém, a ÚNICA guia penal emitido pela Secretaria (tal como se
pode observar nos autos!) foi a guia penal com o Nº 29000.04702940, mas com a
sanção agravada nos termos do Nº 6 do artigo 145º do CPC.
15.- Guia esta que apenas foi emitida pela Secretaria em 5/05/2008,
(cfr. fls. 72 - para pagamento da multa nos termos do nº 6 do art. 145º)
16.- Como bem se pode observar pela simples leitura dos autos, NUNCA,
a Secretaria emitiu qualquer guia para aquele pagamento imediato nos termos do
disposto no nº 5 do artigo 145º do CPC, pelo que,
17.- Contrariamente ao que alega e fundamenta o Exmo. Senhor
Conselheiro na sua Douta Decisão, NUNCA o ora recorrente poderia ter conseguido
levantar tais guias, uma vez que as mesmos NUNCA foram sequer emitidas pela
Secretaria, e, consequentemente, muito menos, proceder ao seu imediato
pagamento, como aliás, desde logo, no cabeçalho do seu recurso, o ora
recorrente o expressamente requereu.
18.- De facto, o acto praticado pelo ora recorrente foi realizado via
FAX pelas 23h22m daquele dia 29/04/2008 (2º dia útil), pelo que, encontrando-se
a Secretaria encerrada àquela hora, desde logo, requereu expressamente a
respectiva emissão e envio das guias no cabeçalho do seu recurso.
19.- Tendo ainda tomado a iniciativa de contactar telefonicamente com
os competentes serviços daquela Digna Secretaria, - com o Exmo. Sr. Oficial
Justiça Sr. B. - ao que foi por este informado que “Não tinha sequer reparado na
solicitação do ora recorrente naquele cabeçalho do seu recurso.
20.- E assim sendo, mais referiu que “iria fazer uma cota nos autos
dando conta dessa factualidade por forma a possibilitar o envio de nova guia
para pagamento nos termos do disposto naquele Nº 5 do artigo 145º do CPC”
21.- Porém, tal não aconteceu (como bem se pode observar compulsando
os autos), pelo que, as guias desde logo solicitadas pelo ora recorrente nos
termos daquele nº 5 do art. 145º do CPC NUNCA foram sequer emitidas
22.- Pelo que, impossível se tornou proceder ao seu levantamento e
consequente tempestivo pagamento!
23 – Impossibilidade esta que constitui irregularidade e que viola o
disposto naqueles n.º 6, 7 e 8 do portaria 42/2004 de 14.01 e bem assim o
disposto nos artigos 145.º, n.º 5 do CPC ex vi artigo 107.º do CRP,
constituindo ainda a nulidade prevista no n.º 1 do artigo 201.º do CPC ex vi
artigo 4.º do CPP uma vez influiu decisivamente na decisão da causa (Ac. RC
9/11/2004 Proc. 3061/04.dgs.Net e Ac. RL de 18/O6/2002 in Col Jur, 2002, 3.º
-100).
24 – Sendo certo ainda que pelos erros, irregularidades ou omissões da
Secretaria, não podem as partes ser prejudicadas!
25 – Maxime, quando está em causa o Direito ao Recurso do ora arguido
e recorrente, objecto de garantia consagrada constitucionalmente, (cfr. Ac. TC
nº 117/97 de 18/02/97, Ac. STJ de 25/06/88, BMJ, nº 395, p. 441, e Ac.. do RC de
29/11/89, in CJ, ano XIV, Tomo 5, p. 75, e Ac. RC 9/11/2004 Proc.
3061/04.dgs.Net e Ac. RL de 18/06/2002 in, Col Jur, 2002, 3.º -100).
26 – De facto, “(…) requerida a passagem de guias para o pagamento
imediato da multa, se a secretária as não passar, comete uma irregularidade
que, por poder influir na decisão da causa, produziu uma nulidade, com previsão
no artigo 201.º do CPC, “(cfr. por todos Ac. RC 9/11/2004 Proc. 3061/04.dgsi.
Net).
27 – Ac. do RC de 9/11/2004, no qual se sumaria;
“I – Resulta do disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 145.º do C.P.C que a
parte que praticou o acto num dos três primeiros dias úteis subsequentes ao
termo do prazo respectivo deve pagar espontaneamente a multa até ao termo do 1.º
dia útil posterior ao da prática do acto. Se o não fizer, será notificada
“oficiosamente” pela secretaria, sofrendo uma sanção agravada.
II – Requerida a passagem de guias para o pagamento imediato da multa,
se a secretaria as não passar, comete uma irregularidade, que, por poder influir
na decisão da causa, produziu uma nulidade, com previsão no artigo 201.º do
C.P.C.”
28 – Sendo certo que, o ora recorrente solicitou a prévia emissão das
correspondentes guias nos termos do n.º 5 do artigo 145.º do CPC, e, até,
29 – Tempestivamente, no prazo ainda de pagamento da única guia que
foi emitida pela secretaria – com a sanção agravada pelo n.º 6 do artigo 145.º
do CPC – veio o ora recorrente impugnar tal guia e a sua emissão a fls. 81 dos
autos, mais requerendo, novamente, a substituição daquela guia nos termos do n.º
6 por outra nos termos do n.º 5 do artigo 145.º do CPC.,
30 – Donde, não cabia ao ora recorrente pagar a sanção prevista no n.º
6 do artigo 145.º mas antes, e apenas, a prevista no seu n.º 5!
31 – Pelo que, não se pode verificar a cominação da intempestividade
do presente recurso uma vez que, não cabia ao ora recorrente pagar a sanção
previsto no n.º 6 do artigo 145.º mas apenas, a prevista no seu n.º 5
32 – E ainda que assim se não entendesse, – não concedendo, – sempre
deveria ao recorrente ser emitida nova guia nos termos do n.º 6 do artigo 145.º
uma vez que este impugnou (cfr. artigos 202.º e 203.º do CPC) a primitiva guia
emitida nos termos daquele n.º 6 e sobre essa impugnação deveria ter recaído
despacho – não de intempestividade do recurso como aconteceu, – mas antes, de
admissão ou não admissão de emissão de nova guia, pois,
33 – Só após a discussão sobre QUAL das guias – com a sanção logo
agravada ao obrigo do n.º 6 ou, pelo contrario, sem agravamento da sanção ao
abrigo do n.º 5 do artigo 145.º do CPC como inicialmente requerido pelo
recorrente, mas NUNCA emitida pela Secretaria – deveria ter sido emitida, se
poderia decidir sobre a admissibilidade ou não admissibilidade, por alegada
intempestividade do Recurso.
34 – Donde, em síntese, NÃO tendo NUNCA, sido pela Secretaria, sequer,
EMITIDA, a correspondente guia nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 145.º
do CPC como foi prévia e expressamente requerido pelo recorrente, (cfr. artigos
6.º, 7.º e 8.º da Portaria 42/2004 de 14/01),
35 – Impossível se tornou ao ora recorrente proceder ao seu
tempestivo pagamento por causa a que é totalmente alheio, uma vez que cumpriu o
seu ónus de requerer a respectiva emissão das competentes guias, mas a
Secretaria, por manifesta e evidente omissão, NUNCA procedeu à sua EMISSÃO como
impõem os n.º 6.º, 7.º e 8.º daquele citado normativo legal.
36 – Sendo certo que, nos termos do n.º 6 daquela Portaria n.º 42/2004
de 14/01, “O pagamento de custas, preparos para despesas e multas é efectuado
APÓS a EMISSÃO, em duplicado, de guias pelo tribunal,” (Maiúsculas nossas).
37 – Donde, não se pode verificar a cominação da intempestividade do
presente recurso uma vez que, não cabia ao ora recorrente pagar a cominação
prevista no n.º 6 do artigo 145.º mas antes, e apenas, a prevista no n.º 5
daquele normativo legal.
Termos em que, vem o ora requerente, Mui Respeitosamente, requerer a
V. Exa., se digne dar provimento à presente Reclamação dando sem efeito a guia
emitida com a sanção agravada nos termos do n.º 6 do artigo 145.º e bem assim
ordenar a emissão de nova guia penal nos termos do n.º 5 do artigo 145.º do CPC,
ex vi artigo 107.º do CPP conforme requerido inicialmente no próprio cabeçalho
do recurso interposto, por forma a lhe ser possível cumprir com o seu tempestivo
pagamento, com a consequente admissão do respectivo recurso nesse digno e
Superior Tribunal Constitucional, seguindo-se os seus demais termos.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido de ser indeferida a reclamação,
aduzindo a seguinte argumentação:
«A presente reclamação é, a nosso ver, improcedente.
Na verdade, recai sobre a parte que pretende beneficiar da “prorrogação” do
prazo peremptório, nos termos previstos no artigo 145.º, n.º 5, do CPC, o ónus
de diligenciar pronta e activamente pelo pagamento da multa que funciona como
“conditio” da admissibilidade do acto processual: não se impondo actualmente o
“imediato” pagamento de tal multa (cf. DL n.º 324/03), incumbe à parte o ónus de
proceder ao pagamento até ao termo do primeiro dia útil posterior, sem que
naturalmente possa aguardar “passivamente” pela mesma das guias respectivas pela
secção.
O não cumprimento de tal ónus legitima naturalmente a emissão de guias
pelo valor constante do n.º 6 do mesmo preceito legal, não sendo lícito à parte
obter uma adicional “ prorrogação” do prazo, através da reclamação deduzida
perante o juiz – conduzindo o reiterado incumprimento dos prazos fixados quer no
n.º 5, quer no n.º 6 daquele artigo 145.º à preclusão do acto processual em
causa.
Acresce que a questão de constitucionalidade suscitada sempre seria de
configurar como manifestamente infundada, não se vendo qualquer fundamento
constitucional para impor o terceiro grau de jurisdição quanto à decisão,
proferida em procedimento da reclamação, que confirma a rejeição do recurso
interposto – e sendo certo que, como se decidiu no Ac. 168/03 – nada na Lei
Fundamental impõe que seja utilizável o recurso extraordinário de fixação de
jurisprudência relativamente – não a acórdãos conflituantes – mas a um invocado
conflito entre um acórdão e um despacho do Presidente da Relação.»
O recorrente foi notificado do teor deste parecer e veio acrescentar:
“…Por outra lado, e tendo em consideração o novo fundamento suscitado pelo Digno
Magistrado do Ministério Público junto desse Digno e Superior Tribunal, importa
dizer que, desde logo a interpretação de que apenas são possíveis de recurso as
decisões dos tribunais e não as dos seus presidentes (ou vice-presidentes)
quando se pronunciam nos termos do disposto no artigo 405º do CPP. não tem
suporte legal nem consagração constitucional uma vez que, os despachos dos
presidentes dos Tribunais superiores sobre reclamações contra a não admissão ou
retenção do recurso são considerados igualmente “decisões dos tribunais” para
efeitos de recurso, (cfr. neste sentido os Acórdão deste Digno (TC) Tribunal
Constitucional Nº 323/94 e Nº 506/94)
Além disso, as garantias de defesa do arguido previstos no nº 1 do artigo 32º da
CRP incluem e asseguram o Princípio do Direito ao Recurso por parte do arguido e
a aplicação do tratamento que lhe for mais favorável, uma vez que, a plenitude
do acesso à jurisdição e o Princípio da Igualdade postulam um sistema que
assegure a protecção dos interessados contra os próprios actos jurisdicionais,
(cfr. Ac. TC nº 287/90) incluindo o Direito de Recurso!
De facto, não se cura aqui de se configurar um alegado “terceiro grau de
jurisdição” como erradamente pretende o Digno Magistrado do MP. mas antes, da
configuração e aplicação de diferentes regimes processuais - por um lado o
regime geral ou meio ordinário previsto no artigo 405º do CPP e, por outro o
regime especial ou meio extraordinário previsto no disposto nos artigos 446º e
448º do CPP.
Pelo que, importa por isso apreciar da ilegalidade e inconstitucionalidade da
interpretação resultante dos normas previstas nos artigo 446º e 448º do CPP,
conjugadas com o artigo 405º nº 4 ambos do CPP, cuja interpretação, considera
não admissível o recurso extraordinário do arguido interposto nos termos do
disposto no artigo 446º do CPP por força do disposto no artigo 405º nº 4 daquele
CPP
Ora, o que aqui está em causa é o facto de, esgotados que foram os meios comuns
de reclamação contra a retenção do seu recurso, foi interposto, no prazo e modo
próprios, recurso extraordinário de decisão proferida contra Jurisprudência
fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça nos termos dos artigos 446º e 448º do
CPP.
E não, como se tem pretendido camuflar, mais um recurso ordinário de uma
reclamação nos termos do disposto no artigo 405º do CPP.
Além disso, por despacho do Exmo. Vice-Presidente da Relação de Évora, não foi o
recurso extraordinário – interposto nos termos e no âmbito do artigo 446º do CPP
- recebido, por se entender que só o Ministério Público, tem legitimidade para
interpor recurso de decisão proferido contra Jurisprudência fixada pelo STJ.,
nos termos do artigo 446º do CPP, - (e ainda por o disposto no artigo 437º do
CPP não ter aplicação atenta a natureza da decisão proferida (artigo 405º nº 4
do CPP).
Ora, dessa decisão, reclamou o ora recorrente para o Digno STJ, sustentando, em
síntese, que, face à recente alteração legislativa do CPP (cfr. DR 1ª série nº
216, fls. 8336 de 9/11/07) contrariamente ao decidido pelo Exmo. Vice-Presidente
da Relação de Évora, (que certamente não actualizou aquele artigo do seu CPP)
para além do Ministério Público, também o arguido tem legitimidade e por isso
pode interpor o competente recurso extraordinário nos termos do disposto nos
artigos 446º nº 2 e 448º do CPP na sua redacção actual.
Porém, não foi sequer conhecida a questão da legitimidade do arguido (fundamento
principal da não admissão do recurso) para interpor recurso extraordinário nos
termos do artigo 446º do CPP.
Legitimidade esta que foi assim manifestamente prejudicada por aquele Digno
Magistrado ter aplicado ao recurso extraordinário do arguido interposto no
âmbito do disposto no artigo 446º do CPP o regime ordinário previsto no artigo
405º nº 4 do CPP e não o seu regime próprio previsto naquele artigo 446º e 448º
do CPP.
Resultando, em consequência, na total perversão do sistema jurisdicional e da
garantia constitucionalmente consagrada do Direito ao Recurso (no caso o recurso
extraordinário nos termos do artigo 446º do CPP) previsto no artigo 32º nº 1 da
CRP e bem assim dos Princípios da Igualdade e da Proporcionalidade e do Direito
de Defesa previstos no artigo 20º da CRP.
Uma vez que, ao aplicarem ao recurso extraordinário interposto nos termos e para
os efeitos do disposto no artigo 446º do CPP o regime geral e ordinário previsto
no artigo 405º nº 4 para as reclamações, se está a limitar o acesso à Justiça e
ao Direito por via da violação dos Direitos Liberdades e Garantias
constitucionalmente consagrados e por violação daqueles Princípios da Igualdade
e da Proporcionalidade e bem assim do Direito à Defesa e ao Recurso previstos
nos artigos 18º, 20º e 32º nº 1 da CRP.
Ora, como bem ensinam Simas Santos e Leal Henriques in Recursos em Processo
Penal, 6ª edição, 2007, editora Rei dos Livros, a fls. 195 a 200, e bem assim
Paulo Pinto de Albuquerque no seu recente Comentário do Código de Processo
Penal, in Universidade Católica Editora, 2007, a fls. 1203 a 1207, entendeu
pacificamente o STJ que se tinham de esgotar os recursos ordinários, pois que só
se justifica o recurso extraordinário da decisão proferida contra jurisprudência
fixada pelo STJ, regulado nos artigos 446º e 448º do CPP, quando a decisão já
não é susceptível de recurso ordinário, como foi o caso nos presentes autos, não
sendo o recurso directo para o STJ obrigatório uma vez que se assim fosse o
legislador teria o expressado como o fez para o nº 2 do artigo 432º, o que não
aconteceu com o artigo 446º (cfr. Simas Santos e Leal Henriques in Recursos em
Processo Penal, 6ª edição, 2007, editora Rei das Livros, a fls. 195 e 196).
Ora, não sendo recorrível pelos meios ordinários (cfr. artigo 405º CPP) ou
tendo-se esgotado estes meios - como o foi o caso em apreço nos autos, - a
decisão pode ainda ser recorrida nos termos do artigo 446º, sendo o prazo de
interposição o previsto no regime dos Recursos Extraordinários, isto é 30 dias a
contar do trânsito em julgado da decisão recorrida (cfr. Simas Santos e Leal
Henriques in Recursos em Processo Penal, 6ª edição, 2007, editora Rei dos
Livros, a fls. 195 a 200, e bem assim Paulo Pinto de Albuquerque no seu recente
Comentário do Código de Processo Penal, in Universidade Católica Editora, 2007,
a fls. 1203 a 1207).
Tais normas acima referidas, na interpretação que lhes foi dada, violam os
artigos 18º n.º 1, 20º, 32º nº 1, 202º n.º 2, 204º e 205º da CRP, violando ainda
os Direitos Liberdades e Garantias do arguido e bem assim os Princípios da
Legalidade, da Igualdade e da Proporcionalidade constitucionalmente consagrados
naqueles normativos, tendo sido ainda violados, o Direito de Recurso e as
Garantias de Defesa do arguido, Princípios e Direitos que têm assento e garantia
constitucional…”
*
Fundamentação
1. Da extemporaneidade da interposição de recurso de constitucionalidade
A presente reclamação versa a matéria da prática de actos processuais pelo
arguido e pelo respectivo defensor fora do prazo e independentemente de justo
impedimento, ao abrigo do disposto no n.º 5, do artigo 145.º, do Código do
Processo Civil (CPC), na redacção introduzida pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, de
27 de Dezembro.
Nos termos da referida disposição legal, “independentemente de justo
impedimento, pode o acto ser praticado dentro dos três dias subsequentes ao
termo do prazo, ficando a sua validade dependente do pagamento, até ao termo do
1.º dia útil posterior ao da prática do acto, de uma multa de montante igual a
um quarto da taxa de justiça inicial por cada dia de atraso, não podendo a multa
exceder 3 UC”.
Esta norma tem plena aplicação no âmbito do processo penal, uma vez que o n.º 5,
do artigo 107.º, do CPP, não deixou de acautelar que “independentemente do justo
impedimento, pode o acto ser praticado, no prazo, nos termos e com as mesmas
consequências que em processo civil, com as necessárias adaptações”.
No caso em análise, encontra-se assente que o reclamante interpôs recurso de
constitucionalidade – relativamente à decisão do Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça que confirmou a rejeição do recurso extraordinário de
revisão interposto ao abrigo do disposto no artigo 446.º, do CPP – mediante o
envio através de telecópia do competente requerimento no 2.º dia útil
subsequente ao termo do prazo previsto para esse efeito.
Encontra-se igualmente assente que o reclamante requereu, logo naquele acto, a
emissão e envio das guias para efeito de pagamento da multa a que alude o n.º 5,
do artigo 145.º, do CPC.
Constitui também factualidade assente que as referidas guias não foram sequer
emitidas pela secretaria até ao termo do 1.º dia útil posterior ao do envio do
aludido requerimento de interposição de recurso, assim como que o reclamante não
se apresentou no Supremo Tribunal de Justiça a levantá-las, não tendo, assim,
procedido ao respectivo pagamento naquele prazo.
Finalmente, resulta ainda dos autos que o reclamante se recusou a pagar as guias
que posteriormente lhe foram enviadas pela secretaria para efeito de pagamento
da multa prevista no n.º 6, do artigo 145.º, do referido diploma legal,
argumentando para tanto que lhe continua a assistir o direito de pagar
tão-somente a multa prevista no n.º 5 do mesmo normativo.
Nestas circunstâncias, em especial por causa da falta de pagamento das únicas
guias enviadas ao reclamante, o Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça considerou que o reclamante perdeu definitivamente o direito de interpor
o aludido recurso de constitucionalidade e rejeitou-o com fundamento em
extemporaneidade.
O cerne da presente reclamação reside, assim, no essencial, em saber se a falta
de pagamento da multa prevista no n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, é imputável ao
reclamante.
Em especial, interessa saber se o reclamante “devia – como se deixou escrito na
decisão reclamada – ter levantado as respectivas guias para proceder ao seu
pagamento imediato” para assim poder beneficiar da faculdade da prática do acto
fora do prazo conforme previsto na referida disposição legal.
A possibilidade da prática de actos processuais pelas partes fora do prazo e
independentemente de justo impedimento foi introduzida, pela primeira vez, na
lei processual civil portuguesa pelo Decreto-Lei n.º 323/70, de 11 de Julho,
quando o n.º 5, do artigo 145.º, do CPC passou a prever que “independentemente
de justo impedimento, pode o acto ser praticado no primeiro dia útil seguinte ao
termo do prazo, ficando, porém, a sua validade dependente do pagamento imediato
de uma multa”.
No preâmbulo do referido Decreto-Lei n.º 323/70, o legislador não deixou de dar
conta de que “pela modificação do artigo 145.º, torna-se possível a prática de
actos no primeiro dia útil seguinte ao termo do respectivo prazo, sem
necessidade da prova – que nem sempre é fácil – do justo impedimento”.
A expressão legal “pagamento imediato” não suscitava então dúvidas de que a
multa em questão tinha de ser paga no próprio momento da prática do acto, isto
é, simultaneamente com a prática do acto, a secretaria passaria as pertinentes
guias a pedido do interessado com vista ao respectivo pagamento imediato junto
da Caixa Geral de Depósitos.
A falta de pagamento imediato da multa não dava então lugar a qualquer outro
procedimento por parte da secretaria e tinha logo como consequência a invalidade
do acto praticado fora do prazo.
O Decreto-Lei n.º 242/85, de 9 de Julho, alterou a redacção do n.º 5, do artigo
145.º, do CPC, ampliando a possibilidade dos actos poderem ser também praticados
“no segundo e terceiro dias úteis seguintes ao termo do prazo”, ficando a
validade desses actos igualmente “dependente do pagamento imediato de uma
multa”.
Esta última alteração legislativa saldou-se ainda pelo aditamento do número 6,
ao artigo 145.º, que passou a impor à secretaria a notificação oficiosa do
interessado para pagar uma multa de valor mais elevado em caso de falta de
pagamento imediato da multa prevista no n.º 5.
Até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, a
redacção dos n.os 5 e 6, do artigo 145.º, do CPC, sofreu alterações –
nomeadamente as introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 92/88, de 17 de Março, pelo
DECRETO-LEI N.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, e pelo Decreto-Lei n.º 180/96, de
25 de Setembro – que se limitaram aos quantitativos das multas já previstas.
Mais recentemente, o referido Decreto-Lei n.º 324/2003 alterou novamente a
redacção do n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, em termos que ainda hoje se mantêm,
substituindo a expressão “pagamento imediato” pela expressão “pagamento até ao
termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto”.
A lei processual civil deixou de exigir o pagamento imediato da multa que
condiciona a validade dos actos praticados fora do prazo independentemente de
justo impedimento.
Esta conclusão vale igualmente no âmbito do processo penal mercê do disposto no
artigo 107.º, n.º 5, do CPP.
Mas a que se deve esta última alteração legislativa não despicienda (sendo que
não se cuidará aqui das alterações legislativas aprovadas e ainda não entradas
em vigor decorrentes do Decreto-Lei n.º 34/2008, de 26 de Fevereiro).
Como se verá de seguida, a mesma é essencialmente explicada e ditada pela
utilização de novas tecnologias na prática dos actos processuais em geral.
Com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 28/92, de 27 de Fevereiro, as partes
passaram a poder utilizar a telecópia para a prática de quaisquer actos
processuais no âmbito do processo civil e, mesmo com algumas restrições, no
âmbito do processo penal.
O referido diploma legal visava – conforme assinalava o respectivo preâmbulo –
“desburocratizar e modernizar os serviços judiciais e facilitar o contacto
destes com os respectivos utentes”, com isso se “evitando os custos e demoras
resultantes de deslocações às secretarias judiciais”.
Na sequência desta inovação legislativa, o artigo 150.º, do CPC conheceu
alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 que se traduziram na
seguinte redacção:
«1. Os articulados, requerimentos, respostas e as peças referentes a quaisquer
actos que devam ser praticados por escrito pelas partes no processo podem ser
entregues na secretaria judicial ou a esta remetidos pelo correio, sob registo,
acompanhados dos documentos e duplicados necessários, valendo, neste caso, como
data do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal
2. (...)
3. Podem ainda as partes praticar actos processuais através de telecópia ou por
meios telemáticos, nos termos previstos em diploma regulamentar.
4. (...)»
Todavia, o mesmo Decreto-Lei n.º 329-A/95 não deixou de restringir o alcance da
utilização da telecópia na medida em que aditou ao artigo 143.º, do CPC, o n.º
3 com a seguinte redacção:
“Os actos das partes que impliquem a recepção pelas secretarias judiciais de
quaisquer articulados, requerimentos ou documentos devem ser praticados durante
a hora de expediente dos serviços”.
Posteriormente, o Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto, conferiu nova
redacção ao artigo 150.º, do CPC, cujo n.º 2 passou a dispor:
“Os articulados, requerimentos, respostas e as peças referentes a quaisquer
actos que devam ser praticados por escrito pelas partes no processo podem ser:
a) Entregues na secretaria judicial, sendo exigida a prova da identidade dos
apresentantes não conhecidos em tribunal e, a solicitação destes, passado recibo
de entrega;
b) Remetidos pelo correio, sob registo, valendo neste último caso como data da
prática do acto processual a da efectivação do respectivo registo postal;
c) Enviados através de telecópia ou por correio electrónico, sendo neste último
caso necessária a aposição da assinatura digital do seu signatário, valendo como
data da prática do acto processual a da sua expedição.”
Simultaneamente, o Decreto-Lei n.º 183/2000 viria a aditar ao referido artigo
143.º, do CPC, o n.º 4, com a seguinte redacção:
“As partes podem praticar os actos processuais através de telecópia ou por
correio electrónico, em qualquer dia e independentemente da hora de abertura e
encerramento dos tribunais”.
O ulterior e já aludido Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro, não
deixaria de aprofundar a utilização das novas tecnologias e até mesmo de as
incentivar.
Pode ler-se inclusivamente no respectivo preâmbulo que “clarifica-se o regime do
envio e do suporte das peças processuais, previsto no art. 150.º do Código de
Processo Civil, cuja aplicação e utilidade práticas têm vindo a suscitar
inúmeras dúvidas, designadamente no que respeita à utilização do suporte digital
e do correio electrónico, instituindo-se um normativo susceptível de acarretar
vantagens e benefícios para todos os operadores judiciários” e que “numa clara e
efectiva aposta nas novas tecnologias, fomenta-se, mediante a consagração de uma
redução da taxa de justiça devida e sem que sejam criados quaisquer factores de
exclusão, a utilização do correio electrónico”.
Para assegurar esse desiderato, o artigo 150.º, do CPC, passou a apresentar a
seguinte redacção:
“1 — Os actos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes
são apresentados a juízo por uma das seguintes formas:
a) Entrega na secretaria judicial, valendo como data da prática do acto
processual a da respectiva entrega;
b) Remessa pelo correio, sob registo, valendo como data da prática do acto
processual a da efectivação do respectivo registo postal;
c) Envio através de telecópia, valendo como data da prática do acto
processual a da expedição;
d) Envio através de correio electrónico, com aposição de assinatura
electrónica avançada, valendo como data da prática do acto processual a da
expedição, devidamente certificada;
e) Envio através de outro meio de transmissão electrónica de dados.
2 — Os termos a que deve obedecer o envio através dos meios previstos nas
alíneas d) e e) do número anterior são definidos por portaria do Ministro da
Justiça.
3 — A parte que proceda à apresentação de acto processual através dos meios
previstos nas alíneas d) e e) do n.o 1 remete a tribunal, no prazo de cinco
dias, todos os documentos que devam acompanhar a peça processual.
4 — Tratando-se da apresentação de petição inicial, o prazo referido no
número anterior conta-se a partir da data da respectiva distribuição.”
Por seu turno, o artigo 15.º, do Código das Custas Judiciais, aprovado pelo
Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, passou a ter a seguinte redacção:
“1 — A taxa de justiça inicial e subsequente devida pelas partes cujos
mandatários optem pelo envio de todos os articulados, alegações,
contra-alegações e requerimentos de prova através de correio electrónico ou de
outro meio de transmissão electrónica de dados é reduzida em um décimo.
2 — A taxa de justiça da parte que opte pelo envio nos termos do número
anterior e a taxa de justiça do processo são reduzidas em conformidade com o
disposto no mesmo.
3 — A opção prevista no n.º 1 deve ser expressamente efectuada no primeiro
acto processual praticado por escrito pela parte, o qual deve ser apresentado a
juízo através de um desses meios, produzindo efeitos até ao termo do processo.
4 — Quando ocorra, em momento posterior à opção pelo envio nos termos do
n.º 1, a apresentação em juízo através de qualquer outro meio legalmente
admissível dos actos processuais em causa, fica sujeita à aplicação das
cominações previstas para a omissão do pagamento das taxas de justiça inicial
ou subsequente, consoante os casos.
5 — Sem prejuízo do disposto no número anterior, o montante da multa devida
não pode, em caso algum, ser inferior ao quádruplo do montante da redução da
taxa de justiça de que a parte tenha beneficiado nos termos do n.º 1.
6 — O disposto no presente artigo não se aplica às execuções e aos
processos de natureza penal.”
A promoção da utilização das novas tecnologias foi ainda mais intensificada com
a alteração do CPC levada a cabo pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto
de 2007.
O legislador assume expressamente no preâmbulo do referido diploma legal que
“estabelece ainda o Programa do XVII Governo Constitucional, enquanto objectivo
fundamental, a inovação tecnológica da justiça, para a qual é essencial a
adopção decisiva dos novos meios tecnológicos. No âmbito da promoção desta
«utilização intensiva das novas tecnologias nos serviços de justiça, como forma
de assegurar serviços mais rápidos e eficazes», define -se como objectivo «a
progressiva desmaterialização dos processos judiciais» e o desenvolvimento «do
portal da justiça na Internet, permitindo -se o acesso ao processo judicial
digital». Assim, as alterações acolhidas nesta matéria visam permitir a prática
de actos processuais através de meios electrónicos, dispensando -se a sua
reprodução em papel e promovendo a celeridade e eficácia dos processos.”.
Em conformidade com esse objectivo fundamental, o artigo 150.º, do CPC,
passou a apresentar a seguinte redacção:
“1 — Os actos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes
são apresentados a juízo preferencialmente por transmissão electrónica de dados,
nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 138.º -A, valendo
como data da prática do acto processual a da respectiva expedição.
2 — Os actos processuais referidos no número anterior também podem ser
apresentados a juízo por uma das seguintes formas:
a) Entrega na secretaria judicial, valendo como data da prática do acto
processual a da respectiva entrega;
b) Remessa pelo correio, sob registo, valendo como data da prática do acto
processual a da efectivação do respectivo registo postal;
c) Envio através de telecópia, valendo como data da prática do acto
processual a da expedição.
3 — A parte que pratique o acto processual nos termos do n.º 1 deve
apresentar por transmissão electrónica de dados a peça processual e os
documentos que a devam acompanhar, ficando dispensada de remeter os respectivos
originais.
4 — A apresentação por transmissão electrónica de dados dos documentos
previstos no número anterior não tem lugar, designadamente, quando o seu formato
ou a dimensão dos ficheiros a enviar não o permitir,
nos termos definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 138.º -A.
5 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . .
6 — . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
. . . . . . . . . . . . . . . . .
7 — Os documentos apresentados nos termos previstos no n.º 3 têm a força
probatória dos originais, nos termos definidos para as certidões.
8 — O disposto no n.º 3 não prejudica o dever de exibição das peças
processuais em suporte de papel dos originais dos documentos juntos pelas partes
por meio de transmissão electrónica de dados, sempre que o juiz o determine, nos
termos da lei de processo.
9 — As peças processuais e os documentos apresentados pelas partes em
suporte de papel são digitalizados pela secretaria judicial, nos termos
definidos na portaria prevista no n.º 1 do artigo 138.º -A.”
Após este longo caminho trilhado pelo legislador desde a aprovação do
Decreto-Lei n.º 28/92, é inquestionável que a actual lei processual civil
privilegia a utilização das novas tecnologias na prática dos actos processuais e
que as deslocações às secretarias judiciais, nomeadamente para efeito exclusivo
de entrega de peças processuais, são cada vez mais residuais.
Foi precisamente por causa da utilização das novas tecnologias na administração
da justiça que o n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, apresenta a actual redacção.
Se a lei passou a permitir que as partes praticassem os actos processuais
através de telecópia ou por correio electrónico, em qualquer dia e
independentemente do horário de funcionamento das secretarias judiciais, a
exigência do pagamento imediato da multa que condicionava a validade do acto
praticado fora do prazo independentemente de justo impedimento teve igualmente
de ser actualizada.
E por isso, como já referiu acima, a expressão “pagamento imediato” constante do
n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, foi substituída pela expressão “pagamento até ao
termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto”.
Aqui chegados, importa saber como é que se processa o pagamento da multa em
questão, sem nunca perder de vista que o mesmo depende apenas da iniciativa e da
liberdade de decisão do interessado que pretenda aproveitar a prática do acto
fora do prazo.
A norma constante do n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, refere a exigência de que a
multa deve ser paga até ao termo do 1.º dia útil posterior ao da prática do acto
mas não esclarece como se processa esse pagamento.
O n.º 2, do artigo 124.º, do CCJ, na redacção introduzida pela Lei 53-A/2006, de
29 de Dezembro, dispõe que “as formas de pagamento da taxa de justiça são
fixadas por portaria do Ministro da Justiça”.
A portaria em questão corresponde à Portaria 42/2004, de 14 de Janeiro, cujo
Capítulo I do Anexo prevê a autoliquidação dos pagamentos antecipados previstos
no CCJ – nomeadamente da taxa de justiça inicial, da taxa de justiça
subsequente, da taxa de justiça para a promoção de execuções, da taxa de
justiça criminal e das custas prováveis –, os quais são efectuados directamente
na Caixa Geral de Depósitos ou através do sistema electrónico.
Sucede que a multa em questão não constitui qualquer subespécie de taxa de
justiça susceptível de autoliquidação.
O n.º 5, do artigo 124.º, do CCJ, esclarece que “todos os outros pagamentos não
abrangidos pelos números anteriores são efectuados através de guia a emitir pelo
tribunal”.
Assim sendo, no caso em apreço, a multa tinha de ser paga através de guia a
emitir pela secretaria do tribunal reclamado.
Resta saber como se processam a solicitação, a emissão, a entrega e o pagamento
das guias.
Os pagamentos por guia encontram-se também regulados no Capítulo II do Anexo da
referida Portaria 42/2004, cujos n.os 6 a 10 apresentam a seguinte redacção:
“6 — O pagamento de custas, preparos para despesas e multas é efectuado
após a emissão, em duplicado, de guias pelo tribunal, que contêm
obrigatoriamente os seguintes elementos:
a) Número sequencial;
b) Indicação do último dia do prazo para efectuar o pagamento;
c) Identificação do tribunal, do juízo ou da secção emitente e respectivos
códigos;
d) Natureza e número do processo;
e) Nome do obrigado ao pagamento;
f) Discriminação dos descritivos e respectivos montantes;
g) Indicação do total a pagar;
h) Data de emissão e assinatura.
7 — Logo que comece a correr o prazo para efectuar os pagamentos referidos
no número anterior, a secção emite guias em duplicado, enviando-as às partes,
salvo se existir responsabilidade solidária, caso em que serão entregues a quem
primeiro as solicitar.
8 — Nos casos especiais em que a lei autorize o interessado a solicitar
guias para qualquer pagamento, estas são imediatamente emitidas e entregues.
9 — O pagamento de guias pode ser efectuado:
a) Em qualquer balcão da Caixa Geral de Depósitos;
b) Em terminais de pagamento automático na secção central dos tribunais
emissores das guias;
c) Em caixas multibanco, desde o 1.º dia útil posterior ao da emissão das
guias e até às 24 horas do último dia do respectivo prazo.
10 — Os talões ou recibos emitidos através do sistema electrónico ou
fornecidos pela Caixa Geral de Depósitos constituem prova do pagamento da
quantia constante da guia.”
Antes de avançarmos na interpretação e aplicação das normas acabadas de
transcrever, importa recuperar as contingências do caso concreto, isto é, que o
reclamante dos autos apresentou requerimento de interposição de recurso às 23
horas e 20 minutos do dia 29 de Abril de 2008 (terça-feira) e que a validade da
prática desse acto depende, nos termos do n.º 5, do artigo 145.º, do CPC, do
pagamento da multa até ao termo do dia imediatamente seguinte.
Tendo presentes estes factos, as guias tinham necessariamente de ser emitidas,
para assegurar qualquer utilidade, logo no dia 30 de Abril de 2008, na medida em
que o termo do prazo ocorria precisamente às 24 horas desse mesmo dia 30 de
Abril de 2008.
Mas o caso em análise suscita outras limitações temporais, desta feita
decorrentes dos próprios meios previstos para o pagamento das guias.
No caso concreto, as guias não podiam ser pagas nas caixas multibanco na medida
em que este meio de pagamento apenas estaria disponível a partir de dia 2 de
Maio de 2008 (n.º 9, al. c).
Restava, assim, ao reclamante proceder ao pagamento em questão em qualquer
balcão da Caixa Geral de Depósitos ou no terminal de pagamento automático
existente na secção central do tribunal emissor das guias, com a relevante
limitação de que esses pagamentos não podem ocorrer para além das 15 horas ou
das 16 horas, respectivamente, mercê dos horários de atendimento ao público (n.º
9, alíneas a) e b).
Importa agora ver como se desencadeia todo o procedimento conducente ao
pagamento da multa em questão.
Ao invés do que sucede com o pagamento de multas aplicadas pelo juiz,
designadamente por litigância de má-fé, cujo pagamento é obrigatório e até pode
ser coercivamente exigido, desencadeando, assim, a emissão oficiosa de guias, a
emissão das guias para pagamento da multa prevista no n.º 5, do artigo 145.º, do
CPC, está dependente de solicitação do interessado que pretenda aproveitar a
validade do acto praticado fora do prazo independentemente de justo impedimento.
Para este efeito, o n.º 8 do Anexo da Portaria 42/2004 prevê expressamente que
“nos casos especiais em que a lei autorize o interessado a solicitar guias para
qualquer pagamento, estas são imediatamente emitidas e entregues”.
A solicitação das guias não está sujeita a nenhuma forma especial, podendo,
assim, ser realizada por qualquer dos meios previstos no artigo 150.º, do CPC,
que se mostrem ao alcance do interessado e que lhe permitam assegurar o
pagamento atempado da multa.
Assim sendo, não é exigível que o interessado tenha de se deslocar ao tribunal
para aqui solicitar a emissão de guias, assim como nada obsta a que as guias em
questão possam ser solicitadas pelo interessado através de telecópia.
Interessa agora saber como é que as guias devem ser entregues ao interessado que
pretenda, como o ora reclamante, pagar a multa no próprio dia em que aquelas são
emitidas.
Se o interessado se deslocar à secretaria do tribunal e aqui solicitar a emissão
das guias, as mesmas devem ser-lhe entregues em mão.
Todavia, a “entrega das guias” a que alude o n.º 8, do Anexo da Portaria 42/2004
não pode ser interpretado restritivamente no sentido de estar apenas em causa a
entrega presencial e em mão.
A referida expressão legal também comporta no seu espírito que a entrega em
questão se possa processar através de telecópia.
Assim, se o interessado tiver solicitado a emissão e o envio das guias através
de telecópia – como sucedeu no caso concreto -, a secretaria deve emitir as
guias e enviá-las imediatamente ao interessado igualmente através de telecópia,
uma vez que este é o único meio que lhe permite proceder ao pagamento atempado
das mesmas.
Esta conclusão funda-se em várias razões que se passam a enunciar de seguida.
Em primeiro lugar, a entrega das guias em questão, uma vez solicitada pelo
interessado, deve ser qualificada como um acto processual urgente.
A secretaria não pode deixar de ter por urgente a prática de um acto que, se não
for assegurado até às 15/16 horas do próprio dia, determina o aumento
substancial da multa a cargo do interessado.
Em conformidade com a urgência do acto, a secretaria deve realizar as
diligências necessárias para assegurar a sua realização atempada em termos de
não comprometer a respectiva finalidade.
A postura da secretaria que se caracteriza simplesmente por aguardar que o
interessado, que solicitou, através de telecópia, a emissão e o envio das guias
para pagamento da multa, compareça em tribunal para proceder ao respectivo
levantamento não contribui em nada para a realização atempada do pagamento da
multa em questão.
Em segundo lugar, importa ter presente que as notificações oficiosas da
secretaria não se esgotam naquelas que se mostram expressamente previstas na lei
ou que foram ordenadas por despacho do juiz.
Para além disso, nos termos do n.º 2, do artigo 229.º, do CPC, cumpre igualmente
à secretaria notificar oficiosamente as partes quando, por virtude da disposição
legal, possam exercer algum direito processual que não dependa de prazo a fixar
pelo juiz nem de prévia citação.
A notificação das guias para pagamento da multa prevista no n.º 5, do artigo
145.º do CPC, cuja emissão e envio foram previamente solicitados pelos
interessados, inscreve-se nesta obrigação de notificação oficiosa da secretaria.
Ao interessado incumbirá apenas, num primeiro momento, solicitar a emissão e
envio das guias e, posteriormente, proceder ao respectivo pagamento até ao termo
do primeiro dia útil posterior ao da prática do acto.
Mal se compreenderia que a secretaria apenas estivesse obrigada a notificar as
guias para pagamento da multa no caso previsto no n.º 6, do artigo 145.º do CPC
– tanto mais que esta notificação será levada a cabo independentemente da
vontade das partes, muito mais tarde, por meios mais morosos (nomeadamente por
carta registada) e se destina a assegurar o pagamento de uma multa de montante
mais elevado – e nada mais estivesse obrigada a fazer para além da emissão das
guias na situação prevista no n.º 5 do referido artigo, nomeadamente quando o
interessado requereu o seu envio.
Em terceiro lugar, a intensificação da utilização das novas tecnologias não
ocorre apenas pelo lado das partes e dos respectivos mandatários, deixando de
fora os tribunais e as respectivas secretarias.
Verificados determinados pressupostos, a secretaria está obrigada a notificar os
mandatários das partes por correio electrónico (artigo 254.º, n.º 2, do CPC,
desde a redacção do Decreto-Lei n.º 324/2003).
Acresce que, em sede de processo penal, as notificações ao advogado ou ao
defensor nomeado, quando outra forma não resultar da lei, são feitas por vários
meios, incluindo por telecópia (artigo 113.º, n.º 10, do CPP).
Finalmente, a exigência da entrega das guias em mão, a ser tomada como a regra
aplicável a todos os casos, determinaria, na prática, que um interessado com
domicílio, por exemplo, nos Açores, não pudesse recolher as guias junto da
secretaria do Supremo Tribunal de Justiça em tempo de poder proceder ao seu
pagamento.
Por tudo isto, a “entrega das guias” a que alude o n.º 8, do Anexo da Portaria
42/2004 não pode ser interpretado restritivamente no sentido de estar apenas em
causa a entrega presencial e em mão, sob pena de com isso, por um lado, se
contrariar gravemente o actual espírito do sistema processual português em
matéria de prática dos actos processuais e, por outro lado, se estabelecerem
exigências excessivas e desproporcionadas aos interessados que podem
comprometer seriamente o exercício de uma faculdade prevista na lei.
Assim, importa concluir que o recurso de constitucionalidade em questão não
podia ter sido rejeitado com fundamento em extemporaneidade fundada nas razões
de facto e de direito que constam da decisão reclamada.
Porém, não se pode deixar de ter presente que nas reclamações de decisão de não
admissão de recurso de constitucionalidade, os poderes de cognição do Tribunal
Constitucional não estão limitados à apreciação da correcção do fundamento da
decisão reclamada, devendo estender a sua apreciação a outras eventuais causas
de inadmissibilidade do recurso, uma vez que, por força do disposto no artigo
77.º, n.º 4, da LTC, a decisão sobre a reclamação não pode ser impugnada e, se
revogar o despacho de indeferimento, faz caso julgado quanto à admissibilidade
do recurso.
Assim sendo, a atenção do Tribunal Constitucional passará a incidir sobre o
cumprimento dos requisitos específicos de admissibilidade do recurso de
constitucionalidade.
2. Da falta de suscitação adequada da questão de constitucionalidade
O recorrente interpôs recurso ao abrigo do disposto na alínea b), do n.º 1, do
artigo 70.º, da LTC, devendo o pedido de apreciação de ilegalidade das
interpretações normativas questionadas pelo recorrente ser considerado um lapso,
uma vez que a alínea invocada se reporta a recursos de constitucionalidade e o
recorrente não se referiu a qualquer violação de lei com valor reforçado.
Tendo o reclamante interposto um recurso ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do
artigo 70.º, da LTC, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa
dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada
«durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela
conhecer» (n.º 2, do artigo 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito
aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de
inconstitucionais pelo recorrente.
Aquele primeiro requisito (suscitação da questão de inconstitucionalidade
perante o tribunal recorrido, antes de proferida a decisão impugnada) só se
considera dispensável nas situações especiais em que, por força de uma norma
legal específica, o poder jurisdicional se não esgota com a prolação da decisão
recorrida, ou naquelas situações, de todo excepcionais ou anómalas, em que o
recorrente não dispôs de oportunidade processual para suscitar a questão de
constitucionalidade antes de proferida a decisão recorrida ou em que, tendo
essa oportunidade, não lhe era exigível que suscitasse então a questão de
constitucionalidade.
No caso em apreço, resulta do requerimento de interposição de recurso de
constitucionalidade que o recorrente entende que deve:
«i) Ser apreciada e declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade da norma
extraída dos disposições conjugadas dos artigos 405º nº 4 e 446º e 448º todas do
CPP, na interpretação segundo a qual o despacho proferido com fundamento no
artigo 405º nº 4 do CPP – pelo Vice-Presidente da Relação de Évora que não
admite Recurso extraordinário interposto pelo arguido nos termos do disposto nos
artigos 446º e 448º do CPP – é definitivo, logo insusceptível de qualquer
recurso e não passível do Recurso Extraordinário fundado em oposição com
jurisprudência fixada nos termos do artigo 446º do CPP,
ii) Ser apreciada e declarada a ilegalidade e inconstitucionalidade das normas
extraídas das disposições conjugadas dos artigos 405º nº 4 e 446º do CPP, na
interpretação segundo a qual apenas as decisões dos tribunais podem justificar
recurso fundado em aposição com jurisprudência fixada, nos termos da artigo 446º
do CPP - e não as dos seus presidentes - quando se pronunciem nos termos do
artigo 405º do CPP.».
O recorrente suscitou estas questões de constitucionalidade perante o tribunal
recorrido, pela primeira vez, após já ter sido proferida a decisão recorrida,
mais concretamente quando arguiu a nulidade da mesma por omissão de pronúncia
mediante requerimento apresentado em 27 de Março de 2008.
Constitui jurisprudência consolidada deste Tribunal Constitucional que o
apontado requisito só se pode considerar preenchido se a questão de
constitucionalidade tiver sido suscitada antes de o tribunal recorrido ter
proferido a decisão final, pois com a prolação desta decisão se esgota, em
princípio, o seu poder jurisdicional. Por isso, tem sido uniformemente entendido
que, proferida a decisão final, a arguição da sua nulidade ou o pedido da sua
aclaração, rectificação ou reforma não constituem já meio adequado de suscitar
a questão de constitucionalidade, pois a eventual aplicação de uma norma
inconstitucional não constitui erro material, não é causa de nulidade da decisão
judicial, não a torna obscura ou ambígua, nem envolve «lapso manifesto» do juiz
quer na determinação da norma aplicável, quer na qualificação jurídica dos
factos, nem desconsideração de elementos constantes do processo que implicassem
necessariamente, só por si, decisão diversa da proferida.
O recorrente dispôs de oportunidade para suscitar a questão de
constitucionalidade que agora pretende ver apreciada na reclamação apresentada
em 29 de Novembro de 2007 contra a decisão proferida em 13 de Novembro de 2007
pelo Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Évora, na medida em que um dos
fundamentos então avançados para a rejeição do recurso fundado na oposição com
jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça consistiu precisamente na
circunstância da decisão ter sido proferida ao abrigo do artigo 405.º, n.º 4, do
CPP.
Neste cenário, não se revela, pois, desrazoável exigir-se nesse momento ao
recorrente a suscitação perante o tribunal recorrido da questão de
inconstitucionalidade que pretende ver agora apreciada.
Não tendo sido observado o cumprimento deste requisito, o recurso de
constitucionalidade nunca poderia ser admitido, pelo que deve ser indeferida a
reclamação apresentada, ficando prejudicada a apreciação da questão da manifesta
improcedência do recurso interposto, suscitada pelo Ministério Público junto
deste Tribunal.
*
Decisão
Pelo exposto, indefere-se a reclamação apresentada por A. do despacho proferido
em 29 de Maio de 2008 que não admitiu o recurso por ele interposto para o
Tribunal Constitucional, embora por fundamento diverso do invocado no despacho
reclamado.
*
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta,
ponderando os critérios enunciados no artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-lei n.º
303/98, de 7 de Outubro (artigo 7.º, do mesmo diploma).
Lisboa, 11 de Novembro de 2008
João Cura Mariano
Mário José de Araújo Torres
Rui Manuel Moura Ramos