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Processo n.º 150/07
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL
1. Notificada da decisão pela qual se decidiu, de forma sumária, não
conhecer de uma parte e julgar improcedente a restante parte do recurso
interposto para este Tribunal, a Câmara Municipal do Marco de Canaveses vem
reclamar ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 669º do Código de Processo
Civil, pedindo a reforma da decisão na parte em que estipula a sua condenação em
custas, por entender estar delas isenta.
Alega:
1- A decisão sumária condenou a Recorrente Câmara Municipal do Marco de
Canaveses em custas.
Mas, salvo o devido respeito, que é muito, a decisão é errada.
2- Dispõe o art. 2º do DL nº 303/98, de 7 de Outubro, diploma que versa sobre o
regime de custas no Tribunal Constitucional, que “Estão sujeitos a custas os
recursos e as reclamações no Tribunal Constitucional previstos nos n.ºs 2 a 4 do
artigo 84º da Lei nº28/82, de 15 de Novembro”.
Por sua vez, preceitua o art. 3º, nº 1, do mesmo diploma que “O regime de custas
a que se refere o artigo anterior é o estabelecido para custas cíveis no Código
das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei nº 224-A/96, de 26 de Novembro,
e respectiva legislação complementar, com as necessárias adaptações e
ressalvadas as disposições do presente diploma”.
E o artº 4º, nº1, estabelece que “É aplicável, quanto à isenção de custas no
Tribunal Constitucional, o disposto no art. 2º do Código das Custas Judiciais”.
3- Ora, o art. 2º, nº 1, alínea e) do Código das Custas Judiciais, antes da
redacção introduzida pelo DL nº 324/2003, de 27 de Dezembro, estabelecia que
“Sem prejuízo do disposto em lei especial, são unicamente isentos de custas:
e)- as Autarquias locais e as associações e federações de municípios”.
4- Com a entrada em vigor do Código de Processo nos Tribunais Administrativos
(CPTA), aprovado pela Lei nº 13/2002, de 22 de Fevereiro, na redacção da Lei nº
4 A/2003, de 19 de Fevereiro, o Estado e as entidades públicas passaram a estar
sujeitas ao pagamento de custas, sendo o regime de custas na jurisdição
administrativa e fiscal objecto de regulação própria no Código das Custas
Judiciais - cf. art.189º.
5- Assim é que, por um lado, os artigos 73º-A a 73º- F do Código das Custas
Judiciais, na redacção do DL nº nº 324/2003, passaram a contemplar um regime
especial de custas na jurisdição administrativa e fiscal, e, por outro, o mesmo
diploma eliminou a isenção prevista na alínea e) do nº 1 do art. 2º.
6- Só que o artº 5º, nº 1, da Lei nº 13/2002, na redacção da Lei nº 4-A/2003,
preceitua que As disposições do Código de Processo nos Tribunais Administrativos
não se aplicam nos processos que se encontrem pendentes à data da sua entrada em
vigor”.
7- Ora, o presente processo foi instaurado antes da entrada em vigor do CPTA, no
então Tribunal Administrativo de Círculo do Porto, onde tomou o nº 1340/03.
8- Daqui decorre que ao presente processo não são aplicáveis nem o disposto no
art. 2º nem os artigos 73-A a 73-F, todos do CCJ, na redacção do DL nº 324/2003,
uma vez que a fonte destes preceitos é o disposto no art. 189º do CPTA, o qual
não é aplicável aos processos instaurados antes da sua entrada em vigor, por
força do citado art. 5º, nº 1, da Lei 13/2002, na redacção da Lei nº 4- A/2003.
Em relação aos processos pendentes à data da entrada em vigor do CPTA, continua
aplicável o disposto no art. 2º do CCJ, na redacção anterior ao DL nº 324/2003,
de 27 de Dezembro.
O que significa que a Câmara Municipal do Marco de Canaveses continua a
beneficiar da isenção de custas no presente processo.
Nestes termos, e nos melhores de direito, deve a douta DECISÃO SUMÁRIA ser
reformada, ao abrigo do preceituado no art. 669º, nº 1, alínea b), do Código de
Processo Civil, declarando-se que a Recorrente está isenta de custas.
Por sua vez, o representante do Ministério Público neste Tribunal é da seguinte
opinião:
O representante do Ministério Público junto deste Tribunal, notificado do pedido
de reforma, deduzido quanto à condenação em custas pela recorrente, no processo
em epígrafe, vem responder-lhe nos termos seguintes:
1º – Aos recursos de constitucionalidade são exclusivamente aplicáveis as normas
do Código das Custas Judiciais, atinentes às custas cíveis, incluindo as
“isenções subjectivas”, previstas no artigo 2º de tal Código.
2º – Radicando a pretendida isenção da autarquia/recorrente na redacção de tal
norma anterior às alterações introduzidas pelo Decreto-Lei nº 324/03, de 27/12 —
e só sendo estas de aplicar aos processos instaurados após a sua entrada em
vigor, nos termos do artigo 14º, nº 1, de tal diploma legal, — a única questão
que se impõe dirimir é se deverá considerar-se relevante, para este efeito, a
data em que se iniciou o processo-base, no contencioso administrativo
(15/12/03), ou se, pelo contrário, se deverá — atentar no momento em que foi
interposto recurso para este Tribunal Constitucional (25/10/06).
3º – Afigurando-se que – salvo melhor opinião – deverá relevar a data em que se
iniciou o processo em que se inseriu o recurso de fiscalização concreta,
dirimido pelo Tribunal Constitucional – o que determinaria a vigência da isenção
subjectiva, outorgada às autarquias locais pela precedente redacção do artigo 2º
do Código das Custas Judiciais, anterior à que emerge do citado Decreto-Lei nº
324/03.
2. O regime de custas no Tribunal Constitucional está definido no
artigo 84º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro),
regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 303/98 de 7 de Outubro; em linhas gerais,
estão sujeitos a custas os recursos e as reclamações previstos nos n.ºs 2 a 4 do
artigo 84º da LTC.
Quanto a isenções, o n.º 1 do artigo 4º do aludido Decreto-lei 303/98 de 7 de
Outubro determina que é 'aplicável, quanto à isenção de custas no Tribunal
Constitucional, o disposto no artigo 2º do Código das Custas Judiciais'; na data
em que entrou em vigor o aludido Decreto-lei 303/98 de 7 de Outubro, este artigo
2º do Código das Custas Judiciais conferia genericamente ao Estado e demais
pessoas colectivas públicas, incluindo as autarquias locais, total isenção de
custas. Todavia, o regime alterou-se por força da nova redacção dada ao preceito
pelo artigo 1º do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de Dezembro: aquelas entidades
públicas deixaram de beneficiar da isenção de custas de que gozavam até então.
Paralelamente, o Código das Custas Judiciais passou a incluir um Título II a
disciplinar, com especialidade, as custas nos processos administrativos e
tributários.
Este novo regime não produziu, todavia, efeitos imediatos.
É que, nos termos do n.º 1 do artigo 15º do dito Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27
de Dezembro, 'as disposições do presente diploma que contenham normas sobre
custas administrativas, bem como as alterações relativas a isenções subjectivas
de custas, apenas produzem efeitos a partir da entrada em vigor do Código de
Processo nos Tribunais Administrativos', o que acabou por acontecer em 1 de
Janeiro de 2004 (artigo 7º da Lei n.º 15/2002 de 22 de Fevereiro, na versão da
Lei n.º 4-A/2003 de 19 de Fevereiro). Para além disto, o n.º 1 do artigo 14º do
já referido Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de Dezembro estipulou que 'as
alterações ao Código das Custas Judiciais constantes deste diploma só se aplicam
aos processos instaurados após a sua entrada em vigor', o que também aconteceu
em 1 de Janeiro de 2004, por força do n.º 1 do artigo 16º.
Deste quadro legal resulta, em suma, que a genérica isenção de custas de que
gozavam as entidades públicas terminou em 1 de Janeiro de 2004, mantendo-se,
excepcionalmente, quanto aos processos instaurados antes desta data.
Aplicando estas regras ao caso concreto, caberá apurar se, no momento em que
devem ser fixadas as custas no processo, nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 84º
da LTC (e artigo 2º do Decreto-Lei n.º 303/98 de 7 de Outubro), se mantém a
isenção de custas de que beneficiavam as entidades autárquicas. Na verdade,
continuando a lei de custas do Tribunal Constitucional, a 'receber' a norma do
artigo 2º do Código das Custas Judiciais, aquela decisão deve respeitar a norma
que vigorar no momento da sua concreta aplicação.
O processo em causa foi instaurado na data em que deu entrada no Tribunal
Administrativo de Círculo do Porto a petição subscrita pelo Magistrado do
Ministério Público, o que aconteceu em 15 de Dezembro de 2003; é, por isso, um
dos casos excepcionados pela regra o n.º 1 do artigo 14º do já referido
Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de Dezembro, ao estipular que 'as alterações ao
Código das Custas Judiciais constantes deste diploma só se aplicam aos processos
instaurados após a sua entrada em vigor', ou seja, depois de 1 de Janeiro de
2004.
3. Deve, pois, conclui-se que a Câmara Municipal do Marco de
Canaveses está isenta do pagamento de custas neste processo, instaurado em 15 de
Dezembro de 2003.
Em consequência, procede a reclamação, pelo que se decide reformar quanto a
custas a decisão sumária reclamada.
Sem custas.
Lisboa, 15 de Junho de 2007
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão