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Processo nº 763/07
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é
recorrente A. e recorrida B., S. A., foi interposto recurso para o Tribunal
Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei de
Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do
acórdão daquele Tribunal de 21 de Junho de 2007.
2. Em 26 de Julho de 2007, foi proferida decisão sumária, ao abrigo do disposto
no nº 1 do artigo 78º-A da LTC, pela qual se entendeu não tomar conhecimento do
objecto do recurso, com o seguinte fundamento:
«Um dos requisitos do requerimento de interposição de recurso é a indicação da
norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal
aprecie (artigo 75º-A, nº 1, parte final, da LTC).
Não obstante este requisito não estar perfeitamente satisfeito, não se justifica
que a recorrente seja convidada a indicar, com precisão, a norma cuja apreciação
pretende, ao abrigo do nº 6 do artigo 75º-A da LTC. Com efeito, ainda que tal
indicação viesse a ser feita justificar-se-ia sempre concluir pelo não
conhecimento do objecto do recurso interposto, já que não foi suscitada
previamente qualquer questão de inconstitucionalidade ou ilegalidade perante o
Supremo Tribunal de Justiça».
3. Notificada da decisão sumária, a recorrente apresentou requerimento do
seguinte teor:
«1.
Foi notificada por despacho por que foi decidido não tomar conhecimento do
recurso interposto, com base no disposto no art°. 78°., 2 da LTC.
2.
Com ressalva do respeito devido, pensa a Recorrente que terá sido cometido um
lapso (aliás, compreensível pelas razões que, adiante, se aduzem).
3.
Na verdade, no parágrafo 19 das alegações de recurso de revista (2°. recurso), a
Recorrente deu aí como reproduzido o que alegara no parágrafo 13 (ou ponto 13)
das suas contra-alegações no primeiro recurso de apelação para o Tribunal da
Relação do Porto (ou seja, no âmbito do recurso da 1°. sentença do Tribunal do
Trabalho de Santo Tirso).
4.
Nas alegações de revista (2°. recurso para o STJ), importa dizê-lo, a Recorrente
não utilizou, expressamente, palavras do tipo dá-se aqui por reproduzido”;
todavia, o contexto, e até a epígrafe do título (Das inconstitucionalidade”) em
que esse parágrafo 19 se insere, demonstra a vontade de aí ser dada como
reproduzida tal matéria, ou seja todo o processo estava condicionado pelo
disposto no art°. 90 do Dec. Lei n°. 87/92, de 14.5, e art°. 4°. da Portaria
348/87, de 28.4, cuja constitucionalidade fora posta em crise pela Recorrente ao
longo deste processo.
5.
No despacho em causa, isso não foi reparado, mas também com culpa da Recorrente
que, ao interpor recurso, não o disse, como era seu dever processual, e de cujo
erro se penitencia. Todavia, nos termos da lei esse erro é rectificável,
tendo-se em conta o disposto no art°. 75°.-A, 5 e 6 da LTC, pois o direito e a
justiça estão acima do incontornável risco do erro humano.
Tendo em conta o exposto, R. a V. Exª. a reforma do douto despacho onde foi
decidido não receber o presente recurso, de modo que este possa seguir os seus
termos.
Para o caso de se entender que a decisão comunicada à Recorrente não é passível
de, assim, ser alterada, e com base nos fundamentos atrás aduzidos, com a devida
vénia vem reclamar para a Conferência, de modo a que seja decidido receber-se
este recurso».
4. Notificada, a recorrida não respondeu.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Nos presentes autos decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, nº 1, da
LTC, não tomar conhecimento do objecto do recurso, com fundamento na não
suscitação prévia de qualquer questão de inconstitucionalidade ou de ilegalidade
reportada a norma dos diplomas legais referidos no requerimento de interposição
de recurso (artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º, nº 2, da LTC). É este
fundamento que agora é posto em causa, de acordo com o estabelecido no nº 3 do
artigo 78º-A, não havendo qualquer justificação para a invocação de causas de
reforma da decisão, ao abrigo do consagrado no nº 2 do artigo 669º do Código de
Processo Civil, aplicável por força do disposto no artigo 69º da LTC.
A reclamante indica agora o parágrafo 19 das alegações de recurso de revista
para sustentar que, afinal, cumpriu o ónus da suscitação prévia. Ora, foi
precisamente esta a peça processual (fl. 783 e segs.) tida em conta para
verificar se o recorrente tinha suscitado qualquer questão de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade, durante o processo, de modo
processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, no
caso perante o Supremo Tribunal de Justiça. A peça processual agora referida e
não as indicadas no requerimento de interposição de recurso – contestação do
processo disciplinar e petição inicial –, já que estas não foram produzidas
perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Não pode, de facto, concluir-se que tenha sido suscitada uma qualquer questão de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade na peça processual pertinente e em
especial na passagem expressamente indicada pela reclamante, o parágrafo 19,
cujo teor é o seguinte:
«Como resulta da petição inicial (e todo este processo o revela), quando foi
intentado e decidido o processo disciplinar, tinha caducado o direito
disciplinar da Recorrida.
Tudo isto foi possível graças a interpretações inconstitucionais das normas
aludidas nesse ponto 13. das contra-alegações da Recorrente feitas no primeiro
recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, pela Recorrida, da
decisão que julgou a acção procedente no despacho saneador.
Essa decisão foi revogada pelo Tribunal da Relação do Porto e sustentada esta
decisão por este Supremo Tribunal de Justiça».
O cumprimento do ónus a que se referem os artigos 70º, nº 1, alínea b), e 72º,
nº 2, da LTC impõe ao recorrente a delimitação da questão de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade, «de forma a possibilitar ao tribunal
recorrido a sua cabal compreensão e, portanto, a sua efectiva decisão» (Acórdão
do Tribunal Constitucional nº 361/2006, disponível em
www.tribunalconstitucional.pt), o que não sucede, manifestamente, na passagem
acabada de transcrever. A recorrente não especificou as normas cujas
interpretações reputava inconstitucionais – limitou-se a remeter para as normas
a que terá aludido em determinada passo de uma peça processual anterior –, não
identificou estas interpretações e nem sequer indicou a norma ou princípio
constitucional ou legal que considerava violado.
Resta, pois, concluir pela confirmação da decisão de não conhecimento do objecto
do recurso.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do
recurso.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 24 de Outubro de 2007
Maria João Antunes
Carlos Pamplona de Oliveira
Gil Galvão