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Proc. nº 282/2002
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. A Câmara Municipal de Sintra, no âmbito de um processo de impugnação de liquidação de licença de ocupação de subsolo, interpôs recurso do acórdão do Tribunal Central Administrativo, de 23 de Outubro de 2001, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, recurso que não foi admitido, por despacho de 20 de Novembro de 2001. Posteriormente, interpôs recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional. O recurso de constitucionalidade não foi admitido, com fundamento na intempestividade, por despacho de 15 de Janeiro de 2002.
2. A Câmara Municipal de Sintra vem agora reclamar, ao abrigo dos artigos 76º, nº 4, e 77º, da Lei do Tribunal Constitucional, sustentando a tempestividade do recurso.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da tempestividade do recurso. Sustentou, porém, a improcedência da reclamação, uma vez que a reclamante não suscitou perante o tribunal a quo qualquer questão de constitucionalidade normativa.
Cumpre decidir.
3. A reclamante interpôs recurso do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo. Tal recurso não foi admitido, por irrecorribilidade da decisão. O prazo de interposição do recurso de constitucionalidade de 10 dias só começou a correr na data em que a decisão de rejeição do recurso se tornou definitiva (6 de Dezembro de 2001 – cf. fls 18). Tendo dia 16 sido domingo, o recurso interposto a 17 de Dezembro de 2001 é tempestivo (cf. artigo 75º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
4. No entanto, da transcrição das conclusões da então recorrente constante de fls. 25, resulta que não foi suscitada perante o tribunal a quo qualquer questão de constitucionalidade normativa. Com efeito, das conclusões não consta qualquer questão de constitucionalidade normativa, apenas se desenvolvendo argumentos que se reportam à interpretação do direito infraconstitucional. Foram as seguintes as conclusões então tiradas, tal como foram transcritas pelo Tribunal Central Administrativo (sendo certo que, como consta da cópia da alegação produzida pela ora reclamante para aquele Tribunal e que se encontra junta a estes autos, no seu 'teor' se não descortina qualquer questão de inconstitucionalidade reportada a uma norma jurídica):
1. As receitas dos municípios podem, nos termos legais provir, nomeadamente da cobrança de impostas ou da cobrança de taxas pelos serviços prestados por aqueles, cfr. artº 43, nº 1 e artº 16° als. a) e d) da Lei n° 42/98, de 6 de Agosto;
2. Imposto é uma prestação coactiva e unilateral, por forma a sublinhar que a obrigação do particular não corresponde a qualquer contraprestação;
3. Pelo contrário, a taxa tem carácter bilateral, sinalagmático. Ou seja, à sua obrigatoriedade corresponde uma contrapartida concreta e individualizáveis;
4. Assim as taxas assentam na prestação concreta de um serviço público, na utilização de um bem do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares, cfr. artº 4º, n° 2 da LGT;
5. Os municípios podem cobrar taxas provenientes, nomeadamente da ocupação ou utilização do subsolo do domínio público municipal, bem como pela concessão de licenças de obras para utilização solo e subsolo do domínio público municipal, cfr. artº 19, als. b) e c) da Lei nº 42/98, de 6 de Agosto;
6. O licenciamento para ocupação de espaça público municipal, enquanto remoção de um obstáculo jurídico à actividade da ora recorrida, constitui uma taxa;
7. Pois que, a verificação das condições indispensáveis aquela remoção, independentemente da disponibilização cumulativa de bens públicos, constitui a contrapartida, cfr. Ac. do STA, in recurso nº 23 555, de 26 de Maio de 1999;
8. A recorrida é uma sociedade comercial a quem é facultada a ocupação e utilização do subsolo de domínio público municipal de Sintra para prossecução da sua actividade comercial;
9. Apesar da mesma se destinar à satisfação das necessidades colectivas, é a própria recorrida quem, em primeira linha, beneficia da referida ocupação e utilização, pois que daí retira lucro como sociedade comercial que é ocorrendo desta forma uma utilização concreta e individualizada, logo estamos perante uma taxa;
10. Pelo exposto, acto o recorrido constitui verdadeiras taxas, tendo a sua liquidação plena cobertura legal, cfr. als. b) e c) do artº 19° da Lei n° 42/98, de 6 Agosto;
Ora, sendo o recurso que a reclamante pretende ver admitido interposto ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, é necessário que antes da prolação da decisão recorrida o recorrente suscite a questão de constitucionalidade normativa, de modo a que o tribunal a quo esteja obrigado a dela conhecer (artigos 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional).
Não tendo sido suscitada qualquer questão de constitucionalidade perante o Tribunal Central Administrativo, é manifesto que o recurso interposto não podia ser admitido, pelo que a presente reclamação é improcedente.
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, uma vez que não foi suscitada durante o processo qualquer questão de constitucionalidade normativa. Lisboa, 28 de Maio de 2002- Maria Fernanda Palma Bravo Serra José Manuel Cardoso da Costa