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Processo nº 975/2007
3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
I
Relatório
1. A. vem, a fls. 270 a 272, reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto
no n.º 3 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do Tribunal
Constitucional), da decisão sumária de fls. 250 e segs., que decidiu, entre o
mais, “(n)ão julgar inconstitucional a norma do artigo 188.º, n.° 3, do Código
de Processo Penal, na redacção anterior à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto,
quando interpretada no sentido de que o juiz de instrução pode destruir o
material coligido através de escutas telefónicas, quando considerado não
relevante, sem que antes o arguido dele tenha conhecimento e possa pronunciar-se
sobre o eventual interesse para a sua defesa.” E, “(c)onsequentemente, negar
provimento ao recurso e confirmar o acórdão recorrido, no que à questão de
constitucionalidade respeita.” Pode ler-se no ponto 6. da fundamentação da
decisão sumária ora reclamada:
Quanto, por último, à norma contida no artigo 188.º, n.º 3, do Código de
Processo Penal, quando interpretado no sentido de permitir que o juiz de
instrução criminal ordene a destruição parcial das gravações efectuadas, sem que
previamente o arguido as tenha podido ouvir e controlar, a questão, assim
colocada, já foi objecto de decisão por parte do Tribunal Constitucional. Com
efeito, no recente Acórdão nº 70/2008, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt, o Tribunal decidiu “não julgar inconstitucional a
norma do artigo 188.º, n.° 3, do Código de Processo Penal, na redacção anterior
à Lei n.º 48/2007, de 29 de Agosto, quando interpretada no sentido de que o juiz
de instrução pode destruir o material coligido através de escutas telefónicas,
quando considerado não relevante, sem que antes o arguido dele tenha
conhecimento e possa pronunciar-se sobre o eventual interesse para a sua defesa,
e, consequentemente, negar provimento aos recursos.” Aí se conclui que “tendo em
conta o sentido jurídico-constitucional do princípio acusatório e a
possibilidade de colisão entre o interesse processual em manter intactas as
provas coligidas através de intercepção e gravação de comunicações e o
correspondente risco de devassa da reserva de intimidade da vida privada, cabe
na liberdade de conformação legislativa adoptar um critério mais ou menos
restritivo no que se refere ao momento em que, no decurso do processo penal,
deverá efectuar-se a destruição dos elementos de prova considerados
irrelevantes.”
É para esta jurisprudência que agora se remete, conforme permitido pelo artigo
78.º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, concluindo-se no sentido da
não inconstitucionalidade da norma do artigo 188.º, n.º 3, do Código de Processo
Penal, na interpretação impugnada pelo recorrente, e, por conseguinte, no
sentido da improcedência do presente recurso, nesta parte.
2. O reclamante diz o seguinte na sua reclamação:
I
A presente Reclamação abrange tão somente a invocada inconstitucionalidade da
norma do artigo 188° n° 3 do Cod. Proc. Penal, na redacção anterior à Lei n°
48/2001 de 29 de Agosto, quando interpretada no sentido de que o juiz de
instrução pode destruir o material coligido através das escutas telefónicas,
quando considerado não relevante, sem que antes o arguido tenha conhecimento e
possa pronunciar-se sobre o eventual interesse para a sua Defesa:
II
A decisão sumária basta-se na mais recente jurisprudência do Plenário do
Tribunal Constitucional – Acórdão nº 70/2008, disponível em
www.tnbunalconstitucional.pt “Aí se conclui que tendo em conta o sentido
jurídico-constitucional do principio acusatório e a possibilidade de colisão
entre o interesse processual em manter intactas as provas coligidas através de
interceptação e gravação de comunicações e o correspondente risco de devassa da
reserva de intimidade da vida privada, cabe na liberdade de conformação
legislativa adoptar um critério mais ou menos restritivo no que se refere ao
momento em que, no decurso do processo penal, deverá efectuar-se a destruição
dos elementos de prova considerados irrelevantes” (Fim de citação)
III
Efectivamente tal douto Acórdão, por 8 votos entre cinco inverteu o sentido que
até aí o Colendo Tribunal Constitucional havia decidido em vários outros doutos
Acórdãos, nomeadamente os recursos 660/2006; 450/2007 e 451/07 e 4/2006.
IV
Ou seja, a questão é ainda hoje controversa, achando o recorrente que até merece
que seja levada, de novo, ao Colendo Plenário, nos termos do artigo 79-A e 78-A
n° 4 da Citada Lei.
V
Com efeito, os intervenientes processuais nos tribunais ordinários necessitam
saber se tal interpretação do artigo 188 n° 3 do C.P.P. antes da revisão é ou
não inconstitucional.
VI
De qualquer forma, não deve é o presente recurso findar com uma decisão sumária
por remessa para o último Acórdão do T.C., especialmente quando este se opõe
frontalmente a 5 outros Acórdãos anteriores.
VII
Como é evidente o recorrente perfilha a orientação dos acórdãos citados que
declaram a inconstitucionalidade da norma em questão.
Sustenta-se no que por si foi alegado no seu requerimento de interposição de
recurso e nas declarações de voto dos Colendos Conselheiros vencidos no acórdão
em que agora se fundamenta a Decisão Sumária, agora alvo de Reclamação.
O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional respondeu
pela seguinte forma à reclamação:
1°
A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2°
Na verdade, tendo o Plenário do Tribunal Constitucional acabado de se
pronunciar, em certo sentido, sobre a questão de constitucionalidade suscitada –
e não tendo havido qualquer alteração na composição do Tribunal – seria
verdadeiro acto inútil, face à inexistência de argumentos adicionais ou
supervenientes, voltar a colocar à respectiva consideração a questão que acabou
de ser resolvida.
Cumpre decidir.
II
Fundamentos
3. Adiante-se desde já que a presente reclamação não pode obter provimento.
Como este Tribunal salientou no Acórdão n.º 349/2006, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt,
(…) é a própria LTC, no seu artigo 78.º-A, n.º 1, que equipara “questão simples”
a questão já anteriormente decidida pelo Tribunal Constitucional, sem
condicionar essa equiparação à inexistência de polémica ou de divisão de
opiniões entre os juízes do Tribunal Constitucional. A existência de anterior
decisão do Tribunal Constitucional sobre a específica questão de
constitucionalidade suscitada – reforçadamente quando, como no caso ocorre, essa
decisão é do Plenário do Tribunal – permite a consideração da questão como
simples, mesmo que tivesse sido tangencial a maioria dos juízes que fez
vencimento (…)
Saliente-se que o Acórdão n.º 70/2008, cuja jurisprudência se reitera na decisão
sumária ora reclamada, foi tirado em Plenário do Tribunal, por determinação do
seu Presidente, nos termos do artigo 79.º-A da Lei do Tribunal Constitucional,
para evitar divergências jurisprudenciais.
Sublinhe-se ainda que a jurisprudência firmada no Acórdão n.º 70/2008 foi
posteriormente reiterada no Acórdão n.º 128/2008 (da 2.ª Secção), igualmente
disponível em www.tribunalconstitucional.pt, votado por unanimidade, incluindo
os dois juízes que haviam aposto a sua declaração de voto no Acórdão n.º
70/2008.
A jurisprudência firmada no Acórdão n.º 70/2008 é, pois, inteiramente aplicável
ao caso dos autos, sem prejuízo de a ora relatora haver votado vencido no
Acórdão n.º 70/2008, por, tal como aqueles dois juízes, entender dever acatar a
orientação firmada em Plenário, cuja intervenção foi, como se disse, determinada
ao abrigo do artigo 79.º-A da Lei do Tribunal Constitucional.
Tanto basta para concluir pelo indeferimento da presente reclamação.
III
Decisão
Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e
confirmar a decisão sumária de negar provimento ao recurso e confirmar o acórdão
recorrido, no que à questão de constitucionalidade respeita, bem como condenar o
reclamante em custas, com 20 (vinte) unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 2 de Abril de 2008
Maria Lúcia Amaral
Carlos Fernandes Cadilha
Gil Galvão