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Processo n.º 31/11
1ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam, em conferência, na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A fls. 1817 foi proferida nestes autos a Decisão Sumária n.º 47/2011 do seguinte teor:
«Nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei do Tribunal Constitucional, decide-se:
1. Notificada do acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça em 16 de Novembro de 2010, A. recorre para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro), pretendendo ver apreciada:
[...] a inconstitucionalidade/ilegalidade da interpretação que foi conferida ao n.º 1 do art. 88.º do C.I.R.E., pois que, no modesto entender da aqui Recorrente, tal interpretação é claramente contrária à nossa Constituição e aos princípios nela consagrados, tal qual melhor alegado em sede de motivação (e conclusões) de recurso para o Insigne Supremo Tribunal de Justiça.
Com efeito, ao ter considerado aquele Insigne Supremo Tribunal de Justiça que «(…) a segunda parte do nº 1 do artigo 88.º do C.I.R.E. deve merecer uma interpretação declarativa restrita ou limitada no sentido atrás referido, de modo que a expressão “qualquer acção executiva”, se refere, apenas, às execuções que de alguma forma atinjam ou interfiram com os bens que devem integrar a massa insolvente (...)», violou a letra e o espírito da disposição legal em causa, seja, do art. 88.º do C.I.R.E., contrariando assim, e por referência ao artigo 62.º da C.R.P., tal preceito constitucional. [...]
2. Nos termos da referida alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o presente recurso cabe das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, só podendo ser interpostos «pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade» de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida.
Acontece que a recorrente nunca colocou perante o Supremo Tribunal de Justiça qualquer questão de inconstitucionalidade da norma impugnada. Assim, se o tipo de recurso interposto não permite avaliar a ilegalidade da norma impugnada, o certo é que se apura que a recorrente não tem legitimidade para impugnar neste recurso a inconstitucionalidade da mesma norma, pois nunca colocou essa questão ao tribunal recorrido.
3. Decide-se, por isso, não conhecer do objecto do recurso. (...)»
2. Inconformada, a recorrente A. reclama nos seguintes termos:
1. Sempre com o devido e muito respeito, permite-se a Reclamante discordar com o entendimento explanado pelo Exmo. Senhor Juiz Conselheiro Relator onde procura justificar a inadmissibilidade do recurso interposto pela Recorrente arguido, aqui Reclamante, para este Egrégio Tribunal Constitucional, decidindo pelo não conhecimento do mesmo.
2. Ora, salvo melhor opinião e com todo o devido respeito, entende a Reclamante que tal decisão se mostra indevidamente ajuizada, na medida em que, decide, não tomar conhecimento do recurso interposto porquanto «(...) a recorrente não tem legitimidade para impugnar neste recurso a inconstitucionalidade da mesma norma, pois nunca colocou essa questão ao tribunal recorrido.».
3. No entanto, no que se refere a esse recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 70.º da L.T.C., discorda a aqui Reclamante do entendimento sufragado na douta decisão sumária em apreço. Isto porque,
4. Efectivamente, foi a questão da inconstitucionalidade/ilegalidade da interpretação conferida ao n.º 1 do art. 88º do C.I.R.E. suscitada perante o Supremo Tribunal de Justiça, sendo que, ao invés de devido, de modo algum aquele Supremo Tribunal de Justiça se debruçou sobre tal questão, nada tendo decidido quanto a alegada inconstitucionalidade/ilegalidade de uma tal norma.
5. Pelo que, modestamente se entende que a considerar-se um qualquer vício quanto ao preenchimento dos requisitos do aludido 75.º.A, ns.º 1 e 2, sempre o mesmo seria de ter como um mero vício formal, em nada afectando a bondade e/ou validade do recurso interposto.
6. Manifestando-se, por isso, uma vez mais, e sempre com o devido e merecido respeito, discordância com o decidido, devendo, também aqui, conhecer-se do objecto do recurso.
Termos em que, sopesados os argumentos acabados de aduzir, vem a aqui Reclamante, requerer a Vs. Exas. se dignem revogar a douta decisão sumária proferida pelo Exmo. Juiz Conselheiro Relator, devendo, nessa sequência, tomar-se conhecimento do objecto do recurso por si interposto para este Egrégio Tribunal Constitucional.
3. À reclamação responde o recorrido B., dizendo:
1. Não se conformando com a decisão sumária proferido pelo Ex.mo Juiz Conselheiro Relator vem a Recorrente reclamar para conferência.
2. Aliás, não tem a Recorrente pejo em utilizar todos os expedientes dilatórios ao seu alcance para evitar a execução da sentença proferida nos autos que dão origem à presente reclamação.
3. No entanto, tal reclamação mostra-se totalmente desprovida de fundamento como se demonstrará.
Vejamos:
4. Efectivamente para que a Recorrente tivesse legitimidade para apresentar o recurso ora em crise teria que ter levantado a questão da inconstitucionalidade junto do Supremo Tribunal de Justiça,
5. O que, ao contrário do que pretende fazer crer no requerimento ora apresentado, nunca fez!
6. Ora, ao não ter suscitado tal questão junto do tribunal recorrido,
7. Não se mostram preenchidos os pressupostos para apresentação do recurso que agora pretende ver apreciado,
8. Pelo que a decisão sumária proferida não merece qualquer reparo.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. doutamente suprirão deve manter-se na íntegra, por não merecer qualquer reparo, a decisão sumária.
4. Também a Administração do Condomínio do Prédio sito na Rua …, nº.. a …, no Porto, que figura como recorrida, respondeu:
1. Interpôs a Recorrente reclamação para a conferência, da decisão sumária proferida em 24 de Janeiro de 2011 pelo Exmº. Senhor Juiz Conselheiro Relator que decidiu não conhecer do objecto do recurso. Ou seja,
2. Confrontada com a decisão que lhe é desfavorável, a Recorrente vem mais uma vez fazer uso de um expediente meramente dilatório no intuito de obstar à execução de sentença nos autos de que é procedente, pois, bem sabe que nenhuma razão lhe assiste.
3. Ao invés do que a Recorrente pretende fazer crer, não existe qualquer fundamento legal que justifique a revogação da decisão sumária reclamada, que diga-se, faz uma correcta aplicação e interpretação da lei, mormente, do disposto no art. 70º nº 1 al. b) da Lei do Tribunal Constitucional, nada havendo a censurar na decisão sub judice.
4. Na verdade, a Recorrente carece de legitimidade para apresentar recurso ao Venerando Tribunal Constitucional – aliás, como doutamente decidiu o Exmº. Senhor Juiz Conselheiro Relator – dado que nunca antes no processo havia suscitado qualquer questão de inconstitucionalidade.
5. Com efeito, a decisão sumária sob censura esclarece de forma fundamentada as razões pelas quais não conhece do objecto do recurso.
6. Por conseguinte, a presente reclamação está prejudicada por absoluta falta de fundamento e credibilidade, pelo que deverá improceder.
Termos em que deve negar-se provimento à reclamação para a conferência e, consequentemente, confirmar-se a decisão sumária reclamada.
5. Cumpre decidir, começando por recordar que a recorrente A. pretende impugnar no Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro), o acórdão proferido no Supremo Tribunal de Justiça em 16 de Novembro de 2010, mediante a invocação de que neste aresto teria sido aplicada uma norma inconstitucional – o n.º 1 do artigo 88.º do C.I.R.E.. Todavia, este tipo de recurso exige que o recorrente haja suscitado durante o processo, perante o tribunal recorrido, a questão da inconstitucionalidade que pretende ver conhecida. Acontece que a recorrente, ora reclamante, não colocou perante o Supremo Tribunal de Justiça qualquer questão de inconstitucionalidade relativa a qualquer norma do aludido preceito, o n.º 1 do artigo 88.º do C.I.R.E.. Por essa razão, foi proferida a decisão agora reclamada.
A reclamante insiste em ver apreciado o seu recurso, invocando essencialmente que suscitou perante o Supremo Tribunal de Justiça «a questão da inconstitucionalidade/ilegalidade da interpretação conferida ao n.º 1 do art. 88º do C.I.R.E., sendo que, ao invés de devido, de modo algum aquele Supremo Tribunal de Justiça se debruçou sobre tal questão, nada tendo decidido quanto a alegada inconstitucionalidade/ilegalidade de uma tal norma».
Mas não tem razão; em primeiro lugar, é de sublinhar que no âmbito do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, como o presente, não é de conhecer de questões de ilegalidade, ao contrário do que parece supor a reclamante. Em segundo lugar, apura-se – e sem qualquer dúvida – que a reclamante nunca suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade de norma contida no n.º 1 do art. 88º do C.I.R.E. perante o tribunal recorrido. Improcede, desta forma, a reclamação.
6. Decide-se, em consequência, indeferir a reclamação, mantendo a decisão sumária pela qual se decidiu não conhecer do objecto do recurso. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 1 de Março de 2011.- Carlos Pamplona de Oliveira – Maria João Antunes – Gil Galvão.