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Processo n.º 624/07
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. A. pretendeu recorrer ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo
70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro do acórdão da Relação de Lisboa proferido
em 1 de Fevereiro pelo qual foi confirmado o despacho de não pronúncia emitido
pelo juiz de instrução do 1º Juízo Criminal da Funchal no processo em que o dito
recorrente é assistente.
Apresentara, para esse efeito, o seguinte requerimento:
A., assistente e recorrente nos autos à margem indicados, notificado do despacho
de V.ª Ex.ª que não admitiu o recurso que fora interposto para o Supremo
Tribunal de Justiça do Acórdão deste Tribunal da Relação de Lisboa que confirmou
a não pronúncia dos arguidos, vem do mesmo Acórdão interpor, ao abrigo do
disposto no nº 2 do art. 75º da Lei nº 28/82, recurso para o Tribunal
Constitucional, restrito às questões de inconstitucionalidade oportunamente
suscitadas.
O presente recurso é interposto ao abrigo da al. b) do nº 1 do art. 70º da LOTC
e as normas cuja inconstitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional
aprecie são as dos art. 180º, nº 1 e 184º do Código Penal, as quais,
interpretadas e aplicadas como o foram na decisão recorrida, violam, nessa
concreta vertente normativa, os preceitos e princípios dos art. 25º, nº 1, 26º,
nº 1 e 13º da CRP.
Tal inconstitucionalidade foi logo arguida no requerimento de abertura de
instrução apresentada nos mesmos autos e reconfirmada nas alegações de recurso,
e respectivas conclusões, interposto do despacho de não pronúncia para a 2ª
instância.
Este pedido foi objecto do seguinte despacho:
O assistente A. vem, através do requerimento de fls. 542 a 543, de 28.03.2007
após prolação de acórdão neste Tribunal da Relação de Lisboa publicado em
01.02.2007 (fls. 501), interpor recurso para o Tribunal Constitucional do mesmo
acórdão, ao abrigo da al. b), do n.º 1, do art. 70º da LOTC.
Salvo o devido respeito, o recurso sub judice não pode ser
admitido — por um lado, porque na indicada peça processual o recorrente não
suscita qualquer inconstitucionalidade normativa, limitando-se a afirmar “que as
normas cuja constitucionalidade se pretende que o Tribunal Constitucional
aprecie são as dos artigos 180º n.º 1 e 184º do Código Penal”, que violam “os
preceitos e princípios dos artigos 25º n.º 1, 26º n.º1, 113º da CRP” e que tal
“fora logo arguido no requerimento de abertura de instrução”; — por outro,
porque o assistente interpôs o recurso de inconstitucionalidade fora do prazo
legal (e indicado no n.º1, do art. 75º da LTC), para lá do período em que o
poderia, ainda, fazer se pagasse a multa correspondente — cf. fls. e CPP artigo
113º, n.º2 e Lei n.º 3/99 de 3.1, artigo 12º.
Nestes termos, e pelo exposto, não se admite o recurso
interposto pelo assistente A. para o Tribunal Constitucional.
É contra este despacho que o recorrente apresenta a reclamação ora em análise,
dizendo:
A., recorrente nos autos à margem indicados, notificado do despacho de fls. 549
pelo qual se não admite o recurso por ele oportunamente interposto para o
Tribunal Constitucional do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa
em 1/2/07 e notificado em 5/2/07, vem do mesmo apresentar a competente
reclamação para V.ª Ex.ª, o que faz nos termos do art. 76º, nº 4 da LTC e com os
fundamentos seguintes:
1º
Refere-se no despacho reclamado, e como razões para a não admissão do recurso, o
facto de o recorrente alegadamente não suscitar qualquer inconstitucionalidade
normativa e de, também alegadamente, ter interposto o recurso de
inconstitucionalidade fora do prazo legal indicado no nº 1 do art. 75º da LTC.
Ora,
2º
E salvo o devido respeito por opinião contrária, os referidos dois fundamentos
não têm o menor vislumbre de apoio legal. Assim,
3º
Importará desde logo ter presente o seguinte:
a) O Acórdão em causa (confirmando a decisão de não pronúncia proferida na 1ª
instância) foi notificado em 5/2/07;
b) Em 15/2/07, o ora reclamante interpôs recurso do referido Acórdão, com a
respectiva motivação, por entender (nos termos aliás explanados na própria
motivação) que, ao invés do que viria a ser considerado, dele caberia recurso
para a 3ª instância;
c) Em 12/3/07 foi, porém, notificado ao ora reclamante o despacho sufragando
precisamente o entendimento (incorrecto, na opinião do mesmo reclamante) de que
tal Acórdão da Relação não seria afinal susceptível de recurso para o STJ;
d) Em 28/3/07 o ora reclamante apresentou em Juízo o seu requerimento de
interposição de recurso para o Tribunal Constitucional do já diversas vezes
citado Acórdão do Tribunal da Relação de 1/2/07,
e) Sendo que o trânsito em julgado da decisão referida em c) ocorreu e 27/3/07
(já que o 10º dia do prazo seria 22/3 e o 3º dia de pagamento com multa seria o
de 27/3). Ora,
4º
Dispõe efectivamente o art. 75º, nº 1 da LTC que o prazo de interposição de
recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias. Mas,
5º
Dispõe também o nº 2 do mesmíssimo art. 75º que interposto recurso ordinário
(aqui do Acórdão da 2ª instância), mesmo que para uniformização de
jurisprudência, que não seja admitido — como aqui efectivamente foi — com
fundamento em irrecorribilidade (in casu, para o STJ) da referida decisão, “o
prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional conta-se do momento em que se
torna definitiva a decisão que não admite o recurso” (a qual, no caso sub judice
e conforme resulta do acima exposto, se tornou definitiva em 27/3/07). Ou seja,
6º
Exactamente ao invés do insolitamente sustentado no despacho ora reclamado, o
recurso para o Tribunal Constitucional mostra-se interposto mais do que
tempestivamente, porquanto no 1º dia (28/3) em que o respectivo prazo de
interposição começou a correr. Por outro lado,
7º
E como se isto não bastasse, acontece que aquilo que o art. 75º-A da LTC exige é
que o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional
contenha a indicação de:
a) A alínea do nº 1 do art. 70º ao abrigo da qual o recurso é interposto e a
norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal
aprecie (nº1);
b) A indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considera
violado bem como a peça processual em que o recorrente suscitou a questão da
inconstitucionalidade (nº 2). Ora,
8º
Basta atentar no requerimento de interposição do recurso entregue em Juízo em
28/3/07, para se constatar que todos, sem excepção, esses elementos estão lá
indicados, e com inteira suficiência,
9º
Sendo ainda certo que se por hipótese académica não o estivessem, aquilo que o
julgador poderia fazer era convidar o requerente a prestar essa indicação no
prazo de 10 dias (nº 5), e jamais de imediato indeferir ou não admitir o
recurso.
10º
Não tem, pois, o despacho reclamado qualquer razão, sendo certo que a
suficiência ou insuficiência da argumentação em sede de verificação, ou não, da
aduzida inconstitucionalidade é algo para explanar nas alegações de recurso — as
quais são SEMPRE produzidas no Tribunal Constitucional (art. 79º, nº 1 da LTC) —
e para apreciar em sede do Tribunal Constitucional, e nunca no e pelo Tribunal a
quo.
11º
Sendo assim totalmente desprovida de qualquer fundamento quer fáctico quer legal
deve a decisão ora reclamada ser inteiramente revogada, e substituída por outra
que ordene a admissão do recurso e consequente remessa dos autos a este Tribunal
Constitucional.
O representante do Ministério Público neste Tribunal emitiu a seguinte opinião:
Pelas razões que constam da reclamação apresentada, afigura-se-me que a mesma
merece deferimento.
2. Cumpre decidir.
Conforme resulta do antecedente relatório, o recurso não foi recebido, na
Relação de Lisboa, por dois motivos: não só o respectivo requerimento era
intempestivo, como, além disso, nele não teria sido suscitada 'qualquer
inconstitucionalidade normativa'.
Ora, independentemente da questão de saber se o requerimento é intempestivo, o
certo é que o recorrente não deu cumprimento a um pressuposto essencial do
recurso disciplinado pela alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, pois não
identificou a norma ou normas impugnadas, questão que deve ser aqui abordada por
força do disposto no n.º 4 do artigo 77º da LTC, e se prende, de alguma maneira,
com o segundo fundamento invocado na decisão reclamada para não admitir o
recurso.
Na verdade, a mera referência a normas 'dos artigos 180º nº 1 e 184º do Código
Penal, as quais, interpretadas e aplicadas como o foram na decisão recorrida,
violam, nessa concreta vertente normativa, os preceitos e princípios dos artigos
25º, nº 1, 26º, nº 1 e 13º da CRP' não define o objecto do recurso, pois fica
sem se saber qual a concreta dimensão normativa que o Tribunal recorrido aplicou
e que o recorrente pretende impugnar.
Ora, não cabendo ao Tribunal proceder oficiosamente à delimitação do âmbito do
recurso, e não sendo já possível obter do recorrente, por via do n.º 5 do artigo
75º-A da LTC, a regularização desta omissão (ver, neste sentido, o Acórdão n.º
450/2004, em www.tribunalconstitucional.pt), por inverificação deste requisito
nunca poderia o recurso ser recebido, o que é suficiente para determinar o
insucesso da reclamação.
3. Nestes termos, decide-se indeferir a reclamação, mantendo o
despacho que não recebeu o recurso interposto.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 27 de Junho de 2007
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria João Antunes
Gil Galvão