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Processo n.º 764/07
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A Associação dos Bombeiros Voluntários da …, melhor identificada
nos autos, reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A,
n.º 3, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua redacção actual (LTC), da
decisão sumária proferida nos autos pela qual se julgou não tomar conhecimento
do objecto do recurso de constitucionalidade.
2 – A decisão reclamada tem o seguinte teor:
«1 – Associação dos Bombeiros Voluntários de …, com os demais sinais
dos autos, recorre para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no
artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua
redacção actual (LTC), fazendo constar do requerimento de interposição de
recurso as seguintes indicações:
“(...)
O Recorrente veio requerer a aclaração do Acórdão proferido pelo Tribunal da
Relação de Évora.
No entanto, os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora
acordaram, em conferência, confirmar o Acórdão proferido, considerando que não
havia nada a esclarecer, acrescentar ou corrigir.
Contudo, e salvo melhor opinião, e no que respeita à questão da indemnização
arbitrada em substituição da reintegração, foi considerado pelo Tribunal que a
indemnização em substituição da reintegração deve ser fixada entre 15 e 45 dias
de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de
antiguidade, atendendo-se para o efeito ao valor da retribuição e ao grau da
ilicitude decorrente do disposto no art. 429º do Código do Trabalho.
Salvo o devido respeito, não foi este o critério utilizado para fundamentar e
considerar que a fixação da indemnização no valor correspondente a 30 dias é
adequada aos presentes autos.
Mas, antes, o critério seguido na lei anterior!
Sendo, ainda, de salientar que se refere no Acórdão que a ilicitude do
despedimento deriva de razões processuais, não se tendo, sequer, averiguado, na
presente acção, da justa causa do despedimento.
Ora, resulta do art. 429º do Código do Trabalho que esta indemnização em
substituição da reintegração deixou de ser certa, sendo seu montante fixado pelo
Tribunal, atendendo à moldura fixada na lei.
Nessa determinação, o juiz atenderá:
- Ao valor da retribuição base e diuturnidades auferidas pelo trabalhador à data
do despedimento;
- À antiguidade do trabalhador;
- Ao tipo de ilicitude do despedimento, tendo em conta as situações previstas
nas três alíneas do art. 429º do mesmo diploma.
Assim sendo, será mais grave um despedimento fundado em motivos políticos ou
étnicos do que por falta de procedimento disciplinar!
Sendo que, no caso dos autos, o procedimento disciplinar existe!
Aliás, a considerada ilicitude do despedimento deriva, apenas, de razões
processuais, ou seja, violação do exercício do contraditório!
Tanto mais que o despedimento não foi considerado ilícito, mas antes inválido,
porquanto foi considerado que faltaram algumas formalidades legais.
Além disso, e volta-se a insistir neste ponto, o objecto do processo disciplinar
não foi conhecido nem pelo Tribunal a quo nem por este Tribunal da Relação.
Pelo que, e nesse sentido, onde está a conjugação do valor da retribuição com o
tipo de ilicitude do despedimento, nos termos do disposto no art. 439º e 429º do
CT?
Salvo o devido respeito, não foi efectuado!
Considera, antes, o Tribunal que a “fixação da indemnização no valor
correspondente a 30 dias de retribuição, é adequada ao caso, não existindo
particulares razões para atenuá-la ou agravá-la em relação ao critério mais
objectivo que resultava da lei anterior (vide art. 13º, nº 3 do regime aprovado
pelo DL nº 64-A/89, de 27/2).”
Ora, o que se verifica é que o Tribunal não utiliza o critério estabelecido no
art. 439º do CT, mas um critério puramente objectivo, fixado na lei anterior,
critério esse que já não se encontra em vigor na nossa ordem jurídica.
Nesse sentido, qual o motivo e/ou critério para a indemnização em substituição
da reintegração não ser fixada num valor correspondente a 15 dias?
Se a Lei estabelece um mínimo e um máximo, qual a razão para, no caso dos autos,
não ser de aplicar o mínimo?
Quando o que se verifica é que o Tribunal, depois de fundamentar com base no
Código do Trabalho, aplica a sua decisão com base num preceito objectivo e
revogado!
Por fim, e não olvidando que o despedimento é considerado ilícito por o processo
disciplinar ser inválido, ou seja, por meras questões formais, não tendo sido
conhecido o objecto do mesmo, terá de ser considerado que o mesmo não tem um
cariz tão gravoso.
Pelo que, e depois de afirmar que o objecto do processo disciplinar não foi
conhecido nem pela 1ª Instância nem pela 2ª Instância, não pode fazer qualquer
referência ao conteúdo da nota de culpa, para justificar o valor da
indemnização.
Ou se conhece da matéria factual do processo disciplinar ou não se conhece!
Se não conheceu, não pode o Tribunal aproveitar factos para justificar a fixação
da indemnização!
Quando o despedimento foi julgado ilícito por invalidade do processo
disciplinar.
Assim sendo, e tendo por base o disposto no art. 439º do C.T., bem como a
invalidade do processo disciplinar por questões processuais, a fixação da
indemnização no valor correspondente a 30 dias de retribuição é, de facto e de
direito, desproporcional à gravidade “cometida” pela entidade patronal, sendo
que, obviamente, deveria ter sido levado em linha de conta a natureza jurídica
da Recorrente.
Nesse sentido, e ao manter-se a decisão de fixar a indemnização em substituição
da reintegração em 30 dias, o Acórdão viola o princípio da proporcionalidade,
previsto no art. 266º da CRP.
Sendo, assim, inconstitucional a interpretação que o Tribunal faz do artigo 439º
do Código do Trabalho, quando, para fixar o valor da indemnização, não tem em
linha de conta os critérios estabelecidos neste preceito, nomeadamente o grau de
ilicitude/invalidade do processo disciplinar, seguindo, antes, e unicamente, o
critério, objectivo, fixado em lei anterior, já revogada.
Pelo que, e de acordo com o supra exposto, o Acórdão viola, ao definir a fixação
da indemnização em 30 dias, com base no critério estabelecido na lei anterior –
DL 64-4/89 –, olvidando o critério subjectivo constante do art. 439º do CT,
viola o princípio da proporcionalidade.
A questão da inconstitucionalidade desta norma foi levantada pelo ora Recorrente
no seu pedido de aclaração”.
2 – Integrando-se o caso sub judicio no âmbito da previsão normativa do artigo
78.º-A, n.º 1, da LTC, passa a decidir-se com base nos seguintes fundamentos.
3 – Constitui pressuposto do recurso ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b),
da LTC, que o tribunal a quo haja aplicado, como ratio decidendi, uma norma cuja
inconstitucionalidade tenha sido suscitada durante o processo.
Para poder conhecer-se deste tipo de recurso, torna-se igualmente necessário que
a inconstitucionalidade da norma sindicanda tenha sido suscitada durante o
processo, devendo este requisito ser entendido, segundo a jurisprudência
constante deste Tribunal (veja-se, por exemplo, o Acórdão n.º 352/94, in Diário
da República II Série, de 6 de Setembro de 1994), “não num sentido meramente
formal (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da
instância)”, mas “num sentido funcional”, de tal modo “que essa invocação haverá
de ter sido feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da
questão”, “antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que
(a mesma questão de constitucionalidade) respeita”, por ser este o sentido que é
exigido pelo facto de a intervenção do Tribunal Constitucional se efectuar em
via de recurso, para reapreciação ou reexame, portanto, de uma questão que o
tribunal recorrido pudesse e devesse ter apreciado (ver ainda, por exemplo, o
Acórdão n.º 560/94, Diário da República II Série, de 10 de Janeiro de 1995, e
ainda o Acórdão n.º 155/95, in Diário da República II Série, de 20 de Junho de
1995).
Entende-se, por isso, que não constituem já momentos processualmente idóneos
aqueles que são abrangidos pelos incidentes de arguição de nulidades, pedidos de
aclaração e de reforma, dado terem por escopo não a obtenção de decisão com
aplicação da norma, mas a sua anulação, esclarecimento ou modificação, com base
em questão nova sobre a qual o tribunal não se poderia ter pronunciado (cf.,
entre outros, os acórdãos n.º 496/99, publicado no Diário da República II Série,
de 17 de Julho de 1996, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 33º vol., p. 663;
n.º 374/00, publicado no Diário da República II Série, de 13 de Julho de 2000,
BMJ 499º, p. 77, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47º vol., p.713; n.º
674/99, publicado no Diário da República II Série, de 25 de Fevereiro de 2000,
BMJ 492º, p. 62, e Acórdãos do Tribunal Constitucional, 45º vol., p. 559; n.º
155/00, publicado no Diário da República II Série, de 9 de Outubro de 2000, e
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 46º vol., p. 821, e n.º 364/00, inédito).
Por outro lado, o recurso para este Tribunal apenas pode traduzir-se numa
questão de (in)constitucionalidade da(s) norma(s) de que a decisão recorrida
haja feito efectiva aplicação ou que tenha constituído o fundamento normativo do
aí decidido.
Trata-se, neste caso, de um pressuposto específico do recurso de
constitucionalidade cuja exigência resulta da natureza instrumental (e
incidental) do recurso de constitucionalidade, tal como o mesmo se encontra
recortado no nosso sistema constitucional, de controlo difuso da
constitucionalidade de normas jurídicas pelos vários tribunais, bem como da
natureza da própria função jurisdicional constitucional (cf. Cardoso da Costa,
«A jurisdição constitucional em Portugal», in Estudos em homenagem ao Professor
Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra, I,
1984, pp. 210 e ss., e, entre outros, os Acórdãos n.º 352/94, publicado no
Diário da República II Série, de 6 de Setembro de 1994, n.º 560/94, publicado no
mesmo jornal oficial, de 10 de Janeiro de 1995 e, ainda na mesma linha de
pensamento, o Acórdão n.º 155/95, publicado no Diário da República II Série, de
20 de Junho de 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o
Acórdão n.º 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de
2000).
Por fim, importa ainda reter que este Tribunal, por mor das suas particulares
competências cognitivas e dos poderes que lhe estão consignados ex
constitutionis, não pode assumir-se como uma instância de amparo, não sendo,
assim, admissíveis os recursos que, ao jeito da Verfassungsbeschwerde alemã ou
do recurso de amparo espanhol, sindiquem, sub species constitutionis, a concreta
aplicação do direito efectuada pelos demais tribunais, em termos de se assacar
ao acto judicial de “aplicação” a violação (directa) dos parâmetros
jurídico-constitucionais. Ou seja, não cabe a este Tribunal apurar e sindicar a
bondade e o mérito do julgamento efectuado in concreto pelo tribunal a quo. A
intervenção do Tribunal Constitucional não incide sobre a correcção jurídica do
concreto julgamento, mas apenas sobre a conformidade constitucional das normas
aplicadas pela decisão recorrida.
Vale isto por dizer, então, que as questões relativas à definição do
direito infra-constitucional aplicável ao caso concreto estão qua tale
subtraídas à esfera de competência deste Tribunal.
Projectando estes critérios no caso sub judicio, constata-se que o
presente recurso não satisfaz os pressupostos processuais determinantes da sua
admissibilidade.
Desde logo, em primeiro lugar, o Tribunal da Relação não interpretou
o artigo 439. º do Código do Trabalho, na dimensão normativa controvertida pela
recorrente, qual seja a de “para fixar o valor da indemnização, não ter em linha
de conta os critérios estabelecidos neste preceito, nomeadamente o grau de
ilicitude/invalidade do processo disciplinar, seguindo, antes, e unicamente, o
critério, objectivo, fixado em lei anterior, já revogada”.
Como o próprio Tribunal da Relação dá conta no acórdão que indeferiu
a arguição de nulidade, “não pode, pois, afirmar-se que o acórdão não explicitou
as razões que levaram esta Relação a confirmar a decisão da 1.ª instância quanto
à determinação do critério de cálculo para a indemnização em causa. A referência
à lei antiga (art. 13.º, n.º 3 do regime aprovado pelo DL n.º 64-A/89 de 27/02)
não passou disso mesmo e não foi em função do critério nesta definido que a
indemnização foi fixada”.
E, de facto, perscrutando o sentido da decisão recorrida, maxime no
que tange com o critério normativo mobilizado pelo Tribunal, resulta claro que a
fixação do valor da indemnização não se suportou no regime vertido no
Decreto-Lei 64-A/89, outrossim na aplicação conjugada do disposto nos artigos
439.º e 429.º do Código do Trabalho. A chamada à colação do disposto no artigo
13.º, n.º 3, do citado Decreto-Lei, constitui apenas um mero obiter dictum, não
reflectido na concreta determinação do quantum indemnizatório.
A isto acresce, em todo o caso, que a recorrente não suscitou em
tempo útil qualquer questão de constitucionalidade referida ao regime do artigo
439.º do Código do Trabalho, na interpretação acolhida na 1.ª instância e
sufragada, depois, pela Relação, sendo que, não existindo alteração substantiva
dos critérios dosimétricos valorados pelas instâncias, a recorrente podia ter
controvertido a inconstitucionalidade da dimensão normativa subjacente à
determinação do valor da indemnização no recurso que interpôs para o Tribunal da
Relação.
4 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide não tomar
conhecimento do objecto do recurso.»
3 – Por seu turno, a reclamação deduzida tem o seguinte teor:
«(…)
I – Questão Prévia
Nos termos do disposto no art. 3° da Lei nº 32/2007, de 13 de Agosto, as
associações humanitárias de bombeiros adquirem personalidade jurídica e são
reconhecidas como pessoas colectivas de utilidade pública administrativa com a
sua constituição.
Assim sendo, e nos termos do disposto no art. 4° do DL 303/98, de 7/10 (Regime
das Custas do Tribunal Constitucional) e do disposto no art. 2° do Código das
Custas, a Recorrente é isenta de custas.
II – Reclamação
Entende o Tribunal Constitucional que não pode conhecer do recurso por o mesmo
não satisfazer os pressupostos processuais determinantes da sua admissibilidade.
Contudo, tal orientação não pode ser aplicada ao caso em epígrafe.
Ora,
E, em primeiro lugar, considerou que a Recorrente não suscitou em tempo útil
qualquer questão de constitucionalidade referida ao regime do artigo 439º do
Código do Trabalho.
Todavia, e salvo o devido respeito, discorda-se com esta posição, porquanto no
recurso de apelação interposto pela Recorrente é alegado que a sentença viola,
no seu todo, o princípio da proporcionalidade (art. 266° da CRP), tanto no que
concerne ao julgar o processo disciplinar ilícito, como quanto à fixação da
indemnização.
Aliás, violação que foi, novamente, invocada, no recurso interposto da sentença
da 1ª Instância que atribuiu à Recorrida uma indemnização por danos morais.
Tendo, no entanto, levantado e concretizado, directamente, no seu requerimento
de pedido de aclaração do Acórdão da Relação de Évora, a violação do princípio
da proporcionalidade quanto à questão da indemnização arbitrada em substituição
da reintegração.
Sendo que a violação ao princípio da proporcionalidade tinha sido levantada nas
suas alegações de recurso, nomeadamente:
- Nas folhas 7 e 12 a 14 das suas alegações de recurso, apresentadas em
7/12/2005;
- Nas folhas 3 e 5 das suas alegações de recurso, apresentadas em 17/05/2006.
Nessa medida, a questão da inconstitucionalidade foi suscitada em tempo útil
pela Recorrente, devendo este pressuposto ser considerado como preenchido, nos
termos legais.
Em segundo lugar,
E no que concerne à questão da indemnização arbitrada em substituição da
reintegração, considera o Tribunal Constitucional que “(...) resulta claro que a
fixação do valor da indemnização não se suportou no regime vertido no
Decreto-Lei 64-A189, outrossim na aplicação conjugada do disposto nos artigos
439º e 429º do Código do Trabalho. A chamada à colação do disposto no artigo
13º, nº 3, do citado Decreto-Lei, constitui apenas um mero obter dictum, não
reflectido na concreta determinação do quantum indemnizatório.”
Salvo o devido respeito, não se pode concordar, nem aceitar esta posição e
decisão.
Ora, resulta do art. 429° do Código do Trabalho que esta indemnização em
substituição da reintegração deixou de ser certa, sendo seu montante fixado pelo
Tribunal, atendendo à moldura fixada na lei.
Nessa determinação, o juiz atenderá:
- Ao valor da retribuição base e diuturnidades auferidas pelo trabalhador à data
do despedimento;
- À antiguidade do trabalhador;
- Ao tipo de ilicitude do despedimento, tendo em conta as situações previstas
nas três alíneas do art. 429° do mesmo diploma.
Assim sendo, será mais grave um despedimento fundado em motivos políticos ou
étnicos do que por falta de procedimento disciplinar!
Sendo que, no caso dos autos, o procedimento disciplinar existe!
Aliás, a considerada ilicitude do despedimento deriva, apenas, de razões
processuais, ou seja, violação do exercício do contraditório!
Tanto mais que o despedimento não foi considerado ilícito, mas antes inválido,
porquanto foi considerado que faltaram algumas formalidades legais.
Mais, o objecto do processo disciplinar não foi conhecido nem pelo Tribunal de
1ª Instância nem pelo Tribunal da Relação de Évora.
Pelo que, e nesse sentido, onde está a conjugação do valor da retribuição com o
tipo de ilicitude do despedimento, nos termos do disposto no art. 439° e 429° do
CT?
Salvo o devido respeito, não foi efectuado!
Ora, o que se verifica é que o Tribunal não utiliza o critério estabelecido no
art. 439° do CT, mas um critério puramente objectivo, fixado na lei anterior,
critério esse que já não se encontra em vigor na nossa ordem jurídica.
Nesse sentido, qual o motivo e/ou critério para a indemnização em substituição
da reintegração não ser fixada num valor correspondente a 15 dias?
Se a Lei estabelece um mínimo e um máximo, qual a razão para, no caso dos autos,
não ser de aplicar o mínimo?
Quando o que se verifica é que o Tribunal, depois de fundamentar com base no
Código do Trabalho, aplica a sua decisão com base num preceito objectivo e
revogado!
Por fim, e não olvidando que o despedimento é considerado ilícito por o processo
disciplinar ser inválido, ou seja, por meras questões formais, não tendo sido
conhecido o objecto do mesmo, terá de ser considerado que o mesmo não tem um
cariz tão gravoso.
Pelo que, e depois de afirmar que o objecto do processo disciplinar não foi
conhecido nem pela 1ª Instância nem pela 2ª Instância, não pode fazer qualquer
referência ao conteúdo da nota de culpa, para justificar o valor da
indemnização.
Ou se conhece da matéria factual do processo disciplinar ou não se conhece!
Se não conheceu, não pode o Tribunal aproveitar factos para justificar a fixação
da indemnização!
Quando o despedimento foi julgado ilícito por invalidade do processo
disciplinar.
Assim sendo, e tendo por base o disposto no art. 439° do C.T., bem como a
invalidade do processo disciplinar por questões processuais, a fixação da
indemnização no valor correspondente a 30 dias de retribuição é, de facto e de
direito, desproporcional à gravidade “cometida” pela entidade patronal, sendo
que, obviamente, deveria ter sido levado em linha de conta a natureza jurídica
da Recorrente.
Nesse sentido, e ao manter-se a decisão de fixar a indemnização em substituição
da reintegração em 30 dias, o Acórdão viola o princípio da proporcionalidade,
previsto no art. 266° da CRP.
Sendo, assim, inconstitucional a interpretação que o Tribunal faz do artigo 439°
do Código do Trabalho, quando, para fixar o valor da indemnização, não tem em
linha de conta os critérios estabelecidos neste preceito, nomeadamente o grau de
ilicitude/invalidade do processo disciplinar, seguindo, antes, e unicamente, o
critério, objectivo, fixado em lei anterior, já revogada.
Pelo que, e salvo o devido respeito, e de acordo com o supra exposto, a
referência ao artigo 13° do DL 64-A/89, de 27/2 não foi, apenas e tão só, uma
mera referência legislativa, por sinal, revogada, mas, antes, uma referência
para a determinação do quantum indemnizatório.
Pelo que, e nesse sentido, o Acórdão da Relação de Évora, ao definir a fixação
da indemnização em 30 dias, com base no critério estabelecido na lei anterior –
DL 64-4/89 –, olvidando o critério subjectivo constante do art. 439° do CT,
viola o princípio da proporcionalidade.
Nesse sentido, e de acordo com o supra exposto, a questão da constitucionalidade
do artigo 439° do Código do Trabalho foi, atempadamente, levantada e, bem assim,
a interpretação que o Tribunal faz do artigo 439° do Código do Trabalho, quando,
para fixar o valor da indemnização, não tem em linha de conta os critérios
estabelecidos neste preceito, nomeadamente o grau de ilicitude/invalidade do
processo disciplinar, seguindo, antes, e unicamente, o critério, objectivo,
fixado em lei anterior, já revogada, é inconstitucional, pelo que o presente
recurso deverá ser objecto de conhecimento por parte deste Tribunal.
Nestes termos, e nos demais de direito, se requer que seja conhecido o objecto
do presente recurso para o Tribunal Constitucional, com as legais
consequências».
Cumpre agora decidir.
B – Fundamentação
4 – A presente reclamação não logra rebater os fundamentos da decisão
reclamada quanto ao juízo que deu por não verificados os requisitos
determinantes do conhecimento do objecto do recurso de constitucionalidade.
De facto, como resulta dos autos, a reclamante não suscitou em termos adequados
a constitucionalidade de qualquer norma em termos do tribunal a quo estar
vinculado ao seu conhecimento (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Como este Tribunal vem afirmando, de forma reiterada, «“suscitar a
inconstitucionalidade de uma norma jurídica é fazê-lo de modo tal que o tribunal
perante o qual a questão é colocada saiba que tem uma questão de
constitucionalidade determinada para decidir. Isto reclama, obviamente, que
(...) tal se faça de modo claro e perceptível, identificando a norma (ou um
segmento dela ou uma dada interpretação da mesma) que (no entender de quem
suscita essa questão) viola a Constituição; e reclama, bem assim, que se aponte
o porquê dessa incompatibilidade com a lei fundamental, indicando, ao menos, a
norma ou princípio constitucional infringido.” Impugnar a constitucionalidade de
uma norma implica, pois, imputar a desconformidade com a Constituição não ao
acto de aplicação do Direito – concretizado num acto de administração ou numa
decisão dos tribunais – mas à própria norma, ou, quando muito, à norma numa
determinada interpretação que enformou tal acto ou decisão (cfr. Acórdãos nºs
37/97, 680/96, 663/96 e 18/96, este publicado no Diário da República, II Série,
de 15-05-1996). [§] É certo que não existem fórmulas sacramentais para
formulação dos pedidos, nem sequer para suscitação da questão de
constitucionalidade. [§] Esta tem, porém, de ocorrer de forma que deixe claro
que se põe em causa a conformidade à Constituição de uma norma ou de uma sua
interpretação (...)» – cf., inter alia, o Acórdão n.º 618/98, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt/.
Ora, as menções constantes das peças processuais onde a reclamante afirma ter
suscitado a questão da violação do princípio da proporcionalidade não cumprem
tal desiderato na medida em que imputam essa violação recta via à decisão
judicial controvertida (“a decisão de mérito proferida aquando do
saneador/sentença viola manifestamente, este princípio basilar do nosso
ordenamento jurídico: o Princípio da Proporcionalidade” – fls. 1252; “(…) o
critério seguido pelo Tribunal é manifestamente excessivo e desproporcionado na
fixação da indemnização” – fls. 1256; “a sentença, ora em crise, viola
manifestamente, este princípio basilar do nosso ordenamento jurídico: o
Princípio da Proporcionalidade” – fls. 1352; “(…) a indemnização fixada pelo
Tribunal a quo a título de danos morais é excessiva e desproporcional, face à
matéria de facto apresentada nos autos, devendo a sentença, ora recorrida, ser
revogada, porquanto viola o Princípio da Proporcionalidade, previsto no art.
266.º, n.º 2 da CRP” – fls. 1354; “(…) a indemnização fixada pelo Tribunal a quo
a título de danos morais viola, a contrário, o disposto nos arts. 430.º n.º 2 b)
e 436.º n.º 1 a) do CT, dado que o despedimento não é ilícito e os danos não se
encontram provados com base num juízo de ciência, bem como viola o Princípio da
Proporcionalidade, previsto no art. 266.º, n.º 2 da CRP, uma vez que é excessiva
e desproporcional, face à matéria de facto apresentada nos autos” – fls. 1408),
sem que a reclamante haja aí questionado, perante o Tribunal a quo, em tempo
útil, a validade constitucional do artigo 439.º do Código do Trabalho, na
interpretação acolhida na 1.ª instância e sufragada, depois, pela Relação,
inconstitucionalidade essa que, como se disse, podia ter sido suscitada antes da
prolação da decisão recorrida uma vez que não existiu qualquer alteração
substantiva dos critérios dosimétricos valorados pelas instâncias quanto à
determinação do valor da indemnização no recurso que interpôs para o Tribunal da
Relação.
Em segundo lugar e contrariamente ao alegado, resulta dos autos que o Tribunal
da Relação assumiu como critério normativo aplicável o disposto no artigo 439.º
do Código do Trabalho e não o regime do artigo 13.º, n.º 3 do Decreto-Lei nº
64-A/89, de 27/2, razão pela qual, não tendo o Tribunal determinado o quantum
indemnizatório com base nos critérios daí resultantes e não cabendo a este
Tribunal pronunciar-se sobre o resultado da aplicação da lei aos factos
relevados, não se há que tomar conhecimento do recurso de constitucionalidade,
uma vez que, qualquer que fosse a decisão que este Tribunal pudesse adoptar
sobre o objecto do recurso tal como este foi definido pela ora reclamante,
sempre se manteria a decisão recorrida que não teve como aplicável o critério
normativo que se agora se pretende sindicar.
5 – Por fim, quanto ao problema da isenção do pagamento de custas
judiciais, levantado pela reclamante a título de questão prévia, cumpre, também,
concluir que não lhe cabe razão.
Na verdade, à altura da prolação da decisão sumária – ou seja, em 26
de Julho de 2007 – não existia norma que a isentasse de custas judiciais.
A disposição legal por força da qual, e em conjugação com o disposto
nos art.ºs 2.º, n.º 1, alínea b), do Código das Custas Judiciais e 4.º, n.º 1,
do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro (Regime de Custas no Tribunal
Constitucional), a reclamante passou a beneficiar da isenção de custas judiciais
– ou seja, o art. 3.º da Lei n.º 32/2007 –, entrou em vigor e tornou-se eficaz
em data posterior à da prolação da decisão sumária que decretou a sua tributação
em custas, porquanto tal diploma foi publicado em 13 de Agosto de 2007 e dele
não consta preceito a determinar a sua aplicação retroactiva.
Ora, o momento relevante para definir a situação tributária da
reclamante é, salvo disposição especial que inexiste, o da ocorrência do facto
tributário – no caso, o momento da prolação da decisão sumária.
Por isso, a apelidada “questão prévia” é de indeferir.
C – Decisão
6 – Destarte, atento o exposto, o Tribunal Constitucional decide:
a) Indeferir a reclamação da decisão
b) Indeferir o pedido de reforma da decisão sumária quanto às
custas.
Não se condena, agora, a reclamante em custas, por delas estar
isenta, nos termos referidos.
Lisboa, 11/12/2007
Benjamim Rodrigues
Joaquim Sousa Ribeiro
Rui Manuel Moura Ramos