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Proc. n. 466/02
1ª Secção Relator: Cons. Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam em conferência na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
A sociedade anónima denominada A. impugnou em 29 de Dezembro de 1999 no Tribunal Tributário de 1ª Instância do Porto a liquidação de emolumentos de registo comercial no montante de esc. 80.848$00, fixada a título de “acréscimo de emolumentos sobre os actos de valor determinado” em resultado do aumento do seu capital social de 5 para 50 mil contos.
O Tribunal solicitado veio, porém, a julgar extemporâneo o pedido, pois verificou que a interessada havia efectuado o pagamento da quantia em causa em
25 de Março de 1997, ou seja, em data muito anterior aos 90 dias de que dispunha para, a partir de então, impugnar a liquidação - artigo 123º n.1 alínea a) do CPT.
Rejeitou, com esse fundamento, a impugnação.
Inconformada, a A. recorreu para a 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo a pedir a alteração do julgado; mas sem êxito, pois o Tribunal, por acórdão de
19 de Dezembro de 2001, decidiu que “a sentença recorrida, ao pronunciar-se pela caducidade do direito à impugnação, deduzida dois anos e alguns meses após o pagamento da quantia liquidada, não merece censura”. Consequentemente, negou provimento ao recurso. A recorrente ainda requereu a reforma do acórdão, mas tal pedido foi indeferido por acórdão de 24 de Abril de 2002 da mesma 2ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo.
Notificada da última decisão, a recorrente interpôs recurso para este Tribunal Constitucional ao abrigo da alínea b) do n. 1 do artigo 70 da Lei do Tribunal Constitucional, declarando que pretendia impugnar a conformidade constitucional da norma constante do “artigo 234º do Tratado que institui a Comunidade Europeia”. O recurso foi admitido e as partes convidadas a alegar.
Esgotado, porém, o respectivo prazo, apurou-se que a recorrente não juntara a sua alegação ao processo, pelo que foi proferido despacho a declarar extinto o recurso com fundamento em deserção.
É deste último despacho que a interessada reclama para a Conferência, invocando que, ao invés do decidido, enviara em devido tempo a sua alegação por correio registado. Juntou dois documentos e um duplicado da aludida alegação.
A contra-parte nada veio dizer.
Importa decidir.
A questão que nos ocupa é de natureza exclusivamente processual, pois pretende-se apenas saber se o despacho reclamado decidiu bem ao declarar extinto o recurso por falta de apresentação atempada da alegação da recorrente.
E a resposta a esta questão depende totalmente de saber se a interessada remeteu em tempo o seu articulado ao Tribunal, pois não oferece dúvida de que lhe cabia o ónus de o fazer juntar aos autos ou de o enviar por correio registado até ao dia 6 de Novembro de 2002.
Certo é, porém, que a peça processual em questão não deu entrada no Tribunal, conforme resulta das diligências entretanto executadas pela Secretaria.
Assente este dado, deve entender-se que cabe também à recorrente o ónus de demonstrar que fez a remessa, e remessa atempada, do articulado, para, em resultado dessa comprovação, se achar em tempo de fazer agora a sua apresentação.
A correspondente actividade processual desenrola-se, sem dúvida, numa fase de reclamação (no caso, exercida com apelo à Conferência), mas essencialmente mediante a tramitação prevista no artigo 146º do Código de Processo Civil - aplicável por força do disposto no artigo 69º da Lei do Tribunal Constitucional
- pois o certo é que, embora omissa neste ponto, o fundamento jurídico da pretensão em análise se alicerça no instituto do justo impedimento, ou seja, na alegação e prova da ocorrência de evento não imputável à parte, obstativo da prática atempada do acto.
Isto significa que, para alcançar a pretendida utilidade, não é suficiente a mera solicitação de que sobre a matéria do despacho do Relator recaia um acórdão
(cfr. artigo 700º n. 3 do Código de Processo Civil), pois é indiscutível que a decisão reclamada é a decisão certa face aos dados de facto em que a mesma se estribou.
O que verdadeiramente agora releva é a essencial demonstração de que os pressupostos de facto em que se fundamentou o despacho reclamado não são os verdadeiros e que, perante outros factos agora processualmente adquiridos e com apelo ao justo impedimento, à interessada seja ainda facultada a prática do acto omitido.
O problema é que a reclamante não logra demonstrar que praticou o acto dentro do prazo.
Na verdade, os documentos que apresenta são manifestamente insuficientes para essa prova; o “recibo” que consta a fls. 541 nada mais demonstra senão que a interessada endereçou uma carta a este Tribunal; para além disso, e passados cerca de 10 meses após a reclamação formulada aos CTT e documentada nos autos, a requerente não só não revelou o resultado dessa diligência, como tão pouco declarou desejar fazê-lo, sendo certo que, em princípio, lhe cabia ter imediatamente exposto todas as provas juntamente com a reclamação formulada
(para o que dispunha de 10 dias).
Nestes termos, nada mais se poderá concluir senão que a interessada não demonstrou que procedeu ao envio atempado da sua alegação de recurso, isto é, não demonstrou que o despacho reclamado repousava em fundamento de facto errado.
Consequentemente, é de manter tal decisão.
Termos em que se decide indeferir a reclamação, com custas pela reclamante; taxa de justiça: 15 Uc.
Lisboa, 15 de Outubro de 2003
Carlos Pamplona de Oliveira Maria Helena Brito Rui Manuel Moura Ramos