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Processo n.º 373/03
3ª Secção Relatora: Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. A fls. 162 foi proferida a seguinte decisão sumária :
«1.A. interpôs recurso contencioso de anulação do despacho genérico de 11 de Janeiro de 2000, proferido pela Direcção da Caixa Geral de Aposentações (CGA), que indeferiu o seu pedido de que o tempo de permanência na situação de reserva fora da efectividade de serviço com desconto de quotas para a CGA relevasse para efeitos de cálculo da pensão de reforma.
Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa de 11 de Junho de 2002, constante de fls. 70 e seguintes, foi o recurso julgado improcedente.
Inconformado, o recorrente interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo, o qual, por acórdão de 13 de Fevereiro de 2003, constante de fls. 113 e seguintes, negou provimento ao recurso. Alegando existir uma oposição entre os fundamentos e a decisão – uma vez que, reconhecendo-se que no tempo em que permaneceu na situação de reserva fora da efectividade de serviço o recorrente foi remunerado e efectuou descontos para a CGA, esse tempo deveria contar como tempo de serviço efectivo para efeitos de reforma – o recorrente veio arguir a nulidade do mencionado acórdão, ao abrigo do disposto no artigo
668º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, a qual foi inferida por acórdão de 3 de Abril de 2003, constante de fls. 143-144.
2. Novamente inconformado, o recorrente veio, “ao abrigo do artigo
70º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, interpor recurso para o Tribunal Constitucional (artigo 75º-A, n.º 1)”, afirmando que “os princípios constitucionais que o recorrente considera violados são o da igualdade e os da segurança e certeza jurídicas cuja violação invocou nas suas Alegações”.
Convidado a definir a norma cuja inconstitucionalidade pretende que o Tribunal Constitucional aprecie, nos termos do artigo 75º-A, n.ºs 1, 5 e 6, da Lei n.º 28/82, o recorrente veio “completar o requerimento de interposição de recurso” nos seguintes termos:
“1 – A alínea ao abrigo da qual o recurso é interposto é a alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro;
2 – A norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada durante o processo (nomeadamente nas Alegações de recurso jurisdicional junto do Tribunal Central Administrativo) é o n.º 3 e 4 do artigo 44º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 236/99 de 25 de Junho na redacção dada pela Lei n.º 25/2000, de 23 de Agosto;
3 – O princípio constitucional que foi violado é o da igualdade, segurança e certeza jurídicas (artigo 13º).”
O recorrente pretende, pois, submeter a este Tribunal a apreciação da questão da conformidade constitucional das normas do artigo 44º, n.ºs 3 e 4, do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º
236/99 de 25 de Junho, na redacção dada pela Lei n.º 25/2000, de 23 de Agosto, por alegada violação do princípio da igualdade.
3. Acontece que o Tribunal não pode tomar conhecimento da aludida questão, uma vez que o recorrente não suscitou, no momento processual adequado, ou seja, aquando da apresentação de alegações perante o tribunal recorrido, o Tribunal Central Administrativo, a inconstitucionalidade das normas que indica como objecto do presente recurso.
É pressuposto de admissibilidade do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas interposto ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, como é o caso, que a inconstitucionalidade haja sido “suscitada durante o processo” (citada al. b) do nº 1 do artigo 70º), ou seja, colocada “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (nº 2 do artigo 72º da Lei nº 28/82). Conforme o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado, o recorrente só pode ser dispensado do ónus de invocar a inconstitucionalidade ”durante o processo” nos casos excepcionais e anómalos em que não tenha disposto processualmente dessa possibilidade, sendo então admissível a arguição em momento subsequente (cfr., a título de exemplo, os Acórdãos deste Tribunal com os nºs 62/85, 90/85 e 160/94, publicados, respectivamente, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 5º vol., págs. 497 e 663 e no Diário da República, II, de 28 de Maio de 1994). Não é, manifestamente, o caso dos autos. Na verdade, desde a 1ª instância que o recorrente referiu que o artigo 44º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 236/99, tinha sido alterado pela Lei n.º 25/2000 (cfr. alegações de fls. 28); a decisão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa considerou tal alteração, adoptando, aliás, para os preceitos alterados a interpretação que veio a ser seguida pelo Tribunal Central Administrativo (cfr. acórdão recorrido, em particular a fls. 118). Era, pois, exigível ao recorrente que invocasse a inconstitucionalidade que pretende ver agora apreciada.
4. Estão, assim reunidas as condições para que se proceda à emissão da decisão sumária prevista no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro. Nestes termos, decide-se não conhecer do objecto do recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 6 ucs.»
2. Inconformado, o recorrente reclamou para a conferência, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, pretendendo a revogação da decisão sumária, por “ter ocorrido evidente lapso”, uma vez que “nas alegações de recurso para o Tribunal Central Administrativo (...) o recorrente jurisdicional suscitou (cf. toda a pág. 10 e as 19ª e 20ª conclusões) a inconstitucionalidade da norma que indicou junto do Tribunal Constitucional e que desde a 1ª instância aponta e que (também) foi apreciada pela 3ª Secção do TAC de Lisboa (...)”.
Tendo sido notificada para o efeito, a reclamada, CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES, não se pronunciou.
3. Acontece, todavia, que, no recurso para o Tribunal Constitucional, o ora reclamante definiu como seu objecto a versão conferida pela Lei n.º 25/2000, de 23 de Agosto, para os n.ºs 3 e 4 do artigo 44º do Estatuto dos Militares das Forças Armadas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 236/99, de 25 de Junho; e que nas alegações apresentadas perante o Tribunal Central Administrativo suscitou a questão da inconstitucionalidade da “interpretação segundo a qual a contagem do tempo de reserva fora de serviço, prevista no artº
44º do citado diploma na sua versão originária, apenas se aplica aos militares reformados após a entrada em vigor do diploma” (pág. 10).
Ora a Lei n.º 25/2000 alterou o n.º 3 e acrescentou o n.º 4 do citado artigo 44º, como se explica no acórdão recorrido:
“(...) a Lei n.º 25/2000, de 23/8 veio alterar a redacção do DL.n.º
236/99. Mas, apesar de ter alterado a redacção do n.º 3 do art. 44º ( e de ter aditado ao preceito o n.º 4), não tornou aquele regime aplicável aos reformados antes da entrada em vigor do DL n.º 236/99 (não tornando explícito que lhes era aplicável), mas, antes, permitiu que os reformados após a entrada em vigor do DL. n.º 236/99 pudessem, retroactivamente, ver relevado o tempo de reserva anterior à entrada em vigor do DL. n.º 236/99, juntamente com o posterior.
Esta nova versão do art. 44º consagra expressamente a aplicação retroactiva do tempo em questão, em clara derrogação do art. 12º do Cod. Civil e do art. 43º, n.º 1 do EA, derrogação essa que aquele preceito e o n.º 2 do artº
43º claramente consentem.”
Não foi, pois, oportunamente invocada pelo reclamante a inconstitucionalidade que pretende ver apreciada no recurso que interpôs, como se afirmou na decisão reclamada. Não ocorreu, pois, qualquer lapso.
4. Foi, entretanto, junto ao processo o ofício de fls. 172; verifica-se, assim, que foi concedido ao reclamante apoio judiciário nas modalidades de “dispensa total de taxa de justiça e demais encargos com o processo, pagamento de honorários do patrono escolhido pelo requerente”.
Nestes termos, indefere-se a reclamação, confirmando-se a decisão de não conhecimento do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 ucs., sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Lisboa, 14 de Outubro de 2003
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Bravo Serra Luís Nunes de Almeida