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Processo n.º 812/07
2ª Secção
Relator: Conselheiro Joaquim de Sousa Ribeiro
Acordam, em conferência, na 2ª secção do Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de reclamação, vindos do Tribunal Judicial de Vieira do
Minho, A. e Mulher reclamam para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do n.º 4
do artigo 76.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional (LTC), «do despacho de 04.04.2007, que reformou o anterior
despacho de 20.11.2006», que indeferiu o requerimento de interposição de recurso
para o Tribunal Constitucional.
Para tanto, invocam o seguinte:
«1. O douto Despacho de 20.11.2006 de Fls.212/213, ora Reclamado, que aqui se dá
por transcrito, ao não admitir o Recurso interposto para o Tribunal
Constitucional incorreu em Erro de Julgamento.
2. Salvaguardado contudo o devido respeito por tal entendimento, não se partilha
do mesmo, nas vertentes que comporta, considerando-se antes que se verificam os
pressupostos ou requisitos para a admissão do recurso interposto para esse Alto
Tribunal.
3. Com efeito, os ora Reclamantes suscitaram as questões de
inconstitucionalidade no seu Requerimento de Arguição de Nulidade de Fls.117 a
121 dos autos, complementado pelos Requerimentos de Fls. 128/129 e de Fls. 130
dos autos.
4. Sucede que, o douto Despacho de 06.12.2005 de Fls..., conheceu do Pedido de
Apoio Judiciário, - posteriormente mantido pelo douto Despacho de 13.072006 de
Fls. 198/199 dos autos - quando ainda não havia qualquer notificação da decisão
definitiva dos Serviços da Segurança Social sobre o Recurso de Impugnação
Judicial do Despacho de indeferimento (Art.27°-n°3 da Lei N°34/2004, de 29.07.)
5.Sendo que, esse recurso de impugnação tem efeito suspensivo.
6. Trata-se, verdadeiramente, de uma Decisão surpresa a que integra esse douto
Despacho de 06.12.2005 de Fls... dos autos, que o douto Despacho de 13.07.2006
de Fls.l98/199 dos autos manteve.
7. Estava ainda por decidir definitivamente o Pedido de Apoio Judiciário quanto
ao Processo Administrativo que se tramita nos Serviços da Segurança Social.
8. Acresce que,
No que concerne ao ónus da suscitação da questão de inconstitucionalidade,
afigura-se claramente que os Reclamantes o terão cumprido.
9. Na verdade, os Reclamantes suscitaram a questão de (in)constitucionalidade
quando e no momento processual em que verificaram que a mesma surgiu e de forma
adequada.
10. Ou seja, no seu Requerimento de Arguição de Nulidade do douto Despacho de
06. 12.2005 de Fls. dos autos.
11.Tudo na sequência da notificação daquele douto Despacho - ainda antes do
trânsito em julgado.
12. De resto, de acordo com a jurisprudência desse Alto Tribunal, “Os critérios
jurisprudenciais (referentes ao ónus de suscitação da questão de
constitucionalidade durante o processo) não hão-de ser tomados rigidamente, de
jeito a não permitir o recurso quando ao interessado se depare uma decisão
relativamente à qual não seria razoável exigir uma prognose de um conteúdo e de
um despacho inesperados, anómalos ou excepcionais. Como igualmente, quando não
houve oportunidade processual de suscitar a questão anteriormente, tem lugar a
flexibilização dos descritos critérios em beneficio do direito de recurso
(...)acórdãos nos 188/93 e 60/95, publicados nos Acórdãos do Tribunal
Constitucional, vols. 24, págs. 495 e segs., e 30, págs. 445 e segs..,
respectivamente).
13. Com efeito, não era razoável - antes da prolação daquele douto Despacho de
06.12.2005, que o douto Despacho de 13.07.2006. de Fls. 198/199 manteve - exigir
aos Reclamantes a “prognose” ou previsão de uma Decisão de conteúdo “inesperado,
anómalo ou excepcional” como aquele em que acaba por verificar-se naquele douto
Despacho de 06.12.2005.
14. Daí que se devam ter como adequadamente suscitadas, pelos Reclamantes, as
correspondentes questões de inconstitucionalidade.
PELO EXPOSTO, e pelo que será doutamente suprido, deve ser atendida e deferida a
presente Reclamação, admitindo-se o Recurso interposto para o Tribunal
Constitucional a Fls..., dos autos, seguindo-se os ulteriores termos até final.
»
O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional emitiu
parecer, sustentando a intempestividade da reclamação.
2. Para decisão da reclamação são relevantes os seguintes factos, documentados
nos autos:
a) No processo de execução n.º 18-A/1999, que corre termos no Tribunal Judicial
de Vieira do Minho, os ora reclamantes interpuseram recurso para o Tribunal
Constitucional, por requerimento entrado em 01.08.2006, no qual afirmavam que o
faziam «sem prejuízo da apreciação prévia do seu requerimento de interposição do
recurso de agravo do douto despacho de 13.07.2006, proferido a fls. 198/199 dos
autos, - e apenas por mera cautela» (cfr. fls. 54 dos presentes autos);
b) Este recurso não foi admitido por despacho de 20.11.2006 (cfr. fls. 25/26 dos
presentes autos);
c) Os reclamantes interpuseram recurso de agravo para o Tribunal da Relação de
Guimarães deste despacho de 20.11.2006 (cfr. fls. 27);
d) Por despacho de 19.01.2007 foi indeferido o recurso de agravo para o Tribunal
da Relação de Guimarães, com a seguinte fundamentação: «Salvo melhor opinião, do
despacho de fls. 203, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional,
não cabe recurso para o Tribunal da Relação, caberia outrossim, reclamação nos
termos do n.º 4 do art. 76.º e art. 77.º da Lei do Tribunal Constitucional.»
(cfr. fls. 28);
e) Por requerimento apresentado em 12.03.2007, os reclamantes requereram o
esclarecimento e a rectificação/correcção do despacho de 19.01.2007, pedindo que
oficiosamente se mandasse “seguir os termos próprios da reclamação” (cfr. fls.
30);
f) Por despacho de 04.04.2007, foi decidido reformar o despacho de 19.01.2007,
substituindo-o por outro com o seguinte teor: «Do despacho proferido a fls. 212,
que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional, não cabe recurso para
o Tribunal da Relação de Guimarães, antes cabe reclamação nos termos do n.º 4 do
art. 76.º e art. 77.º da Lei do Tribunal Constitucional. Assim, ao abrigo do
disposto no n.º 5 do art. 688.º do CPC, aplicável ex vi art. 69.º da Lei do
Tribunal Constitucional, seguir-se-ão os termos da reclamação prevista no n.º 4
do art. 76.º e art. 77.º da Lei do Tribunal Constitucional» (cfr. fls. 34/35);
g) A presente reclamação foi apresentada no Tribunal Judicial de Vieira do
Minho, por requerimento entrado em 27.04.2007 (cfr. fls. 2/5 dos presentes
autos).
3. Do exposto resulta que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional
não foi admitido por despacho de 20.11.2006 e que a presente reclamação só foi
apresentada por requerimento entrado em 27.04.2007, ou seja, muito para além do
prazo de 10 dias fixado no artigo 688.º, n.º 2 do CPC, aplicável por força dos
artigos 69.º e 76.º, n.º 4 da LTC.
Como se salienta no parecer do Ministério Público, «não interrompeu tal prazo
para reclamar a insólita interposição de recurso de agravo para a Relação de
Guimarães, feita pelo requerimento de fls. 27, já que tal consubstancia a
indevida utilização de meio procedimental manifestamente inidóneo para o efeito
pretendido».
Como este Tribunal tem reiteradamente afirmado, não pode ser atribuído efeito
interruptivo dos prazos de interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional − ou, como é o caso, de reclamação de despachos de não admissão
desse recurso − «quando o interessado tenha lançado mão de um meio impugnatório
inexistente no ordenamento jurídico e que, como tal, apenas possa
caracterizar-se como um incidente processual anómalo» (v., entre outros, os
Acórdãos n.ºs 278/2005, 173/2007 e 279/2007).
Nestes autos, é precisamente o que acontece com o mencionado recurso de agravo
para o Tribunal da Relação de Guimarães, que não constitui meio previsto na lei
para impugnar o despacho, de 20.11.2006, de não admissão do recurso para o
Tribunal Constitucional. Por outro lado, apenas em 27.04.2007 foi apresentada,
de modo adequado, reclamação para o Tribunal Constitucional daquele despacho de
20.11.2006, não tendo essa virtualidade o pedido de rectificação oficiosa do
despacho que indeferiu aquele recurso de agravo por, mais uma vez, não ser meio
idóneo para o efeito pretendido.
4. Pelo exposto, acordam em não conhecer, por intempestividade, da presente
reclamação.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 16 de Outubro de 2007
Joaquim Sousa Ribeiro
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos