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Proc. nº 51/01 Acórdão nº 211/02
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Tendo sido notificado do acórdão do Tribunal Constitucional, nº
155/2002, de 17 de Abril de 2002 (fls. 626 a 646), em que se decidiu não julgar inconstitucional a norma do artigo 24º, n.º 5, do Código das Expropriações de
1991, interpretada no sentido de excluir da classificação de 'solo apto para a construção' os solos integrados na Reserva Agrícola Nacional e na Reserva Ecológica Nacional expropriados para implantação de uma central de incineração de resíduos urbanos e respectivo aterro sanitário, e, consequentemente, conceder provimento ao recurso interposto pelo Ministério Público, veio o recorrido P... requerer a aclaração do mencionado acórdão.
O requerimento apresentado é do seguinte teor (fls. 650):
'[...] A fls. 19 do douto Acórdão diz-se: a eventual desafectação dos terrenos expropriados da RAN/REN para efeitos de construção de uma central de incineração de resíduos sólidos é susceptível de gerar nesses terrenos uma «muito efectiva potencialidade edificativa»? Acontece que a implantação da central que é um prédio urbano amplo, com áreas de serviços diversos, é em si própria a concretização da efectiva potencialidade edificativa.
À frente, V. Exªs. afirmam que a construção não é susceptível de atrair construções. E então cabe perguntar – trata-se de capacidade efectiva do terreno expropriado ou da que gera na envolvente? Depois quer-nos parecer que, a ser como referimos, então essa capacidade da envolvente já existia face ao PDM que qualificava o solo como apto para construção (equipamento). E, esta área de equipamento é que foi alargada, por forma a abranger o terreno que foi desafectado da RAN. Por outras palavras requer-se a V. Exªs. que o douto Acórdão seja aclarado, por forma a que fique para nós claro se V. Exªs defendem a conformidade da norma do artigo 24º nº 5 do CE/91 com base na construção que foi implantada ou com base no facto de não gerar capacidade construtiva na envolvente (mas como está provado parte do terreno é de construção).'
2. Notificado para se pronunciar sobre a reclamação, o Ministério Público respondeu (fls. 652):
'1 – O douto acórdão, proferido nestes autos, é perfeitamente claro e insusceptível de dúvidas relativamente à única questão que compete a este Tribunal Constitucional dirimir – ou seja, a questão de constitucionalidade da norma ou interpretação normativa que constitui objecto do recurso.
2 – Termos em que deverá manifestamente improceder o pedido deduzido, por nada haver a esclarecer.'
3. O pedido de 'aclaração' do referido acórdão tem manifestamente de improceder.
Nos termos do artigo 669º, nº 1, alínea a), do Código de Processo Civil, pode qualquer das partes requerer ao tribunal que proferiu a decisão 'o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade que ela contenha'.
Decisão obscura é a que contém algum passo cujo sentido não é inteligível e decisão ambígua é a que permite a atribuição de mais do que um sentido ao seu texto.
Ora, como reconhece o Ministério Público no seu parecer, o acórdão proferido nos autos 'é perfeitamente claro e insusceptível de dúvidas relativamente à única questão que compete a este Tribunal Constitucional dirimir
– ou seja, a questão de constitucionalidade da norma ou interpretação normativa que constitui objecto do recurso'
Na verdade, afirma-se com toda a clareza do texto do acórdão reclamado que:
'Não se vê assim que a desafectação dos terrenos da RAN/REN para efeitos de expropriação com vista à construção de uma central de incineração de resíduos e respectivo aterro sanitário possa trazer a tais terrenos uma maior potencialidade edificativa. E só a existência desta possível aptidão edificativa justificaria que os terrenos em causa pudessem ser qualificados como «aptos para construção», com a consequente eventual violação da Constituição no caso de o não virem a ser.'
E, mais adiante:
'Não pode, com efeito, concluir-se, no caso, que a expropriação (e a desafectação) se destinou à construção de um edifício urbano, mas sim e muito ao contrário, de um edifício que repele a urbanização, face à finalidade a que se destina Trata-se, portanto, de um equipamento público intermunicipal que, constituindo uma alteração da destinação agrícola do terreno, não gera uma potencialidade edificativa que seja relevante para a qualificação do solo como
«solo apto para a construção».
Com efeito, a potencialidade edificativa não existia antes, uma vez que o terreno se inseria na RAN/REN e a expropriação (e a desafectação) não gerou tal potencialidade edificativa, uma vez que nele não se edificou uma construção urbana.'
Por isso o Tribunal Constitucional concluiu no mencionado acórdão que: 'a norma do artigo 24º, n.º 5, do Código das Expropriações de 1991, interpretada no sentido de excluir da classificação de solo apto para a construção o solo integrado na Reserva Agrícola Nacional e na Reserva Ecológica Nacional, expropriado com a finalidade de nele se construir uma central de incineração de resíduos sólidos (lixos), não é inconstitucional, pois não viola o princípio da indemnização justa, a que se refere o artigo 62º da Constituição'.
Com a reclamação apresentada, o ora reclamante mais não pretende afinal do que manifestar a sua discordância em relação à solução contida no acórdão reclamado.
4. Assim, porque se entende ser claro e compreensível o acórdão proferido, indefere-se o pedido de 'aclaração'.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em dez unidades de conta.
Lisboa, 22 de Maio de 2002- Maria Helena Brito Luís Nunes de Almeida Artur Maurício José Manuel Cardoso da Costa