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Processo nº 124/07
2ª Secção
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
Relatório
A., assistente no processo nº 611/04.5TOPRT, do 3º Juízo do Tribunal de
Instrução Criminal do Porto, requereu a abertura de instrução nesse processo.
Este requerimento foi indeferido por despacho de 21-9-2004.
Desta decisão recorreu o assistente para o Tribunal da Relação do Porto, que
proferiu acórdão em 22-3-2006, rejeitando, por manifesta improcedência, o
recurso.
O assistente recorreu desta decisão para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo o
Desembargador relator proferido despacho de não admissão do recurso, em
27-5-2006.
Desta decisão reclamou o assistente para o Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça.
O Vice-Presidente deste Tribunal, em 20-11-2006, proferiu decisão de
indeferimento da reclamação, com os seguintes fundamentos:
“No caso em apreço, está em causa um acórdão da Relação do Porto que rejeitou o
recurso interposto pelo ora reclamante do despacho proferido em 1ª instância que
indeferira a requerida abertura de instrução por extemporânea.
O sistema de recursos em processo penal está organizado de modo a que parece não
haver lugar na sua estruturação lógica a recursos para o S.T.J. de decisões do
tribunal singular.
Tendo em conta o disposto nas alíneas c), d), e), e f) do nº 1 do art. 400º, do
CPP, o acórdão questionado é insusceptível de recurso para este Supremo Tribunal
por tal só ser possível, em termos de equilíbrio do sistema, depois do objecto
do processo se encontrar definido, desde que estejam em causa decisões finais,
não idênticas nas duas instâncias, proferidas em processos por crimes que
assumam particular gravidade. Aqui tem aplicação o disposto no art. 427º, 2ª
parte, do CPP, ou seja, da decisão da 1ª instância apenas cabia recurso para a
Relação.
Acresce que o acórdão em crise também não punha termo à causa.
Isto porque, como se disse no Acórdão do S.T.J. de 26.01.2005, proferido no
processo nº 4438/04 – 3ª secção 'a decisão que põe termo à causa é, como vem
decidindo este Supremo Tribunal, a decisão que faz terminar a causa de modo
substancial, que julga e determina o direito do caso e decide o objecto do
procedimento criminal, definindo a existência ou inexistência de
responsabilidade criminal e, quando for o caso, a culpabilidade e a pena'.
No que concerne à alegação de que o recurso é admissível, ao abrigo dos arts.
410º, nº 3, e 434º, ambos do CPP, não procede, uma vez que estas normas têm
como pressuposto a aceitação do recurso para este S.T.J., nos termos do art.
432º do CPP.
Quanto às nulidades do acórdão questionado invocadas pelo ora reclamante,
refere-se que, a existirem, deviam ter sido arguidas perante a Relação, como
resulta do art. 379º, nº 2, do CPP, atento o disposto no art. 668°, nº 3, do
CPC, aplicável ex vi do art. 4° daquele diploma.
A lei não desprotege assim o ora reclamante, quando o acórdão padece de alguma
nulidade, sendo a decisão irrecorrível, uma vez que lhe possibilita a sua
arguição perante o próprio tribunal que proferiu a decisão.
Não se pode entender que a simples invocação de nulidades de um acórdão que a
lei considera irrecorrível, transforme esse mesmo acórdão em decisão recorrível
para este Supremo Tribunal.
Em resumo: se o acórdão é recorrível, as nulidades devem ser arguidas no
recurso a interpor para o S. T.J.; se o acórdão é irrecorrível, as nulidades só
podem ser arguidas perante o próprio tribunal que proferiu a decisão.
Por último, tendo em conta que o princípio da tutela jurisdicional efectiva se
concretiza, em regra, através da instância única, só se impondo o direito ao
recurso em processo criminal, nos termos do nº 1 do art. 32º da CRP , e mesmo
aqui, reportado às garantias de defesa dos arguidos e não dos assistentes, como
expressamente se refere no texto do Acórdão do Tribunal Constitucional nº
168/93, de 28 de Março (DR, II Série, de 26.05.2003), recusa-se a
inconstitucionalidade assacada pelo reclamante ao art. 405º, nº 1 e 4, do CPP
(este número na parte em que considera definitiva a decisão do presidente do
tribunal superior quando confirma o despacho de indeferimento)”.
O assistente, em 6-12-2006, apresentou requerimento dirigido ao Presidente do
Supremo Tribunal de Justiça, arguindo a inexistência jurídica e a nulidade da
decisão de indeferimento da reclamação.
O Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em 14-12-06, proferiu decisão
de não conhecimento da invocada nulidade por falta de pronúncia e indeferiu o
restante requerido, com os seguintes fundamentos:
“No respeitante ao alegado vício da falta de competência orgânica por a
reclamação não ter sido decidida pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça,
nos termos do art. 405º, nº 1, do CPP, não colhe, por a apreciação e decisão das
reclamações pelos Vice-Presidentes ser exercida por coadjuvação atento o
disposto no art. 44º, nº 1, da Lei 3/99, de 13 de Janeiro, onde se refere: 'O
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça é coadjuvado por dois
vice-presidentes'.
Assim, tendo em conta que esta actividade é exercida por coadjuvação, os
Vice-Presidentes têm as mesmas competências que o Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça em tudo o que lhes for determinado (cf. provimento nº 9/2006, de 28
de Abril).
No respeitante à invocada nulidade por omissão de pronúncia dela não vamos tomar
conhecimento, uma vez que a competência do Presidente do Supremo Tribunal de
Justiça, quando aprecia as reclamações, nos termos do art. 405º do CPP, apenas
se cinge às questões da admissibilidade e da retenção do recurso.
Por último, quanto à arguida nulidade por falta de fundamentação da parte da
decisão que recusou a inconstitucionalidade imputada ao art. 405º, nº 1 e 4, do
CPP, também não procede.
Foi decidido que não se verificava a invocada inconstitucionalidade.
Com efeito, atento o disposto nos arts. 405º do CPP, 688º e 689º do CPC, o
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça exerce funções processuais na sua
qualidade de juiz como resulta do art. 43º, nº 1, alínea h), da Lei nº 3/99, de
13 de Janeiro.
Consequentemente, decidindo como juiz questões processuais cujo conhecimento lhe
seja deferido segundo a lei de processo exerce competências que são funcional e
materialmente jurisdicionais”.
Destas decisões do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e da proferida
em 27-5-2006 pelo Desembargador relator, recorreu o assistente para o Tribunal
Constitucional, ao abrigo do disposto no artº 70º, nº 1, b), da LTC, nos
seguintes termos:
“1. As normas aplicadas nos despachos impugnados, cuja inconstitucionalidade
pretende que o Tribunal Constitucional aprecie, são as seguintes:
1.1. A do artº 405°, n° 1, do Código de Processo Penal (CPP), cuja
inconstitucionalidade foi suscitada na Reclamação objecto do impugnado despacho
de 5.7.2006, nos termos dos seus nº 8 a 8.5, por violar as normas e os
princípios constitucionais dos artº 20°, nº 1 e 4, 110°, 111 ° e 202° da CRP;
1.2. A do artº 405°, n° 4, primeira parte, conjugada com a da segunda, do CPP,
cuja inconstitucionalidade foi suscitada na Reclamação objecto do impugnado
despacho de 5.7.2006, nos termos dos seus nº 9 a 9.3, e 10, por violar as normas
e os princípios dos artº 203° e 268°, n° 4, da CRP;
1.3. As dos artº 379°, n° 2, 400°, n° 1, alíneas c), d), e) e f), 410°, n° 3,
427°, 2ª parte, 432° e 434, do CPP, com o sentido com que foram aplicadas no
impugnado despacho de 5.7.2006, cuja inconstitucionalidade foi suscitada na
Reclamação que dele foi objecto, nos termos dos seus nº 2 a 6, por violar as
normas e os princípios dos artº 20°, n° 1 e 4, 202°, n° 2, e 268°, n° 4, da
CRP, cuja aplicação directa fere de inconstitucionalidade as daqueles artigos
por impedirem o acesso do recorrente ao tribunal - in casu o Tribunal da Comarca
de Lisboa, o único - legal e constitucionalmente competente para apreciar dos
factos ilícitos que são objecto do inquérito e da instrução;
1.4. As do artº 405°, nos 1 e 4, com o sentido com que foram aplicadas no
impugnado despacho de 14.12.2006, cuja inconstitucionalidade foi suscitada na
reclamação de 4.12.2006 (data do registo postal), objecto do despacho de
14.12.2006, por violar a norma do artº 205°, n° 1, da CRP.
2. Para substanciar a norma extraída do artº 405°, n° 1, do CPP, aplicada nos
impugnados despachos, requer-se a admissão nos autos de recurso, de certidão
emitida pelo STJ, em 30.9.2006, sobre o acto de delegação de poderes do
Presidente titular do mesmo órgão, no seu Vice Presidente, autor dos ditos
despachos”.
Notificado para esclarecer o sentido normativo dos preceitos cuja
inconstitucionalidade pretendia ver apreciada, o assistente apresentou
requerimento donde consta o seguinte:
“1. Relativamente ao artigo 405°, n° 1, do Código de Processo Penal (CPP), é o
do segmento que:
a) determina que a reclamação é dirigida ao presidente do tribunal a que o
recurso se dirige;
b) a reclamação dirigida ao presidente do tribunal a que o recurso se dirige
pode ser decidida por delegação de poderes do presidente nos vice presidentes
do mesmo tribunal;
c) a reclamação dirigida ao presidente o tribunal de recurso pode ser decidida
pelo vice presidente do mesmo tribunal por delegação de poderes do presidente
cessante.
2. Relativamente ao artigo 405°, n° 4, primeira parte, do CPP, é o do que a
decisão do:
a) presidente do tribunal superior é definitiva quando confirmar o despacho de
indeferimento;
b) vice presidente do tribunal superior é definitiva quando confirmar o despacho
de indeferimento;
c) vice presidente por delegação de poderes do presidente cessante é definitiva
quando confirmar o despacho de indeferimento.
3. Relativamente à dos artigos 379º, n° 2, 400°, n° 1, alíneas c), d), e f),
410º, n° 3, 427°, 2ª parte, 432° e 434° do CPP, conjugadamente interpretadas, é
o de que:
o acórdão da relação que deixa de pronunciar-se sobre a arguição de nulidade da
decisão do juiz de instrução, impugnada por haver deixado de pronunciar-se
sobre arguida incompetência territorial do tribunal recorrido prevista no artº
119°, alínea e), do CPP, para conhecer de crime a que seja aplicável pena
superior a cinco anos, é irrecorrível para o Supremo Tribunal de Justiça.
4. Relativamente às do artigo 405°, nos 1 e 4, do CPP, com o sentido aplicado no
despacho do Vice Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de 14.12.2006, os
sentidos impugnados são os de que:
a) a reclamação dirigida ao presidente do tribunal de recurso pode ser decidida
pelos vice presidentes do mesmo tribunal por determinação do presidente quando
exercida por coadjuvação;
b) a reclamação dirigida ao presidente do tribunal de recurso poder ser
decidida pelos vice presidentes do mesmo tribunal por determinação do
presidente que haja cessado funções, quando exercida por coadjuvação do novo
presidente;
c) a competência do presidente do tribunal de recurso, quando aprecia as
reclamações nos termos do artigo 405° do CPP, não compreende o conhecimento de
arguição de nulidade da decisão reclamada;
d) a decisão do presidente e dos vice presidentes do tribunal de recurso sobre
impugnação da constitucionalidade normativa não tem de ser fundamentada;
e) a qualidade profissional dos eleitos para a presidência do tribunal de
recurso lhes confere competência funcional e materialmente jurisdicionais”.
Notificado para alegar e para se pronunciar sobre o eventual não conhecimento
do recurso, o assistente apresentou requerimento em que defendeu o conhecimento
das questões por si suscitadas e apresentou alegações, com as seguintes
conclusões:
“1ª - Dá-se por deferida a rectificação do erro de escrita relativo à
identificação do despacho objecto de reclamação para o Presidente do STJ, e por
reproduzido o teor da resposta de 16 de Abril de 2007, ao despacho de 23.3.2007.
2ª - A questão central do recurso não admitido é a da nulidade insanável de que
enfermam todas as decisões proferidas nos autos de que promana o presente, por
incompetência territorial do Tribunal da Comarca do Porto para conhecer dos
crimes objecto do inquérito e da instrução, cominada no artigo 119º, alínea e),
do CPP, tempestivamente arguida, e recusa dos tribunais recorridos em
conhecerem da questão, e em deixarem que se cumpra o disposto no artigo 32º, nº
9, da Constituição.
3ª - Os factos em causa integram a previsão dos artigos 368º e 369º do Código
Penal, pelo que, a não ser removida a obstrução ao acesso ao tribunal
territorialmente competente e à pronúncia sobre tal pretensão, terá de ser feita
denúncia ao Procurador Geral da República.
4ª - A inconstitucionalidade da norma do artigo 405º, nº 1, foi suscitada na
reclamação para o Presidente do STJ, objecto de apreciação pelo Vice Presidente
por despacho de 20.11.2006, proferido por delegação de poderes já extinta,
tendo-a recusado explicitamente.
5ª - A norma do artigo 405º, nº 1, do CPP, foi designada pela Proposta de Lei
nº 103/II, de 20.5.1982, como verdadeira anomalia, por via de referência aos
artigos 688º do CPC, e 652º do CPP de 1929, cujo regime era conhecido como
queixa e carta testemunhável com origem nas Ordenações, e é, hoje, incompatível
com o princípio do Estado de direito democrático, e com a garantia de
independência e de sujeição dos tribunais à lei.
6ª - O exercício da função jurisdicional em conformidade com o disposto nos
artigos 2º, 202º, nºs 1 e 2, e 203º da Constituição, e nos termos aceites pela
doutrina e jurisprudência, designadamente desse Tribunal, justifica aquela
designação de verdadeira anomalia, relativamente à norma do nº 1 do artigo 405º
do CPP.
7ª - A falta da legitimidade do destinatário a que se refere o nº 1 do artigo
405º do CPP, por inobservância do disposto nos artºs 217º, nº 1, e 218º da
Constituição, justifica aquela designação.
8ª - A limitação temporal das funções do destinatário da reclamação a que se
refere o nº 1 do artigo 405º do CPP, em violação do disposto no artigo 216º, nº
1 da Constituição, justifica aquela designação.
9ª - A desconformidade da competência consagrada no nº 1 do artigo 405º do CPP,
com a dos artigos 110º, 111º e 202º, nº 3, da Constituição, justifica aquela
designação, por maioria de razão, quando a respectiva norma abrange delegação de
poderes em vice presidentes.
10ª - A norma do artigo 405º, nº 1, do CPP, não é compatível com as normas que
concretizam e integram as garantias dos artigos 20º, nºs 1 e 4, e 203º da
Constituição, consignadas na lei adjectiva, destinadas a assegurar a
imparcialidade do julgador, essenciais ao prestígio e dignidade dos tribunais e
da justiça, e à confiança dos cidadãos.
11ª - A norma do artigo 405º, nº 1, do CPP, não é compatível com a garantia
consignada no artigo 32º, nº 9, da Constituição, na sua concretização em todas
as instâncias a que a causa possa subir.
12ª - O exercício da função jurisdicional, nos termos constitucionalmente
consagrados, não é compatível com a delegação de poderes em vice presidentes
(operada in casu por despacho de 28.4.2006, documentada nos autos, erroneamente
designada de provimento); sendo as funções cometidas por leis orgânicas aos
presidentes dos tribunais, de natureza administrativa, a norma do nº 1 do artigo
405º do CPP, não é compatível com o disposto nos artigos 110º, nº 2, e 202º, nº
3, da Constituição.
13ª - A norma do artigo 405º, nº 1, do CPP, interpretada no sentido de que a
função jurisdicional pode ser exercida por entidades administrativas sem
delegação de poderes, infringe, por maioria de razão, o disposto na Constituição
e os princípios nela consignados já acima referenciados.
14ª - A inconstitucionalidade da norma do artigo 405º, nº 4, do CPP, foi
suscitada na reclamação para o Presidente do STJ, e sucessivamente reiterada nos
requerimentos subsequentes, tendo sido recusada no despacho de 20.11.2006.
15ª - Tal norma, na redacção antes consagrada no artigo 652º do CPP de 1929, foi
designada de verdadeira anomalia na Proposta de Lei nº 103/II, de 20.5.1982,
tendo sido proposta a sua substituição por recurso em conformidade com o
proposto para o artigo 689º do CPC, atenta sua incompatibilidade com a função
jurisdicional.
16ª - As decisões proferidas ao abrigo e nos termos da primeira parte do nº 4 do
artigo 405º do CPP, sendo orgânica e materialmente administrativas, são
recorríveis por força do disposto no artigo 268º, nº 4, da Constituição.
17ª - A natureza não jurisdicional dessas decisões é corroborada pela norma da
segunda parte do mesmo artigo; não basta que os actos sejam praticados por
juízes para que sejam jurisdicionais (cf. artigo 56º do EMJ); as decisões
proferidas nos termos da primeira parte do nº 4 do artigo 405º do CPP, não são
vinculativas para os tribunais recorridos tal como as da segunda parte não são
vinculativas para os tribunais de recurso.
18ª - As decisões previstas no nº 4 do artigo 405º do CPP, tal como as do nº 2
do artigo 689º do CPC, não são proferidas com observância de critérios legais
(cf. despacho de 5 de Julho de 2005, documentado nos autos).
l9ª - A inconstitucionalidade da norma do artigo 379º, nº 2, do CPP, foi arguida
na reclamação para o Presidente do STJ, por via da invocação da aplicação
directa das normas dos artºs 20º, nºs 1 e 4, 202º, nº 2, e 268º, nº 4, da
Constituição, e da qualificação dos factos ocorridos nos autos impeditivos do
acesso ao tribunal territorialmente competente, e de recusa em conhecer da
respectiva arguição, como integrantes da previsão dos artºs 368º e 369º do
Código Penal.
20º - No enunciado da norma do artigo 379º, nº 2, do CPP, constante do despacho
de 20.11.2006, segundo o qual este não está obrigado a
a) conhecer da existência de nulidade insanável reiteradamente arguida, como
fundamento para admissão do recurso,
b) qualificar tal arguição constante de requerimento dirigido ao tribunal a quo
como feita perante este,
c) qualificar tal recusa de conhecimento como denegação de justiça,
d) fazer aplicação directa das normas dos artigos 20º, nº 1 e 4, e 202º, nº 2,
da Constituição, determinando o conhecimento da mesma, pelo tribunal a quo ou
ordenando o recebimento do recurso,
infringe o disposto nesses preceitos.
21ª - A aplicação desta norma no despacho de 20.11.2006, demonstra, só por si,
que ele não é jurisdicional.
22ª - A arguição de inconstitucionalidade da norma do artigo 379º, nº 2, do CPP,
na dimensão aplicada no despacho de 20.11.2006, por via da pretensão de
aplicação directa das normas dos artigos 20º, nº 1 e 4, e 202º, nº 2, da
Constituição, em virtude de existência de nulidade insanável, cujo conhecimento
foi sucessivamente recusado, indiciante de favorecimento de arguidos e
denegação de justiça, envolve também as dos artigos 400º, nº 1, alínea c),
410º, nº 3, 425º, nº 4, e 434º do CPP, expressamente referidas na reclamação
para o Presidente do STJ. E envolve, também, implicitamente, as posteriormente
invocadas no mesmo despacho, com referência às alíneas d), e) e do nº 1, do
artigo 400º, e na 2ª parte do artigo 427º, do CPP, em virtude de a nulidade
insanável arguida e os ilícitos penais indiciados, imporem, só por si, a
admissão de recurso de qualquer das decisões previstas nesses preceitos legais,
por aplicação directa do disposto nos referenciados preceitos constitucionais.
23ª - São inconstitucionais as normas dos artigos 410º, nº 3, e 423º do CPP, com
o sentido aplicado no despacho de 20.11.2006, segundo o qual a existência de
uma nulidade insanável consubstanciada no impedimento absoluto ao exercício do
direito conferido pelo disposto nos artigos 20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9, e 202º,
nº 2, da Constituição, indiciante dos ilícitos dos artºs 368º e 369º do Código
Penal, não constitui fundamento bastante de admissão de recurso.
Termos em que se REQUER seja:
a) Declarada a inconstitucionalidade da norma do nº 1 do artigo 405º do CPP quer
na sua expressão literal quer na extensiva a vice presidente com ou sem
delegação de poderes do destinatário nela designado, por infringir o disposto na
Constituição e os princípios nela consignados, designadamente nos seus artigos
2º, 20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9, 110º, 111º, 202º, nºs 1, 2 e 4, 203º, 216º, nº 1,
217º, nº 1, e 268º, nº 4.
b) Declarada a inconstitucionalidade da norma da primeira parte do nº 4 do
artigo 405º do CPP, por maioria de razão quando a decisão nela prevista seja
proferida por vice presidente com ou sem delegação de poderes, por infringir o
disposto na Constituição e os princípios nela consignados, designadamente nos
seus artigos 20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9, 202º, nºs 1, 2 e 4, 203º e 268º, nº4.
c) Declarada a inconstitucionalidade da norma do nº 2 do artigo 379º, conjugada
com a do nº 4 do artigo 425º, ambos do CPP, interpretada com o sentido de a
arguição de nulidade insanável e de recusa reiterada dos tribunais em dela
conhecer não é fundamento de admissão de recurso nem de determinação para que o
tribunal a quo dela conheça, por infringir o disposto na Constituição e os
princípios nela consignados, designadamente nos seus artigos 20º, nºs 1 e 4,
32º, nº 9, 202º, nº 2, 268º, nº 4.
d) Declarada a inconstitucionalidade da norma da alínea c) do nº 1 do artigo
400º do CPP interpretada com o sentido de que não põe termo à causa o acórdão
que recusa conhecer de arguição de nulidade insanável por incompetência
territorial do tribunal recorrido, e impede, definitivamente, o cumprimento do
disposto no artigo 32º, nº 9, da Constituição, por infringir o disposto na
Constituição e os princípios nela consignados, designadamente nos seus artigos
20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9, 202º, nº 2, e 268º, nº 4.
e) Declarada a inconstitucionalidade das normas conjugadas dos artigos 379º, nº
2, 425º, nº 4. 410º, nº 3, e 423º do CPP, interpretadas com o sentido de que a
arguição de nulidade insanável cujo conhecimento foi reiteradamente recusado,
não é fundamento de admissão de recurso nem de determinação para que o tribunal
a quo dela conheça, por infringirem o disposto na Constituição e os princípios
nela consignados, designadamente nos seus artigos 20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9,
202º, nº 2, e 268º, nº 4.
f) Declarada a inconstitucionalidade das normas das alíneas d), e) e f) do nº 1
do artigo 400º do CPP, interpretadas com o sentido de que a arguição de nulidade
insanável cujo conhecimento foi reiteradamente recusado, não é fundamento de
admissão de recurso nem de determinação para que o tribunal a quo dela conheça,
por infringirem o disposto na Constituição e os princípios nela consignados,
designadamente nos seus artºs 20º, nºs 1 e 4, 32º, nº 9, 202º, nº 2, e 268º, nº
4.
g) Ordenado o recebimento do recurso interposto por requerimento de 17.4.2006, a
fls 1961-1982, certificado nos autos;
h) Seja cumprido o disposto no artigo 242º, nº 1, alínea b), do CPP, perante o
Procurador Geral da República relativamente aos factos integrantes dos autos
indiciantes dos ilícitos dos artºs 368º e 369º do Código Penal, que constituem
prosseguimento e tentativa de consolidação dos praticados no processo de que
eles promanam, nº 889/98. ITDLSB, “refém” do DIAP do Porto durante mais de cinco
anos”.
O Ministério Público apresentou contra-alegações, em que concluiu do seguinte
modo:
“Não é inconstitucional o regime de reclamação, vigente em processo penal, nos
termos dos nºs 1 e 4 do artigo 405º do Código de Processo Penal, ao atribuir a
um órgão jurisdicional – o Presidente do Tribunal Superior – a competir para
dirimir a questão de recorribilidade, considerando tal decisão definitiva quando
seja confirmada a rejeição do recurso, já decretada no Tribunal “a quo”.
Termos em que improcede manifestamente o presente recurso, relativamente às
questões suscitadas pelo reclamante no requerimento consubstanciador da
reclamação”.
*
1. Da participação ao Procurador Geral da República
O recorrente, no termo das suas alegações, requer que se participe ao Procurador
Geral da República “os factos integrantes dos autos indiciantes dos ilícitos dos
artºs 368º e 369º do Código Penal”.
Da análise dos autos não se constatam indícios da prática dos indicados ilícitos
criminais, pelo que não se justifica o exercício da pretendida denúncia, nos
termos do artº 242º, nº 1, b), do C.P.P., além de que o Ministério Público já
interveio no processo após este requerimento, tendo perfeito conhecimento da
tramitação dos presentes autos.
Assim, deve ser indeferida esta pretensão do recorrente.
2. Do objecto do recurso
2.1. Da irrecorribilidade para o Tribunal Constitucional da decisão do
Desembargador relator de 27-5-2006
O recorrente, além do mais, interpôs recurso do despacho proferido em 27-5-2006,
pelo Desembargador relator, que não admitiu o recurso por si interposto para o
S.T.J. de acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto.
Desta decisão reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que,
por despacho do Vice-Presidente indeferiu a reclamação.
Do exposto resulta que a decisão de não admissão de recurso pelo Desembargador
Relator não foi definitiva, uma vez que a mesma admitia reclamação, a qual foi
exercida e foi objecto de decisão.
Assim, atento o disposto nos nº 2 e 3, do artº 70º, da LTC, o recurso para o
Tribunal Constitucional da decisão reclamada não é admissível, devendo apenas
tomar-se conhecimento do recurso do despacho do Vice-Presidente do Supremo
Tribunal de Justiça que decidiu a reclamação.
2.2. Do âmbito do pedido formulado
Em primeiro lugar os poderes de cognição do Tribunal Constitucional estão
limitados pelo pedido formulado pelo recorrente no requerimento de recurso ou no
subsequente requerimento de correcção, podendo o âmbito desse pedido ser
restringido, mas não ampliado pelas conclusões das alegações de recurso.
Assim, tendo em consideração a enunciação das interpretações normativas que o
recorrente pretendia ver apreciadas constantes do requerimento de correcção e as
conclusões das respectivas alegações de recurso, são as seguintes as questões de
inconstitucionalidade que integram o pedido formulado pelo recorrente:
- Do artº 405º, nº 1, do C.P.P., quando atribui ao Presidente do tribunal a quem
o recurso se dirige competência para apreciar a reclamação do despacho do
tribunal recorrido que não admite o recurso interposto.
- Da interpretação normativa daquele artigo no sentido de permitir que essa
competência seja exercida por coadjuvação pelo Vice-Presidente do tribunal a
quem o recurso é dirigido.
- Da interpretação normativa daquele artigo no sentido de permitir que essa
competência seja exercida por coadjuvação pelo Vice-Presidente do tribunal a
quem o recurso é dirigido, por delegação de poderes do Presidente cessante.
- Do segmento do artº 405º, nº 4, do C.P.P., quando determina que a decisão que
confirma o despacho que não admite o recurso é definitiva.
- Da interpretação normativa dos artº 379º, nº 2, 400º, nº 1, alíneas c), d) e
f), 410º, nº 3, 427º, 2ª parte, 432º e 434º, do C.P.P., no sentido de que o
acórdão da Relação que deixa de pronunciar-se sobre a arguição de nulidade da
decisão do juiz de instrução impugnada, por haver deixado de pronunciar-se sobre
a arguida incompetência territorial do tribunal recorrido prevista no artº 119º,
e), do C.P.P., para conhecer de crime a que seja aplicável pena superior a cinco
anos, é irrecorrível para o S.T.J..
2.3. Do não conhecimento da questão da inconstitucionalidade da interpretação
normativa do artº 405º, nº 1, do C.P.P., no sentido de permitir que essa
competência seja exercida por coadjuvação pelo Vice-Presidente do tribunal a
quem o recurso é dirigido.
Sendo este um recurso interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo
70.º, da LTC, a sua admissibilidade depende da verificação cumulativa dos
requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada «durante
o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela
conhecer» (n.º 2, do artigo 72.º, da LTC), e de a decisão recorrida ter feito
aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de
inconstitucionais pelo recorrente. Aquele primeiro requisito (suscitação da
questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de
proferida a decisão impugnada) só se considera dispensável nas situações
especiais em que, por força de uma norma legal específica, o poder
jurisdicional se não esgota com a prolação da decisão recorrida, ou naquelas
situações, de todo excepcionais ou anómalas, em que o recorrente não dispôs de
oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes
de proferida a decisão recorrida ou em que, tendo essa oportunidade, não lhe
era exigível que suscitasse então a questão de constitucionalidade.
Se não era exigível ao recorrente que tivesse suscitado esta questão de
inconstitucionalidade antes da prolação da decisão da reclamação do despacho do
tribunal recorrido que não havia admitido o recurso, pois só com a sua
notificação pode verificar que ela tinha sido proferida pelo Vice-Presidente do
S.T.J., e não pelo seu Presidente, já quando, em requerimento posterior, veio
arguir a inexistência jurídica e nulidade dessa decisão, precisamente com o
fundamento de ter sido aquele e não este a proferi-la, teve oportunidade de
colocar a questão de inconstitucionalidade que agora pretende ver apreciada.
Não o fez, pelo que não se mostra cumprido o pressuposto da suscitação atempada
e adequada perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida da questão de
inconstitucionalidade.
Se, tem sido uniformemente entendido que, proferida a decisão final, a arguição
da sua nulidade não constitui já meio adequado de suscitar a questão de
inconstitucionalidade, pois a eventual aplicação de uma norma inconstitucional,
em regra, não é causa de nulidade da decisão judicial, quando é precisamente uma
interpretação normativa considerada inconstitucional que torna nula ou
inexistente a decisão proferida, a respectiva questão de inconstitucionalidade
deve ser colocada ao tribunal recorrido no requerimento de arguição da nulidade
que haja sido deduzido, de modo a dar-lhe oportunidade de sobre ela se
pronunciar.
Não se mostrando cumprido o pressuposto da suscitação atempada perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida desta questão não pode o Tribunal
Constitucional apreciá-la.
2.4. Do não conhecimento da questão da inconstitucionalidade da interpretação
normativa do artº 405º, nº 1, do C.P.P., no sentido de permitir que essa
competência seja exercida por coadjuvação pelo Vice-Presidente do tribunal a
quem o recurso é dirigido, por delegação de poderes do Presidente cessante.
Esta questão também não foi suscitada pelo recorrente no requerimento em que
veio arguir a inexistência e nulidade da decisão de indeferimento da reclamação
de despacho de não admissão de recurso, proferido pelo Vice-Presidente do
S.T.J..
Assim, exactamente pelas mesmas razões pelas quais o Tribunal Constitucional
declarou não poder conhecer da questão anteriormente referida, também não pode
conhecer desta questão.
2.5. Do não conhecimento da questão da inconstitucionalidade do artº 405º, nº 4,
do C.P.P., no segmento em que determina que a decisão que confirma o despacho
que não admite o recurso é definitiva.
Conforme já acima referimos um dos pressupostos de conhecimento do recurso para
o Tribunal Constitucional é que a decisão recorrida tenha feito aplicação, como
sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais
pelo recorrente.
Ora, apesar da decisão recorrida, proferida em 20-11-2006, ter declarado que
recusava a inconstitucionalidade do artº 405º, nº 4, do C.P.P., na parte em que
considera definitiva a decisão do tribunal superior quando confirma o despacho
de indeferimento, não o fez como sua ratio decidendi.
Na verdade, ela apenas o disse porque o recorrente colocou essa questão na
reclamação que lhe dirigiu, mas tal declaração não constitui, obviamente, um
fundamento da decisão de indeferimento proferida, mas sim uma declaração sobre
os seus próprios efeitos, sem qualquer valor. Trata-se, pois, de um simples
obiter dictum.
Tal declaração só poderia ser fundamento duma posterior decisão que não
admitisse uma impugnação daquela e nunca fundamento da própria decisão cuja
irrecorribilidade se enuncia.
Não integrando a referência à constitucionalidade do aludido segmento do artº
405º, nº 4, do C.P.P., a ratio decidendi da decisão recorrida, não é possível o
conhecimento da respectiva questão.
2.6. Da questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa dos artº
379º, nº 2, 400º, nº 1, alíneas c), d) e f), 410º, nº 3, 427º, 2ª parte, 432º e
434º, do C.P.P., no sentido de que o acórdão da Relação que deixa de
pronunciar-se sobre a arguição de nulidade da decisão do juiz de instrução
impugnada, por haver deixado de pronunciar-se sobre a arguida incompetência
territorial do tribunal recorrido prevista no artº 119º, e), do C.P.P., para
conhecer de crime a que seja aplicável pena superior a cinco anos, é
irrecorrível para o S.T.J..
Como acima referimos, sendo este um recurso interposto ao abrigo da alínea b),
do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC a sua admissibilidade depende da verificação
do requisito das questões de inconstitucionalidade terem sido suscitadas
«durante o processo», «de modo processualmente adequado perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela
conhecer» (n.º 2, do artigo 72.º, da LTC).
Assim, esta questão deveria ter sido suscitada na reclamação dirigida ao
Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, de modo a que este pudesse tê-la
apreciado no despacho que decidiu a reclamação.
Nessa peça processual o recorrente sobre esta questão de inconstitucionalidade
limitou-se a alegar o seguinte:
“Estando em causa, entre outras, uma nulidade insanável – a incompetência
territorial do Tribunal da Comarca do Porto – cominada na alínea e), do artº
119º, do CPP, sobre a qual não houve, até hoje, pronúncia jurisdicional, a
recorribilidade da decisão que recusa tal pronúncia impõe-se sob pena de
denegação de justiça proibida pelas normas dos artº 20º, nº 1 e 4, 202º, nº 2,
da Constituição (CRP) e pelos princípios consignados no seu artº 2º”.
Verifica-se que a questão que o recorrente pretende agora ver apreciada não foi
minimamente enunciada na reclamação apresentada, não tendo sido indicadas as
normas interpretadas, nem precisada a interpretação agora arguida de
inconstitucional, pelo que não foi dada oportunidade ao tribunal recorrido para
se pronunciar sobre ela.
Daí que não conste da fundamentação do despacho recorrido a abordagem desta
questão.
Assim, não se mostrando cumprido o pressuposto da suscitação atempada perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida desta questão não pode o Tribunal
Constitucional apreciá-la.
3. Do mérito do recurso
3.1. Da questão da inconstitucionalidade do disposto no artº 405º, nº 1, do
C.P.P.
O recorrente alega que esta disposição processual viola o disposto nos artº 20º,
nº 1 e 4, 110º, 111º e 202º, da C.R.P., por não se encontrar assegurado que a
reclamação da decisão que não admite o recurso para um tribunal superior seja
apreciada por um órgão jurisdicional.
Dispõe o artº 405º, nº 1, do C.P.P.:
“Do despacho que não admitir ou que retiver o recurso, o recorrente pode
reclamar para o presidente do tribunal a que o recurso se dirige”.
Esta é a solução para o conhecimento da impugnação das decisões dos tribunais
recorridos que não admitem recurso interposto, que tem vindo a ser adoptada,
desde há muito, no nosso sistema processual penal e civil. E se alguns a reputam
de anómala, por fugir ao esquema comum dos recursos, tendo inclusive, em tempos,
sido pensado no domínio do processo civil, pôr termo a tal solução, isso não
significa que a mesma viole qualquer preceito constitucional.
O artº 202º, nº 1, da C.R.P., atribui aos tribunais, enquanto órgão de
soberania, a competência para o exercício da função jurisdicional, sendo os
juízes os titulares desse órgão.
Os juízes presidentes dos tribunais superiores são, antes de mais, juízes,
recrutados e nomeados nos termos prescritos no artigo 215º da Constituição, e,
quando exercem funções de presidentes dos tribunais superiores, têm o seu leque
de competências definido nos artigos 43º e 59,º da Lei nº 3/99, de 13 de
Janeiro, sendo umas de natureza jurisdicional e outras de índole administrativa.
Além das competências que constam expressamente destes preceitos, compete ainda
aos presidentes dos tribunais superiores 'exercer as demais funções conferidas
por lei' (cf, artigo 43º nº 1, alínea f), e 59º, da Lei 3/99, de 13 de Janeiro),
como é o caso da norma do artigo 405º do Código de Processo Penal, enquanto lhes
atribui competência para decidir as reclamações dos despachos de não admissão ou
retenção de recursos.
Ora, quando o presidente do tribunal superior se pronuncia sobre a reclamação de
um despacho que não admitiu ou reteve um recurso proveniente de um tribunal de
hierarquia inferior está a dirimir um conflito, apreciando a decisão reclamada
que é contrária à pretensão do reclamante e, nessa medida, actua no exercício de
funções jurisdicionais. E, tanto assim é que a Lei nº 28/82, de 15 de Novembro
(Lei do Tribunal Constitucional), faz equiparar a recursos ordinários as
reclamações para os presidentes dos tribunais superiores, nos casos de não
admissão ou de retenção de recursos, para efeitos de considerar verificado o
requisito da exaustão dos recursos ordinários, que é condição da admissibilidade
do recurso de constitucionalidade.
Assim, apesar dos presidentes dos tribunais superiores serem eleitos pelos seus
pares para estes cargos, por tempo determinado, não perdem a qualidade de juízes
em efectividade de funções, aos quais pode a lei continuar a atribuir as funções
jurisdicionais que entenda justificarem-se.
Igualmente, se a regra nos tribunais superiores é a decisão colegial, sem que
isso obedeça a qualquer imposição constitucional, nada impede que o legislador
ordinário para determinadas decisões opte, por razões de celeridade, pela
decisão singular, como sucede no presente caso
O julgamento das reclamações em análise não é efectuado pelos presidentes dos
tribunais de recurso no uso das suas competências administrativas, que também
possuem, mas sim no uso das suas competências jurisdicionais, os quais, sendo
juízes, não as perdem pelo facto de serem eleitos para o cargo de Presidente de
tribunal de recurso.
Deste modo, o artº 405º, nº 1, do C.P., ao atribuir aos presidentes dos
tribunais de recurso competência para apreciar as reclamações dos despachos do
tribunal recorrido que não admitem ou retenham um recurso interposto, não viola
qualquer preceito constitucional, nomeadamente o que atribui aos tribunais a
competência para exercer funções jurisdicionais (artº 202º, nº 1, da C.R.P.).
Por estas razões deve ser julgado improcedente o recurso interposto,
relativamente a esta questão.
*
Decisão
Pelo exposto:
a) indefere-se o pedido de participação criminal ao Senhor Procurador Geral da
República deduzido pelo recorrente;
b) não se conhece do recurso interposto na parte em que o mesmo tem por objecto
a decisão do Desembargador relator de 27-5-2006;
c) julga-se improcedente o recurso interposto quanto à questão da
inconstitucionalidade do artº 405º, nº 1, do C.P.P.;
d) não se conhece do recurso quanto às demais questões de inconstitucionalidade
colocadas pelo recorrente.
*
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 25 unidades de conta
(artº 6º, nº 1, do D.L. nº 303/98).
*
Lisboa, 12 de Junho de 2007
João Cura Mariano
Mário José de Araújo Torres
Benjamim Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos